quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Confusões de um Viúvo - Capítulo IX



Canela - RS


Aldeia do Papai Noel

Casa do Papai Noel
Mini-Mundo
Castelos no Mini-Mundo

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Chocolates

Fabricação dos bombons


Ana

Miguel




Confesso que é mais fácil escrever dramas e contos policiais que uma estória bem humorada e leve. Como devem saber, ou não, estou experimentando escrever algo diferente do que tinha escrito até agora. É uma delícia, mas me deixa mais insegura do que o habitual. Espero que estejam gostando.
A propósito, já tenho um pré-enredo para o próximo romance, mas gostaria de saber a opinião de minhas leitoras. Assim como a Cris sugeriu uma estória envolvendo um pai e seus filhos, qual a sugestão de vocês? Escolham um tema. Colocarei as idéias em um banco e quem sabe no futuro não possa transformar em romance? Vou adorar saber o que se passa nas mentes aí do outro lado do monitor e quais suas fantasias. Vocês já conhecem as minhas...rsrsrs.Se tiverem vergonha, podem deixar o comentário como anônimo ou mandar para o meu e-mail (juro manter sigilo absoluto).
Beijinhos!

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Confusões de um Viúvo - Capítulo VIII



Pórtico de Gramado

Postagem cancelada


Consegui manter a marca de um capítulo por semana. Gostaria de ter os capítulos prontos mais cedo, mas o tempo não tem sido meu amigo e minhas atividades extrablogueiras andam me dando bastante trabalho...rsrsrs. Mas não desanimem que a estória continua. Nunca deixei de terminar o que comecei.
Muito beijos a todas(os)!!

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Confusões de um Viúvo - Capítulo VII

Postagem cancelada

Bem, finalmente parece que estes dois vão se entender. Vamos esperar pelos próximos capítulos...
Beijinhos!

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Confusões de um Viúvo - Capítulo VI



