quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Erik - Capítulo IV

Como este terceiro capítulo foi muito curto e não querendo fazer ninguém sofrer muito, (não é , Vanessa?), vou postar o quarto capítulo. Até amanhã! Beijos!!


Os dias foram passando e a minha recuperação era visível, graças aos cuidados de meu jovem amigo. Durante este tempo, passei a receber algumas aulas de inglês, para melhorar nossa comunicação, e também, a acompanhar o seu trabalho. Era interessante vê-lo trabalhar com o ouro, a prata e as pedras preciosas. Porém, faltava-lhe imaginação na confecção das peças. Passei a dar sugestões e arrisquei-me a fazer alguns desenhos. Surpreendentemente, ele aceitara de bom grado meus conselhos e rabiscos. Mais surpreendente ainda foi quando as novas jóias passaram a não permanecer mais que um dia na pequena vitrine. O movimento da joalheria começou a aumentar e os novos pedidos já não eram mais minguados, como antes.
- Erik, acho que formamos uma bela dupla. Você como designer imensamente criativo e eu com minha habilidade em transformar sua criação em jóia.
- Eu estava pensando em partir. Você sabe que já estou plenamente recuperado. Não vou esperar que você me expulse daqui. Pretendia partir antes disso – falei sorrindo.
- Olhe. Vou te propor uma sociedade. Você entra com a sua inventividade e eu com o trabalho braçal. Dividimos os lucros meio a meio. O que acha?
Ele parecia bem empolgado. Não seria má idéia. Meu medo era ainda estar muito próximo da fronteira com a França e ser descoberto. Era arriscado continuar ali. Mas não podia descartar este convite. Talvez pudesse ganhar dinheiro com esta sociedade. Não precisava aparecer muito. Deixaria o brilho para o jovem Paul e guardaria meus lucros. Sentia uma certa culpa por não contar toda a verdade a meu novo amigo. Talvez um dia.
- Está certo, Paul! Se você não se importar de dividir sua casa com um pobre deformado - quando imaginei que poderia brincar com minha maior miséria, daquela maneira?
- Acho que nossa sociedade vai ser um sucesso. Logo, logo, poderemos comprar uma casa maior, onde a gente não se cruze a todo o momento e eu não precise ver esta sua cara feia a toda o instante – deu um amplo sorriso e abraçou-me.
Apesar de tudo, continuei a usar minha venda negra sobre o lado direito do rosto. Ela substituíra a velha máscara da Ópera. Já conseguia sair às ruas sem atrair tanta atenção. Começava a sentir-me integrado aquela comunidade. O sucesso de nossa sociedade era evidente. O dinheiro passou a entrar mais facilmente a cada dia. Ao final do primeiro ano, mudamos para uma loja maior, num bairro mais nobre de Dover e nossos clientes passaram a vir em carruagens elegantes. Ricos comerciantes e alguns nobres eram nossos clientes, na aquisição de presentes para suas esposas e para suas amantes. Como havia exigido de Paul, que não quis entrar em detalhes sobre meu pedido, meu nome não aparecia de maneira alguma. Todos os louros eram para ele. Não me importava o sucesso pessoal. Meus planos iniciais, de ganhar muito dinheiro pareciam estar dando certo. Isto é o que importava.
O medo do passado parecia estar ficando cada vez mais longe. Até os pesadelos já não visitavam minhas noites com tanta freqüência. Até o dia em que, passando em frente à cadeia municipal, vi fixado um cartaz, que fez todos meus temores serem arrancados do limbo em que se encontravam até então. Era o retrato de um homem, com uma máscara que cobria seus olhos, como aquela em que eu usara na primeira e última apresentação de “O Triunfante Don Juan”, na Ópera de Paris. Em grandes letras, lia-se a palavra “Procurado”. Em letras mais miúdas, indicava que o sujeito era de nacionalidade francesa e de extrema periculosidade.
Corri para casa. Acho que chegara a hora de partir. Logo agora, que tudo ia tão bem. Por quê? Já não sofrera o suficiente para pagar minha dívida?
Teria de contar a Paul minha verdadeira história. Certamente ele me expulsaria de sua casa. Com toda a razão. Eu não o culparia.
Como sempre, ao chegar, Paul encontrava-se debruçado em sua mesa de trabalho, sobre um lindo broche, desenhado por mim, em forma de borboleta, em ouro, cravejado de pequenas esmeraldas e brilhantes, que davam uma delicadeza e uma leveza esplêndida à pequena relíquia.
- Paul, precisamos conversar.
- Sente-se aí e fale. Algum problema? Sua voz está estranha.
