segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Erik - Capítulo XXI

Passados três dias do nosso noivado, Paul e Erik iniciaram as entrevistas com os candidatos a minha vaga na joalheria. Agora eu estaria ocupada em fazer o meu enxoval e não poderia ficar o tempo todo para atender aos clientes.
Mary Ann vinha desempenhando suas funções de forma competente.
Naquela manhã, eu estava a fazer a lista de compromissos a cumprir, quando soou a campainha.
- Senhora Emma!
- Bom dia, senhorita Catherine. Perdoe-me por importuná-la. Prometo que depois de hoje nunca mais me verão.
- Por favor, Emma... Posso chamá-la assim?
- Claro, senhorita.
- Entre, por favor. Estávamos preocupados, esperando que a senhora retornasse a nossa casa. Erik queria muito saber de seu estado, depois de tudo que aconteceu. Paul, inclusive foi até Whitechapel para obter informações sobre o que teria ocorrido após a chegada da polícia. Infelizmente, soubemos do que aconteceu com Charles.
- Ele teve o fim que procurava. Era meu filho, mas devo reconhecer que era de péssima índole. Jamais acabaria bem. Por pouco ele não acaba comigo, não fossem os policiais.
Uma lágrima insistiu em correr pela face triste, enrijecida pelo sofrimento.
- Todos nós lamentamos muito tudo isso.
- Senhorita, na verdade eu voltei hoje para pegar o resto de minhas coisas que ainda ficaram aqui. Mary Ann está servindo bem aos senhores?
- Sim, claro. É uma ótima moça. Mas para onde a senhora vai? Já tem outro emprego?
- Enterrei o corpo de Charles ontem, depois que a polícia o liberou. Não cheguei a procurar nada. Tenho alguns parentes distantes, que moram no interior. Talvez precisem de alguém para ajudar nas coisas da casa, na roça.
- Emma, não vejo motivo para que você vá embora. Tenho certeza que falo em nome de todos os moradores desta casa. O que aconteceu não foi culpa sua. Além do mais, é muito difícil arrumar uma governanta dedicada como você. Mary Ann poderá continuar e ajudá-la no serviço doméstico. Há algum tempo, antes desta fatalidade toda ocorrer, já tínhamos discutido a necessidade de mais alguém para ajudá-la.
- Oh, senhorita, é muita bondade, mas não tenho certeza se isto é correto.
- Emma, eu li a sua carta e sei o quanto já sofreu. Por isso, não recuse a nossa oferta.
- Nem sei como agradecer. Deus a abençoe.
= Eu é que devo lhe agradecer por ter salvado a vida de Erik. Tenho uma grande dívida com você.
- Eu não poderia deixar nada acontecer a ele, depois de tudo que fez por mim. Bem, senhorita Catherine, vou para o meu quarto preparar-me para o trabalho. Mais uma vez, muito obrigada.
Pobre mulher. Certamente Paul e Erik concordariam com a minha atitude. Contaria tudo a eles na hora do almoço.
Pouco antes de eles chegarem, a campainha tocou mais uma vez.
“O dia hoje está movimentado” – pensei, ao abrir a porta e receber uma carta endereçada a Erik, originária de Paris, das mãos de um mensageiro. Depois que este se foi, fiquei a revirar o envelope, tentando imaginar o conteúdo da mensagem. O remetente era uma mulher. Annie Giry. Quem seria ela? Pela primeira vez tive real curiosidade pelo passado de Erik.
Antes de o almoço ser servido, contei-lhes sobre a presença de Emma naquela manhã e a minha resolução de mantê-la como nossa governanta. A minha decisão foi totalmente bem vinda, bem como a própria Emma, quando surgiu para organizar a mesa de refeições. Mais uma vez, Erik agradeceu-lhe por ter salvado sua vida e prestou suas condolências.
Decidi entregar a correspondência mais tarde, após a refeição.
Ele me pareceu nervoso ao ver o nome daquela mulher. Pediu licença e subiu para o seu quarto para ler a carta. No fundo, senti-me rechaçada e magoada por ele ter preferido ficar só para abrir aquele envelope misterioso. Eu não fazia parte daquele canto obscuro na vida de Erik, o que me fez ter um pouco de ciúme. Eu o queria por inteiro. Talvez eu devesse conhecer toda a sua história, por mais escabrosa que ela fosse.
- Em que está pensando esta cabecinha? Que idéias fantasiosas estão se passando aí dentro? É possível penetrar em seus pensamentos?
- Ora, Paul. É claro que estou curiosa. O que você sabe sobre ele, Paul? Você sabe quem é essa Annie Giry?
- É uma amiga de Erik. Não se preocupe. Eles não têm nenhuma ligação amorosa, se é isso que a está preocupando.
- Não é bem essa a minha preocupação, Paul. É que estou me sentindo meio que excluída. É difícil de explicar.
- Nós havíamos dito a ele que seu passado não importava, Cathy. Você vai mudar de idéia?
- Ela tem razão, Paul
- Erik!
Ele vinha descendo as escadas silenciosamente e entrou na sala do piano.
- Acho que chegou a hora de contar a vocês sobre o meu passado.
- Porque isso agora? O que diz esta carta?
- Ela é de Mme Giry. Você a conheceu, lembra?
- Claro. Como ela descobriu o nosso endereço?
- Através do banco onde deposito uma quantia mensal em seu nome, como eu havia lhe dito que faria. Annie está me avisando que Raoul está a caminho de Londres para resolver alguns negócios de família.
- Mas o que pode acontecer? Tem medo de cruzar com ele por aí? Londres é muito grande, Erik. Seria muita coincidência encontrá-lo.
- Ele sabe o seu nome. A nossa joalheria é muito conhecida nas altas rodas. Se ele souber da fama das jóias, talvez fique curioso em conhecer, ligando o nome à sua pessoa.
- Alguém pode me explicar quem é esta pessoa de quem vocês estão falando? – falei, pois até aquele momento eu estava me sentindo um espectro, a quem não olhavam ou dirigiam a palavra.
- Desculpe, querida, mas vou contar tudo a vocês. Todo este meu passado que continua a assombrar minha vida. Paul já conhece uma pequena parte desta história, pois ele foi um elemento importante num plano para proteger-me e resgatar a minha tranquilidade para poder refazer meu destino.
Erik foi até a porta da sala para verificar se realmente estavam a sós e se a porta estava bem fechada. Só então voltou a falar:
- Por favor, sentem-se e, depois que eu terminar, façam o seu julgamento.
Senti medo pelo que ouviria a seguir, mas consegui dizer-lhe:
- Ninguém está aqui para julgá-lo, Erik. Só para compreendê-lo e ajudá-lo a virar esta página definitivamente.
- Assim eu espero, Catherine. Assim eu espero.
A partir daí, o homem que eu amava iniciou a narrativa da sua história. A história do Fantasma da Òpera, como ele próprio se autodenominou.