Miguel acabara de sair do foro. A temperatura começava a cair rapidamente, as árvores despiam-se de suas folhas, atacadas pelo vento, e uma chuva fininha começava a açoitar as ruas de Porto Alegre. Dirigiu-se para o bairro Bom Fim. Pensou em convidar um ou dois amigos para fazer um happyhour em algum dos inúmeros barzinhos que havia na área. Foi quando viu uma loura deslumbrante parada na calçada, vestindo uma roupa leve, inadequada para a mudança climática, encolhida pelo frio, fazendo sinal para tentar conseguir um táxi livre, o que era impossível naquele horário. Ela pareceu mancar levemente ao movimentar-se. Diminuiu a velocidade e aproximou-se lentamente de onde ela estava. Conseguiu ver melhor o seu rosto. Animadíssimo, estacionou diante dela, abrindo o vidro elétrico do lado oposto ao seu. Notou que ela imediatamente fechou a expressão e evitou olhá-lo.
- Moça, acho que está precisando de uma carona! – disse sorridente, esticando-se todo sobre o banco para poder encará-la.
Ela fingiu que não ouviu e caminhou em direção contrária ao fluxo de onde ele estava obrigando-o a dar ré. Por sorte, não vinha nenhum outro veículo, e ele pode segui-la por alguns instantes.
- Bruna! Não reconhece mais os amigos? – gritou quando cansou de divertir-se com a cara amarrada dela e o movimento de carros na rua reiniciou.
Ao ouvir seu nome, ela abaixou-se para ver melhor o sujeito que a importunava.
- Miguel? – indagou surpresa – É você?
- Quem mais ia dar em cima de uma mulher sozinha, desamparada, no meio da chuva, à procura de um táxi? Entra aqui ou vai morrer congelada, guria!
Ela sorriu ao reconhecer o antigo colega de faculdade e aceitou o oferecimento imediatamente. Realmente já estava congelada até os ossos, pois o frio viera repentinamente, e ela não estava preparada. Esquecera como o clima no Sul era excêntrico. Além disso, seu tornozelo ainda reclamava.
- Miguel, há quanto tempo... O que faz por aqui? – disse enquanto se abraçavam e trocavam beijos na face.
- Eu que pergunto. Você não tinha ido morar na Alemanha para dedicar-se à carreira de bailarina?
- Ah, essa é uma longa história... – respondeu suspirando melancólica – Mas, me conta de você. Já é um advogado famoso?
- Diga uma coisa. Tem tempo agora ou tem de voltar para casa para atender o marido e os filhos?
Ela começou a rir e respondeu:
- Felizmente ou infelizmente, não tenho este problema.
- Então, que tal uma saída para comemorar o nosso reencontro? Ia ligar para um amigo para fazer um happyhour, mas agora que a encontrei, não preciso mais procurar.
- Não estou arrumada, Miguel. Vai passar vergonha comigo.
- Você está linda, como sempre. Vou passar é trabalho evitando o assédio dos outros caras. Topas?
- Topo! – respondeu num piscar de olhos. Seria bom para mudar o rumo de seus pensamentos que não paravam de seguir a imagem de Leonardo e seus encontros frustrantes.
- Ótimo! Tenho uma jaqueta sobressalente aqui no carro. É melhor vesti-la ou vai se resfriar – disse enquanto estendia o braço para o banco de trás e pegava o abrigo.
Miguel
Sentaram-se numa das mesas de canto do Bar do Pedrinho, famoso no bairro, pediram um chope para cada um e uma porção de sanduíche aberto.
- Agora que já contei a minha brilhante trajetória no mundo dos bacharéis, quero saber de você. Desde a sua ida para a Alemanha, que estou curioso – inquiriu Miguel, que contara, durante o percurso até o bar, como conseguira tornar-se sócio num dos escritórios de advocacia mais concorridos da cidade.
- Bom, se prometer não bocejar, eu conto.
- Sou todo ouvidos – sorriu incentivando-a.
- O início foi um pouco difícil por causa da língua, apesar de eu ter feito um curso de alemão por dois anos. Porém, nada foi motivo para me desmotivar da dança. Passei a frequentar um grupo conhecido de Berlim e logo estava me apresentando com eles. Fiquei muito amiga do coreógrafo. Foi maravilhoso e tudo corria muito bem. Tinha uma boa renda mensal, ótimas amizades e fazia o que eu mais amava na vida, que era dançar. Contudo, há cerca de 1 ano, quando estava saindo do teatro onde tínhamos acabado de ensaiar a coreografia para a próxima apresentação, fui atropelada por uma bicicleta sem freio. Acredita? Acho que eu estava distraída, pensando nos passos que devia melhorar ou, sei lá o que mais, quando ele surgiu do nada. Com o choque, caí torcendo o tornozelo. Senti o osso se quebrar. Fiz uma fratura exposta de tíbia. Levei meses em tratamento e fazendo fisioterapia. Depois de tudo, recebi a notícia que acabou com todos os meus planos e sonhos. Eu não poderia mais dançar profissionalmente. Quase morri ao saber. Passado o desespero, com a ajuda de amigos alemães e alguns daqui, consegui me reerguer e começar a fazer novos planos para a minha nova situação. Não podia mais acompanhar o meu grupo, mas poderia dar aulas de dança ou fazer outro tipo de atividade dentro do balé, como ser coreógrafa – Olhou firme para Miguel que ouvia comovido o seu relato e perguntou – Se estiver sendo muito chata, me avisa, que eu paro. Está bem?
- Não, Bruna. O que é isso? Estou pasmo com tudo que você está me contando. Por isso notei que estava mancando hoje...
- É... Não costumo mancar, mas é que hoje resolvi me exceder num solo e acabei tendo dor. Acho que forcei demais o tornozelo.
- Está melhor agora?
- Estou sim. Até amanhã já estarei bem.
- Então continua... Por que e quando voltou ao Brasil e o que anda fazendo agora?
- Pois é. Pensei em permanecer lá, mas as oportunidades de trabalho diminuíram drásticamente. Então, uma grande amiga minha, também bailarina, me ligou dizendo que a academia onde ela dava aulas, estava a venda. Fiquei animada com a possibilidade de voltar para casa. Começava a ficar deprimida demais em Berlim. Consegui juntar um bom dinheiro no período em que trabalhei lá e graças ao seguro-saúde, que todos os bailarinos do nosso grupo tinham, não precisei desembolsar muito pelos tratamentos que recebi. Pesei os prós e os contras e acabei por tornar-me uma proprietária de escola de balé. Isto tudo aconteceu há cerca de 2 meses. E aqui estou eu.
- E, numa boa mesmo? Está feliz?
- Acho que sim. Desisti de me fazer de vítima e encarar a realidade. Na academia vou continuar em contato com o que mais gosto de fazer. Se tudo falhar, vou pedir emprego para algum famoso advogado amigo – disse dando uma piscadela para ele.
- Quem me dera... Famoso – disse, soltando uma gargalhada, escondendo a tristeza e a pena que sentia de sua amiga por tudo que ela sofrera – Tenho certeza que tudo vai dar certo com a sua academia. É importante fazer o que se gosta.
- E você? Ainda solteiro? O que há com estas gaúchas que ainda não conseguiram laçar um advogado charmoso como você?
- Acho que elas fizeram escola com uma certa colega minha...
- Ah, Miguel, não vai começar a flertar comigo agora – desdenhou rindo – Prefiro mantê-lo só como amigo.
- É uma pena, mas fazer o quê? – suspirou e retribuiu o sorriso mais palidamente. – Mudando de assunto, pois já vi que não tenho a mínima chance, como sempre. Onde você está morando? Com seus pais?
- Não. Aluguei um apartamento no mesmo prédio em que meu irmão mora. Meu pai faleceu há dois anos. E minha mãe... A gente se fala muito pouco. Você lembra como ela foi contra a minha ida para a Alemanha? Pois é. Desde lá, ficamos meio que de mal. Com a minha volta, estamos começando a nos reaproximar.
- Mas sabe quem eu vi estes dias? – falou depois de uma breve pausa, novamente mudando o rumo da conversa, pois percebeu que o assunto de família não era muito agradável para Bruna – O Janjão. Lembra dele?
- Não brinca! Como ele está? – indagou curiosa a respeito de um dos mais polêmicos colegas da turma.
Passaram a conversar sobre os tempos de faculdade e riram lembrando professores, amigos e figuras hilárias daquela época.


- Papai...
- O que foi Marina?
- Por que tu estás triste hoje?
- Não estou triste.
- Foi porque a Tati falou da mamãe?
- Não, meu amor... É melhor fechar os olhinhos e dormir. Amanhã temos que acordar cedo.
- Não sonhei mais com a mamãe... – continuou.
Engolindo em seco e sentindo uma imensa ternura, Leonardo aproximou-se da filha na penumbra do quarto.
- E você está chateada com isso? – perguntou, sentando-se na cama junto a Marina e acariciando sua cabecinha.
- Não... Acha que ela está lá em cima ensinando os anjinhos?
Ele sorriu e concordou.
- Tenho certeza disso, querida...
- A Tati pensa que ela pode voltar... Não pode né, papai?
- Não, não pode, meu bem – disse notando que os olhinhos esverdeados já estavam quase fechando.
- Tá bom... – disse com a voz mais enrolada – Te amo, papai...
- Também te amo muito, Marina... – declarou emocionado.
- Boa noite... – desejou num sussurro, de olhos fechados.
- Boa noite, meu anjo – despediu-se beijando sua testa suavemente.
Beijou Tati, que se encontrava agarrada a sua boneca de pano predileta e adormecida há um bom tempo, arrumou o edredom sobre ela e saiu silenciosamente do quarto cor-de-rosa.
Pensativo, foi para a cozinha, pegou um cálice e serviu-se de um pouco do vinho tinto que tinha aberto no dia anterior. Dirigiu-se para a sala, colocou um CD de jazz e sentou-se para ouvi-lo em sua poltrona predileta. As feridas pela perda de Cris estavam praticamente fechadas. Tati e Marina pareciam conformadas e tranquilas em relação a isso. Olhou em torno de si e notou que o silêncio na casa já não o perturbava tanto. A sensação de que Cris apareceria a qualquer momento com um sorriso nos lábios, indo na sua direção para beijá-lo ou com uma palavra de carinho para as filhas, desaparecera. Pelo menos não sentia mais o coração ser dilacerado ao perceber que isso nunca mais aconteceria. Não pode evitar novamente a imagem de Bruna e seu desconforto diante da descoberta de sua viuvez no final de tarde. Será que ela pensava que ele ainda era casado? Seria esse o motivo para repudiá-lo tanto? Bobagem. Ela tinha namorado. Era melhor parar de fazer suposições. Além do mais, que mulher solteira e linda como ela pensaria em relacionar-se com um homem com duas filhas pequenas... Para passatempo? É melhor parar de pensar bobagens! E voltou sua atenção para o som do trompete que o envolvia e ao prazer de degustar o delicioso vinho.