Parou seu trabalho e levantou um olhar preocupado em minha direção.
Sentei-me, e sem conseguir enfrentar sua face inquiridora, falei:
- Há cerca de um ano, quando cheguei aqui e fui bondosamente acolhido por você, estava fugindo de meu país natal, a França.
- Até aí, Erik, não vejo novidade alguma.
- Como? Você sabia que eu era um foragido?
- Podia ter alguma dúvida? Uma pessoa que chega no estado em que você chegou, num dos principais portos ingleses e sem falar uma palavra de nossa língua, faria pensar em que? Que você estava aqui a passeio?
Tive que rir de minha ingenuidade ao subestimar a inteligência de meu sócio.
- Porque você nunca quis saber de meu passado?
- Não achei que fosse importante. O tempo me deu razão. A nossa parceria tem sido um sucesso. Nós estamos indo bem, não?
- Estamos, Paul. Mas, infelizmente, meu passado pode voltar para atrapalhar nossos planos.
- Deve haver algo que possamos fazer.
- Estão a minha procura. Hoje vi um cartaz, com um retrato falado. Muito mal feito, é verdade, mas que mostra um homem com uma máscara, igual a que eu usava antes de fugir, cobrindo meus olhos e parte da desfiguração. Dizem que o homem é muito perigoso. Oferecem uma recompensa. Logo alguém vai lembrar-se de mim e fazer a ligação. Preciso ir embora, Paul.
- Vamos pensar, Erik. Tem que haver uma maneira. Talvez você pudesse viajar – enquanto pensava, vi sua face transformando-se, de uma expressão preocupada para um sorriso maroto.
- Já sei! Olhe, já venho pensando a algum tempo que Dover já está ficando pequena demais para nós. Temos tido alguns clientes de Londres, que vêm para comprar nossas jóias. Talvez esteja na hora de mudarmos para um centro maior e expandir nosso negócio. Para isso, preciso que alguém que vá na frente para conseguir um lugar para abrir a nova loja, ter contatos com clientes, enfim, preparar o terreno. O que acha?
- Acho uma boa idéia, mas o problema só seria adiado. Eles vão continuar a caçada. Um dia vão chegar a Londres. Se já não chegaram.
- Então temos que dar um jeito para eles pararem com esta caçada.
- Como? Eu errei muito, Paul. Um dia você vai saber de meus crimes. Arrependi-me profundamente de todos eles e acho que já sofri o bastante para redimir-me. Mas, a maioria das pessoas não pensa assim, e só vão descansar quando me virem com a cabeça dentro de uma cesta de palha.
- Tem que haver uma maneira. E... Se você morresse?
- Como assim?
- Claro! Eles não o querem morto? Achamos um corpo qualquer, o que não é difícil hoje em dia, e o enterramos como se fosse você.
O que ele estava dizendo parecia um absurdo total, mas quem sabe? Talvez não fosse uma idéia tão absurda assim.
- Paul, estou começando a pensar num plano tão louco quanto sua idéia e que pode dar certo. Vou precisar da sua ajuda, de qualquer maneira.
Durante mais de duas horas arquitetamos um esquema, que aparentemente seria perfeito.
Revisamos os riscos, todos as arestas possíveis, de forma a não deixar nenhum detalhe de fora.
Ao final deste tempo, ficou resolvida minha ida para Londres, onde ficaria isolado de tudo por alguns dias, até que minha “morte” estivesse definida.
Naquela noite, tive pesadelos mais terríveis que os anteriores. Acordava aos sobressaltos, suando frio. Meus sonhos sempre me encontravam num labirinto escuro. O barulho de água interminável, águas escuras e malcheirosas, que escorriam das paredes, vozes, murmúrios ameaçadores. Eu correndo, meu rosto sangrava, embaçando minha visão... Os sussurros tornavam-se mais audíveis... “Filho do demônio, filho do demônio... Peguem-no!” Finalmente, sentia mãos, como garras, forçando-me a parar. Neste ponto, acordava, ainda com a sensação daquelas mãos frias cravando suas unhas em meus ombros.
No dia seguinte, bem cedo, uma carruagem me aguardava nos fundos da joalheria. Paul havia dado uma ordem bem clara de que não devíamos parar por motivo algum. Indicou ao cocheiro o hotel, discreto segundo ele, nos arredores de Londres, para onde devia levar-me. Lá, eu aguardaria suas notícias. Se tudo corresse conforme o planejado, receberia, em breve, notícias suas de que já estaria livre para circular novamente e cuidar de nossa mudança. No mesmo dia, duas cartas atravessariam o canal da Mancha, em direção a Paris, endereçadas a duas mulheres: Madame Giry e Viscondessa de Chagny.

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