Estava penalizada, chocada e, ao mesmo tempo solidária com o narrador e a história que acabara de ouvir. Diversos sentimentos e sensações debatiam-se como as ondas do mar em rochedos durante uma tempestade. Este era exatamente o efeito que a descrição de Erik havia deixado em mim. O de uma tempestade violenta. Sentia a preocupação no seu olhar e o medo de perder o meu amor.
Olhei para Paul, que parecia ter assimilado tudo sem maiores problemas. Dele vieram as primeiras palavras de apaziguamento para Erik.
- Meu amigo, eu já esperava uma história de vida bem complicada, mas como havia sido falado antes, vou continuar aqui, ao seu lado, para ajudá-lo a virar esta página infeliz de uma vez por todas. Nada disso vai mudar o meu modo de encará-lo. Pode continuar contando com o seu amigo aqui.
- Obrigado, Paul. Pode ter a certeza que jamais terá motivos para arrepender-se dessa sua posição.
Seu olhar novamente voltou-se para Catherine. Parecia relutar em perguntar-lhe qualquer coisa.
- Catherine?
Demorei alguns segundos para encontrar as forças para responder-lhe, mas finalmente consegui articular as palavras:
- Erik, eu ainda estou tentando colocar os pensamentos em ordem. Não está sendo fácil. Vou precisar de um tempo. Acho que vou para o meu quarto descansar um pouco.
- Eu entendo.
Aquele olhar terno e suplicante... Eu queria dizer que o amava, mas não conseguia. Não naquele momento. Talvez mais tarde, a sós.
Saí da sala, sem olhar para trás. Subi as escadas olhando o meu “infinito”, que brilhava como um farol em minha mão, tentando iluminar a minha travessia. Ao fechar a porta de meu quarto, nem sei bem porque, joguei-me sobre a cama e comecei a chorar. Pensava em Erik, em seu passado atormentado e em nosso futuro.
Precisava me controlar. Voltar à razão. Não podia deixá-lo só, abandonado. Toda a sua vida tinha sido solidão. Eu tinha dado a ele a esperança de ter amor e cumplicidade. Não podia tirar isto dele. Não agora, quando o medo de ver sua vida arrasada novamente estava presente.

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