A manhã chegou acinzentada, fria e úmida. Finalmente o Outono se revelava.
- Leo! – chamou sua secretária – Tem uma moça aqui querendo falar com você. O nome dela é Vera. Posso mandá-la entrar?
- Pode – disse olhando o relógio e imaginando que seria a nova babá arranjada por D. Celina.
Pouco depois entrou uma mulher de vinte e poucos anos, de rosto redondo, cabelos e olhos castanho-escuros, vestindo um jeans e um blazer de lã, de olhar desafiador, parecendo mais velha que sua idade devido à maquiagem pesada que usava.
- Bom dia. Vim a pedido de D. Celina. É o senhor Leonardo?
- Sim – disse Leonardo – Bom dia. Quer se sentar aqui, por favor? – Indicou a cadeira mais próxima à sua mesa de trabalho.
Toda empertigada sentou-se e o encarou soberba.
- Fui encaminhada por D. Celina para conversar a respeito do emprego de babá.
- Sim, claro... A senhorita tem alguma experiência com crianças? Tem referências?
- Bem, confesso que nunca trabalhei como babá, mas sou formada em Pedagogia e acho que estou apta a cuidar de suas filhas. Também posso ajudar na cozinha.
Ele ficou espantado ao saber que a mulher era graduada em Pedagogia e estava candidatando-se a um emprego de babá. Onde esse mundo vai parar?
- Como é mesmo o seu nome? – perguntou, tentando ganhar tempo para pensar em como dispensá-la.
- Vera. Gostaria de saber qual o meu horário, pois pretendo iniciar uma pós-graduação à noite. Não poderei trabalhar nos finais de semana, a não ser que seja combinado com duas semanas de antecedência – disparou seus empecilhos.
Vera aparentava ser um poço de antipatia e Leonardo duvidou que seria diferente com as meninas.
- Por que está querendo este emprego, tendo uma formação de nível superior?
Sem querer tocou num ponto nevrálgico da pobre jovem. Pensou que Vera fosse ter uma síncope, pois empalideceu e arregalou os olhos. Engoliu em seco e iniciou sua resposta.
- Infelizmente o mercado de trabalho está difícil, como você deve saber e eu ainda não tive oportunidade devido à falta de experiência. Realizei alguns concursos, entreguei meu currículo em vários locais, fiz entrevistas, mas até agora não consegui nada. Quando D. Celina falou com minha mãe se conhecia alguma babá, ela pensou em mim. Pediu que eu o procurasse. Acho que ela não me aguenta mais em casa sem trabalhar. Você precisa me ajudar – sua voz começou a tremer demonstrando seu desespero.
- Olha, Vera, acho que este emprego não é adequado para você... Afinal uma pessoa formada em Pedagogia merece algo do seu nível – Ela agora estava soluçando – Se procurar melhor, tenho certeza que encontrará uma ocupação mais adequada aos seus conhecimentos do que a que tenho a lhe oferecer. Será que ela é bipolar?Ou maníaco-depressiva?Ou está só desesperada? Não queria uma pessoa assim cuidando de suas filhas, por mais pena que tivesse dela e da situação em que se encontrava – Por favor, não chore... Preciso lembrar de esganar a D. Celina quando a encontrar na próxima vez...
- Concordo com você. Nem gosto tanto assim de crianças, mas como minha mãe insistiu... Preciso muito de um emprego – fungou o nariz – Quem sabe de secretária, aqui no seu escritório?
Uma pedagoga que não gosta de crianças?...
- Não, Vera. Infelizmente já estamos com o quadro completo... Sinto muito não poder ajudá-la, mas é que eu realmente acho que você vai acabar descontente trabalhando em algo fora da sua área, em um emprego subalterno.
As lágrimas vertiam soltas. Quanto mais ele pedia que ela se acalmasse, mais alto ficava o choro, chamando a atenção de seus funcionários e de um cliente que acabara de entrar. Todos o olhavam de soslaio. Deviam estar pensando as piores barbaridades a seu respeito. Podia até imaginar... Melhor não. Chamou a secretária e pediu que ela trouxesse um copo d’água para a senhorita, colocando o dedo indicador na lateral da cabeça e rodopiando o dedo rapidamente, sem que Vera percebesse, indicando o quadro de insanidade mental de sua visitante.
Menos de um minuto depois, recebia o copo com água e uma caixa de lenços de papel. Agradeceu à funcionária por sua eficiência e iniciativa.
- Você já tentou uma agência de empregos? – indagou ao entregar-lhe o copo. Deveria ter pedido um sedativo também.
- Não... – respondeu com um brilho alucinado no olhar.
- Então... Quem sabe você tenta? Tem ótimas agências na cidade – Disse liberando um discreto suspiro de alívio. Parece que estava conseguindo acalmá-la. Entregou-lhe os lenços de papel.
- É... Talvez...
- Quem deve saber indicar é a D. Celina. Tenho certeza que ela vai lhe dar o nome das melhores – vingou-se rebatendo o fardo para sua querida sogra. Aliás, ex-sogra.
A mulher inspirou profundamente e, no instante seguinte, secou as lágrimas, assoou o nariz com estardalhaço e voltou a ter o olhar altivo de antes.
- Desculpe ter tirado o seu tempo - levantou-se.
Olhou-o como se nada tivesse acontecido, agradeceu e saiu, deixando-o pasmo com as mudanças bruscas de humor de sua ex-futura babá, mas ao mesmo tempo aliviado por ter se livrado dela.

Tendo conseguido encerrar suas atividades mais cedo naquela sexta, resolveu dar uma passada em uma das grandes livrarias da cidade para procurar um livro de culinária fácil. Já não tinha esperanças de conseguir alguém que cozinhasse para sua família, assumiria mais esta função. Talvez acabasse descobrindo uma habilidade desconhecida.
Entrou e logo foi perguntando, meio sem jeito, a um dos funcionários onde era a seção de arte culinária. O rapaz indicou o segundo andar, mostrando uma estante estrategicamente escondida e muito conveniente a ele. Não queria que alguém das suas relações o visse buscando este tipo de literatura. Dirigiu-se até lá e começou a remexer nos livros à procura de algo adequado às suas intenções de cozinheiro iniciante. Tinha dois volumes seguros na mão, quando notou que estava sendo observado por alguém. Ao virar-se para o lado, deu de cara com dois grandes e doces olhos azuis a cuidá-lo. Surpreendeu-se ao ser pego em flagrante e deixou cair os livros com grande estardalhaço, atraindo para o alto da livraria a atenção da maioria dos presentes.
- Esta cidade é realmente pequena, não é mesmo? – reconheceu Bruna, segurando-se para não rir da atrapalhação de Leonardo ao vê-la, buscando recolher rapidamente os livros que deixara cair, escondendo-os sob o braço. Será que ele é tímido mesmo?
- Oi... O que está fazendo aqui? – perguntou incisivo ainda atrapalhado com o flagrante e, principalmente por ter sido Bruna a autora deste.
- Procurava CDs de música para a escola – explicou, apontando para sessão bem próxima a eles.
Ela chegou mais perto de onde ele estava, ficando sob seu nariz, bisbilhotando a carreira de obras impressas a sua frente.
- Culinária... Interessante. Achei que era arquiteto – Virou-se bruscamente, provocando-o. Estavam muito próximos um do outro. Mais uma vez sentiu-se próxima a uma combustão espontânea. Apesar de ser alta, ele a ultrapassava em quase uns vinte centímetros. Deve ter quase 1.90 m de altura.
- E sou – respondeu sem desviar um milímetro de onde estava, desistindo de fugir do olhar instigante da bailarina – Algum problema com homens na cozinha?
- Nenhum – respondeu corando levemente, repreendendo-se por estar se insinuando tanto para ele. Virou-se mais uma vez para a estante, fingindo estar lendo os títulos a sua frente – A maioria dos grandes chefs são homens.
Era difícil resistir àquele perfume que ela usava, levemente adocicado. Instintivamente abaixou-se um pouco para senti-lo nos cabelos dourados, que se encontravam soltos, caindo em cascata sobre os ombros. Então ela virou o rosto repentinamente, permitindo que seus lábios quase se roçassem tal a proximidade em que se encontravam. A forte atração que ocorrera no dia anterior na escola voltou intensa. Esquecido de onde estava Leonardo não precisou de muito esforço para puxar Bruna pela cintura, contra seu corpo e beijá-la, degustando seus lábios. Por sua vez, depois de passada a surpresa, ela o envolveu com os braços em sua nuca, ficando na ponta dos pés para moldar-se melhor ao corpo dele. Por um momento ele pensou em soltá-la, temendo estar indo muito rápido, mas ela o reteve e voltou a beijá-lo, sendo plenamente correspondida. Com os lábios entreabertos, permitiu que a língua quente e úmida invadisse sua boca, desvendasse seu sabor e saciasse sua sede. Grudada nele, percebeu a pulsante ereção, sob a fina calça de lã, pressionando seu baixo ventre, provocando-a. Sentiu a calcinha molhada devido ao incontrolável desejo. Arqueou o corpo reflexamente para trás, jogando os quadris para frente, exigindo maior contato. Tiveram dificuldade em ouvir o exagerado pigarrear e um “com licença” seco. Apenas na repetição, acabaram por separar-se e voltaram à realidade. Leonardo a soltou e ela desfez o laço em torno do seu pescoço, dando passagem para uma senhora baixinha, de óculos, espremida dentro num conjunto xadrez de saia e blazer, com ar de censura. Intimidados, ofegantes e de olhos baixos, tentavam recompor-se. Quando os olhares se cruzaram novamente, Leonardo deu um meio sorriso e falou em voz baixa e rouca:
- Desculpe... Eu... – parou com seu pedido de desculpas ao notar que a senhora que os interrompera parecia mais interessada neles do que em sua procura cultural – Que tal irmos tomar um café lá embaixo?
- Já achou o livro que procurava? – indagou sorrindo, procurando naturalidade, como se fosse possível depois do que tinha acontecido.
- Não... Na verdade, nem sei como procurar – Agora ela vai pensar que eu sou um completo idiota! O que me deu de beijá-la daquela maneira?... Como ela é linda...
- Que tipo de livro de culinária estava procurando? – perguntou simulando curiosidade.
- Algum para iniciantes... – pigarreou e olhou para a estante, fugindo do olhar de Bruna.
- Ah, então o ideal é este aqui – declarou enquanto tirava da estante um volume e pensava em como ele ficava bonitinho quando sem jeito – Se você quer aprender sobre como cozinhar comida saudável, este é a melhor escolha.
Ele pegou o livro entre as mãos, folheou um pouco. Era da autoria de um jovem chef inglês. Parecia interessante.
- Obrigado...
- É para você mesmo?
- Não... – mentiu sem conseguir encará-la – É um presente.
- Certo... – concordou apesar de desconfiar que ele estivesse envergonhado de dizer que queria aprender a cozinhar – Que tal aquele café agora? – convidou com a intenção de poderem conversar mais tranquilamente, já que a senhora cheirando a perfume rançoso continuava ao lado deles fingindo ler um livro sobre preparo de massas.
Ele olhou seu relógio de pulso conferindo o horário e disse:
- Infelizmente não posso me demorar muito – subitamente ficou ansioso – Tenho que buscar as minhas filhas na escola.
Decepcionada com a aparente fuga, não se deixou vencer. Será que ele não gostou do beijo? Não foi esta a minha impressão, mas...
- Onde é a escola delas?
- É no Bom Samaritano, perto do Planetário.
- Que ótimo! Eu moro ali pertinho, na Rua Santana – falou animada diante do olhar perplexo dele – Poderia me dar uma carona? Afinal continuo sem meu carro... Está se saindo um grande cara-de-pau, D. Bruna.
- Por falar nisso – O que eu faço agora? – Não recebi o orçamento ainda.
- Não se preocupe. Neste final de semana eu mando. A oficina só vai aprontar o carro na segunda ou na terça.
- Ah... Certo.
- E então? Vai me dar uma carona ou não? – Por que ele está em dúvida, Cristo?
- Você se importa se eu pegar as meninas antes? – Diante da expressão de dúvida dela, explicou – Antes de deixá-la em casa, é claro. Isto é... Você vai comigo pegar as duas?
- Claro! – exclamou radiante, ao entender o convite mais que satisfatório – Vou adorar – terminou de responder com o melhor sorriso do mundo.
- Então, vamos. Elas devem estar saindo da aulinha de informática daqui a pouco.
- Vamos lá.
O que eu estou fazendo?O que ele vai pensar de mim?Que vontade de beijá-lo de novo...

Esbarraram-se quando resolveram sair do corredor onde estavam. Bruna quase caiu contra a estante ao seu lado. Encabulado, Leonardo pediu desculpas e segurou-a delicadamente no antebraço, maldizendo-se intimamente por estar tão nervoso e estabanado. Fez um gesto polido apontando o caminho e deixou-a seguir a sua frente.
Bruna, pare de parecer uma adolescente num primeiro encontro. Até ontem vocês se odiavam. Agora, só porque soube que era viúvo...
Esquecido de que carregava um livro na mão, fez soar o alarme quando passou pela porta da livraria. Ao dar-se conta que não pagara pelo artigo, desculpou-se com o fiscal da saída e dirigiu-se quase correndo ao caixa, seguido por Bruna, que segurava o riso para não deixá-lo ainda mais embaraçado. Já bastava ter que enfrentar os olhares desconfiados de metade dos frequentadores da loja, como se eles fossem Bonnie e Clyde.




(continua...) 







Mais uma postagem feita! Vou fazer o possível para manter o ritmo de postagem dos capítulos seguintes, mas tenho medo de atrasar um pouco, pois ando com certa dificuldade de tempo. Além disso, daqui em diante tenho muito pouco escrito. Adorei cada comentário feito pelas minhas assíduas leitoras ( Nadja, Aline, Cris, Dena), a quem eu amo demais. Nem tenho como agradecer tanto carinho de vocês. Vocês me deixam muito feliz.
Muitos beijos!

domingo, 5 de setembro de 2010

Confusões de um Viúvo - Capítulo V

Somente naquela manhã levara o carro, para desamassar a lataria, no mecânico recomendado por Álvaro. Infelizmente, como todo o bom profissional, ele estava abarrotado de serviço e alertou-a que só poderia entregar o carro pronto na próxima segunda à tarde. Como não conhecia nenhuma outra oficina que executasse aquele tipo de serviço, decidiu por deixá-lo ali mesmo. Teria que conformar-se em ficar sem carro nos dias seguintes. Agora, de posse do valor a ser pago pelo conserto, teria que enfrentar de novo o senhor Leonardo Barth para entregar-lhe a nota. Durante o percurso da lotação que a levaria para a academia, foi imaginando mentalmente como seria este encontro. Sendo uma quinta, ele certamente levaria as filhas ao balé. Pediria à recepcionista que o mandasse à sua sala para entregar-lhe pessoalmente? Tinha medo da sua reação. Ele parecia alterar-se com facilidade. Ela também, pelo menos na presença dele. Talvez não fosse uma boa idéia fazer isto pessoalmente. Claro! Deixaria a nota na recepção... Não. No dia seguinte já estariam comentando que ele pagava as contas dela e que deveriam ser amantes. Sabia como este tipo de fofoca se espalhava. Não queria saber de mais confusões para o seu lado. E se colocasse na mochila de sua filha com um bilhete? Não. A mulher dele poderia achar e pensar coisas erradas. Duvidava que ele tivesse contado o que acontecera para a esposa. Será?
A lotação chegou à esquina em que Bruna deveria descer. Suas dúvidas tiveram que esperar o troco do motorista e sua descida do veículo, para só então continuar. Quem sabe via e-mail? Provavelmente ele teria um. Teria que verificar a ficha das meninas. Isis com certeza devia solicitar os e-mails dos pais na ficha de cadastro. Esta talvez fosse a melhor maneira... E se a mulher dele tivesse acesso ao e-mail dele? Nossa! Entrou na escola ainda indecisa sobre como faria a sua cobrança. Relutava em encontrá-lo de novo. Tinha medo de suas próprias reações. Se ao menos pudesse tirá-lo da cabeça... Resolveu que se entregaria ao trabalho, vendo a papelada da sua nova aquisição. Sua advogada combinara de visitá-la no final da manhã. Esperava estar liberada destas burocracias, para dedicar-se ao mais importante. A dança. Torcia para que já houvesse alunas para preencher as vagas na nova turma de dança contemporânea que ela iniciaria. O plano era começar já na próxima semana. Ensaiaria alguns passos naquela tarde, assim que tivesse uma folga. Sentia-se um pouco melhor do resfriado adquirido no domingo. Ao pensar nisso, não pode evitar a lembrança da visão de Leonardo sem camisa salvando-a das águas turvas do lago. Sacudiu a cabeça para espantar estes “maus pensamentos”. Entrou na academia, cumprimentando alegremente as recepcionistas e algumas alunas que por ali se encontravam. Agora era uma mulher de negócios. Quem diria que o destino faria isso a ela... Sentiu uma pontada no tornozelo esquerdo. Lembrou de sua mãe que costumava dizer que este tipo de cicatriz doía quando se anunciava chuva. Tomara que isto, se fosse verdade, só acontecesse à noite, quando estivesse no aconchego de seu "lar doce lar". Não queria ter uma recaída da gripe por causa de um banho de chuva.


Deve ter mandado consertar, pensou Leonardo ao notar a ausência de um certo carro amassado estacionado diante da escolinha. Enquanto deixava Tati em sua sala, questionava se devia procurar Bruna novamente para pedir o orçamento de seu carro ou se esperava que ela se manifestasse. A dúvida ainda persistia depois de beijar Marina e deixá-la na companhia de suas coleguinhas de turma e de Ana, a professora. Foi procurar um lugar discreto para sentar, relaxar e esperar a saída das aulas. Não estava com vontade de conversar. Por sorte, Cláudia não costumava ficar à espera de Fabiana. Deixava a menina lá e só voltava na hora do término. Segundo ela, aproveitava aquele período para dar suas voltas de dona de casa ou ir à manicure.
Os corredores apresentavam-se calmos naquele horário. Poucas turmas e todas em atividade dentro de suas respectivas salas. Então, ouviu uma música diferente das que costumava ouvir por ali. Aproximou-se da sala de onde fluía o som. A voz era a de Lenine, um de seus cantores preferidos, cantando a música “Cambaio”, da peça homônima de Chico Buarque. Assistira àquela peça no teatro há alguns anos e ficara fascinado com a versatilidade dos atores e a animação do palco. Não resistiu e olhou, através da porta aberta, a figura esguia, que dançava com as pálpebras cerradas, entregue totalmente ao ritmo musical. Era Bruna. Vestia uma malha preta, de mangas curtas, e uma calça larga, de tecido fino, da mesma cor. Seu primeiro ímpeto, ao reconhecê-la, foi sair dali, mas os movimentos harmoniosos e sensuais daquele corpo o fixaram ao chão. Ela movia-se como uma pena ao vento, mudando o rumo conforme os acordes, num balanço de quadris, pernas e braços, mexendo a cabeça, rodopiando em torno de si mesma, voluptuosamente, às vezes leve e languida, outras, rápida e vigorosa. Perdeu a conta de quanto tempo ficou a observá-la sem ser notado. Envolvido pela visão sedutora e pela música vibrante, não percebeu quando Bruna fez uma careta de dor. O encanto foi quebrado quando ela perdeu o equilíbrio e foi ao chão, em meio a um gemido alto. Lá ficou, sentada, segurando seu tornozelo esquerdo, com a cabeça baixa. Leonardo instintivamente correu até ela, aflito em saber o que acontecera e se ela estava machucada. Provavelmente torcera o pé e precisava de socorro.
- Você está bem?
Ela parecia soluçar. Quando a voz dele chegou aos seus ouvidos, silenciou instantaneamente e olhou para cima, encontrando o brilho angustiado daqueles verdes olhos. Seu rosto estava banhado por lágrimas, que imediatamente ela começou a secar com o dorso da mão livre, enquanto a outra persistia segurando o tornozelo afetado.
- O que está fazendo aqui? – perguntou num misto de surpresa e vergonha.
- Eu... Eu estava olhando você dançar – entregou-se – Você estava tão... Você dança tão bem, que... – interrompeu os elogios, temendo mostrar sua admiração em demasia – Machucou-se? Está doendo? – disse ajoelhando-se para se certificar da gravidade doferimento.
- Não... – ele estava tão próximo, que podia sentir o delicioso cheiro da sua colônia e ver os fios dourados da barba que sombreavam o rosto másculo e emolduravam a atraente boca. Notou a ruga de preocupação entre as sobrancelhas retas e espessas – Não foi nada...
- Me deixe dar uma olhada – pediu, esticando a mão para examiná-la.
- Não! – negou rechaçando-o amedrontada, tentando afugentar o desejo por ele – Já disse que não foi nada.
- Então por que está chorando? – falou docemente, sem importar-se com a rudeza dela – Pode ter torcido ou quebrado. Não tenha medo. Tenho alguma experiência com este tipo de lesão dos tempos em que eu jogava futebol.
- Não... – tentou normalizar o tom de voz, arrependendo-se de sua grosseria diante da apreensão dele. Ele parecia realmente preocupado com ela – É um ferimento antigo que, dependendo dos movimentos que faço, dói... Só isso.
- Consegue ficar de pé? Eu a ajudo... – seu olhar cruzou com o dela, transfixando-o.
Podia sentir a respiração quente e ofegante dele muito próxima de seu rosto. A atração tornava-se forte e incontrolável, quando ela decidiu rompê-la, graças a um fio de consciência que a alertou. Não podia deixar-se levar por estas sensações que aqueciam seu corpo e a tornavam indefesa. Ele é casado! , soou seu alarme.
- Eu já disse que não foi nada. Pode deixar – disse desviando o rosto e procurando um apoio no chão para poder levantar-se.
Sem importar-se com as negativas, Leonardo segurou-a pelo braço para ajudá-la a erguer-se. Quando conseguiu ficar de pé, sentiu a mão dele escorregar por sua cintura, enquanto a outra apoiava seu antebraço. Estremeceu.
- Que tal sentar-se naquela cadeira, enquanto peço para trazerem um pouco de gelo? – seus dedos pareciam pegar fogo ao senti-la sob aquela malha firmemente aderida ao corpo e ao tocar a pele acetinada de seu braço.
- Olha, você é muito gentil, mas pode deixar. Eu me viro sozinha. Já estou acostumada com esta dor – lutava contra sua vontade de ficar aninhada entre aqueles braços fortes e confortáveis que já a tinham salvo dias antes.
- Você ainda está com dor. Por que é tão teimosa? É tão difícil assim aceitar a minha ajuda? – Sentiu-o retesar-se visivelmente magoado – Não se preocupe. Vou embora assim que a deixar na cadeira. Prometo que não vou incomodá-la mais – disse mais secamente.
Foi o que fez. Colocou-a sentada o mais comodamente possível e saiu dizendo um amargo até logo. O pedido para que ficasse ficou preso entre as cordas vocais de Bruna.
Quando cruzava a porta, sob o olhar tristonho da bailarina, quase deu um encontrão em Sandra, a mãe da amiguinha de Tati.
- Oi! – saudou-o com sua voz estridente e um sorriso arreganhado – Estava procurando por você. A Tati estava perguntando pelo pai. A aula delas já está acabando.
Atônito com o encontro inesperado agradeceu num muxoxo e passou reto pela mulher.
- Não há de quê – disse chateada com a falta de simpatia dele e já esticando o pescoço para ver com quem ele estava na sala de onde saiu – Oi, tudo bem? – Aconteceu alguma coisa? – perguntou enxerida.
- Nada. Só machuquei meu tornozelo quando dançava. Já está tudo bem, obrigada.
- Está bem, então. Vou lá buscar a Fernanda, minha filha... Tchau.
Será que está acontecendo alguma coisa entre esses dois? Tem mulheres que não dão mole. Aposto que estava se fazendo de vítima para atraí-lo... – pensou Sandra, maliciando a situação. – Pois tem concorrente, meu bem...

Os versos da música de Chico não deixavam a sua mente, bem como as imagens de Bruna flutuando no salão.
Eu quero moça que me deixe perdido
Procuro moça que me deixe pasmado
Essa moça zoando na minha idéia
Eu quero moça que me deixe zarolho
Procuro moça que me deixe cambaio
Me fervendo na veia”...
Foi despertado pela voz miúda de Tati.
- Papai! Onde você tava? – exclamou jogando-se em seus braços, quando o viu em meio às mães de suas colegas. Estava preocupada, pois o pai sempre a espreitava durante as aulas. Precisava de mais atenção do que Marina. Ficava ansiosa se não o via de vez em quando a sorrir na porta da sala, incentivando-a.
- Eu... Fui ao banheiro, querida – explicou com um pálido sorriso – Mas já estou aqui. Vamos lá pegar a mana?
- Vou dar tchau prá “fessora”, papai...
- Professora, Tati. Professora – falou pausadamente, corrigindo-a e dando-lhe um beijo na testa.
- Tá bom, tá bom... – e saiu esvoaçante, agitando os bracinhos.
Sandra aproximou-se dele e comentou:
- Você foi comunicado sobre a nova dona da academia?
- O quê? – indagou confuso – Ah, sim... É a Bruna.
- Já a conhecia? – sondou curiosa, apertando os olhos argutos.
- Não... – O que essa mulher está querendo? pensou arqueando as sobrancelhas – Fiquei sabendo na última terça-feira.
- Pensei que já a conhecia... Vocês estavam conversando agora há pouco...
Mas que tipa intrometida...
- Tati, vamos anjinho – voltou a atenção para a filha que retornava e deixando Sandra a falar sozinha – A Marina já deve estar saindo.
- Por favor, não fique chateado. – Notou o aborrecimento dele – É que estou curiosa a respeito dela... Só isso – disse arrependida de seu comentário anterior. Tinha que ter cuidado com o que falava para não assustá-lo.
- Não estou chateado. Apenas tenho que ir – sorriu debilmente – A gente se fala outra hora, tá? Até mais. – Despediu-se e pegou a mão de Tati, fugindo do interrogatório, deixando Sandra amolada por ter sido ignorada tão sutilmente.

Quando chegou à sala de aula de Marina, lançou um último olhar para o local onde havia deixado Bruna. Ela ainda estava lá e provavelmente com dor. Gostaria de saber que tipo de ferimento era aquele que a impedia de dançar livremente. Decidiu falar com Ana e pedir que fosse ver a colega. Para isso, aguardou a saída das alunas, deixando Marina e Tati a brincar no corredor, onde podia mantê-las sob sua vista.
- Oi, Ana!
Ana
- Oi, Leonardo! Tudo bem? Algum problema?
- Não... É que estou preocupado com a Bruna, a nova diretora aqui da escola. Ela caiu enquanto dançava ainda há pouco e não permitiu que eu a ajudasse. Será que você podia dar uma olhada nela?
- A Bruna caiu? Ai, meu Deus! Onde ela está?
- Na última sala deste corredor.
- Muito obrigada. Vou lá ver o que aconteceu – disse antes de sair correndo na direção que ele indicara.
- Papai! Não vamos embora? – gritou Marina, vendo o pai meio que perdido entre ir ou ficar, alertando-o.
- Claro, filha. Já vamos sim. – respondeu, obrigando-se a sair do lugar.
Um último olhar para onde estava Bruna o tranquilizou, pois viu Ana e ela saindo de braços dados. Seus olhares ainda se cruzaram rapidamente antes dele atender ao puxão recebido de Marina, forçando-o a caminhar.

- Andou exagerando nos passos, Bruna? – perguntou Ana à amiga.
- Nada demais. Só me desequilibrei e caí de mau jeito – tentou amenizar sua imprudência.
- Amiga, você sabe...
- É, eu sei... Mas é tão difícil... Eu ainda me pergunto por que isto aconteceu logo comigo? É tão injusto...
- Eu só imagino... De qualquer forma, você tem que ter cuidado, pois se continuar insistindo pode piorar a lesão e conseguir uma proibição até para ensinar.
- Tem razão, Ana. Ainda mais agora que consegui esta oportunidade de ter uma escola de balé só minha. E graças a você.
- Que nada. Só a apresentei para a Isis. Nada mais. Vocês é que se entenderam bem – sorriu abertamente e conduziu Bruna para a área da direção – Que tal uma bolsa de água quente neste pezinho, hein? Por falar em quente, o que é que o pai da Tati, aquele pedaço de mau caminho, estava fazendo por perto quando você caiu?
- O pai da Tati? - indagou pensativa e logo enrubesceu – Ah! O Leonardo... Ele apenas me viu cair.
- Ah, o Leonardo... – imitou-a – Tá bom... Ele veio todo preocupado me pedir para socorrer você.
- Mostra que é um homem educado e prestativo – falou intimamente satisfeita com a preocupação dele, mesmo depois do que acontecera.
- Ele parecia um pouco mais que isso... – continuou provocativa.
- Pára com isso, Ana. Aonde quer chegar com estas insinuações bobas? – criticou-a – Ele é casado e pai de duas alunas. Só isso.
- Está bem. Não está mais aqui quem falou, mas você está enganada quanto a ele ser... – interrompeu o assunto quando viu a senhora responsável pela limpeza aproximar-se, antes de entrarem na sala de Bruna – Oi! A senhora poderia nos conseguir uma bolsa de água quente, por favor?
- Acho que vi uma lá na despensa. A senhora se machucou, D. Bruna?
- Só dei um mau jeito – simplificou a explicação para a funcionária.
- Já volto com a bolsa. Esperem só um momento.
- Obrigada – agradeceram quase ao mesmo tempo, Bruna e Ana.
Foi quando Ana conseguiu acomodar Bruna em sua cadeira e pensava em retomar o assunto Leonardo, que o próprio surgiu no umbral da porta com Tati e Marina pela mão. Por um momento ele pareceu não saber o que dizer, mostrando-se reticente e ansioso. Já se maldizia por não ter ido embora quando teve oportunidade. Poderia ligar no dia seguinte e perguntar se ela estava bem. Contudo agora era tarde. Já estava frente a frente com Bruna e com um pretexto na ponta da língua...
- Oi... Está melhor? – perguntou dirigindo-se a Ana.
- Vamos colocar uma bolsa de água quente e logo ela vai estar bem – respondeu Ana, já que Bruna parecia estar ocupada demais olhando para ele atônita.
- Ela tá dodói, fessora? – perguntou Tati, lançando um olhar tristonho para Bruna que estava com o pé apoiado numa baqueta.
- Só um machucadinho à toa, meu bem. Ela já, já vai ficar bem – Ana tranquilizou-a.
- Eu posso ver? – continuou curiosa.
- Tati, comporte-se – ralhou baixo, seu pai.
- Pode , anjinho, pode ver sim. Vem cá – convidou-a Bruna, recuperando a voz e acenando-lhe – Pode ver que não tem nada de mal aqui – disse mostrando o tornozelo sob a meia de balé.
Tati se desprendeu da mão de Leonardo e correu para Bruna. Marina seguiu-a curiosa, para constrangimento do pai.
- Meninas, por favor...
- Não, pode deixar. É melhor verem que está tudo bem... – disse Bruna, olhando para ele reprovadoramente – Viram? Só preciso descansar um pouco e logo vou estar nova em folha. Se me derem um beijinho, melhoro mais rápido ainda.
Marina e Tati sorriram e imediatamente a beijaram na face, uma de cada lado, emocionando Bruna.
- Na verdade – interrompeu Leonardo desconcertado com a cena de carinho – vim aqui por causa do carro. Você não disse quanto foi o conserto e... – disse ele explicando a sua presença ali. Este era o seu pretexto para vê-la e certificar-se que estava melhor.
Ana olhou surpresa para Leonardo e depois para Bruna, mas evitou fazer qualquer comentário.
-Acho que não é uma boa hora para se falar nisso. Você tem fax? Ou e-mail? Posso mandar para você o orçamento e depois acertamos tudo – disse sentindo-se estranhamente constrangida. Ele voltou só por isso...
- Tem razão... Me desculpe... – era a vez de ele ficar sem jeito, remexendo nervosamente no bolso do casaco e tirando sua carteira, de onde sacou um cartão e entregou a ela. – Este é o meu cartão. Aí tem o endereço, telefone e e-mail do meu escritório... Bom, Marina e Tati, vamos embora para deixar a professora descansar.
- A minha mãe também fez um dodói... – falou Tati inesperadamente.
- Tati, vamos – falou Leonardo, antecipando dolorosamente o que a filha diria a seguir.
- Mas ela ficou boa, não ficou? – perguntou Bruna inocentemente.
- Acho que não... O papai do céu levou ela e não trouxe mais.
Bruna olhou atarantada para Leonardo e depois desconsolada para a pequena, que a mirava com tristeza nos olhinhos cor de mel. Estava sem chão. Completamente sem graça. Não sabia o que dizer. Ele é viúvo? Elas não têm mãe? Meu Deus! Que estúpida que fui! Pobrezinhas!
Leonardo foi o primeiro a quebrar o silêncio insuportável que se fez após o comentário de Tati.
- É melhor nós irmos embora. Vamos, meninas! Já incomodamos demais as professoras aqui – ordenou às filhas evitando olhar para Bruna.
- Ah, papai...
- Vamos agora! – falou mais enérgico, sem alterar muito a voz.
- Eu... – Bruna queria desculpar-se de alguma forma pelo mal entendido – Desculpe... Eu não sabia... – Sentia-se muito mal com a situação criada.
- Não se preocupe... Não tinha obrigação de saber... – tranquilizou-a – Boa noite e desculpem qualquer coisa.
Recolheu as filhas e saiu rapidamente da vista das duas mulheres.
Assim que se viram sozinhas de novo, Bruna fulminou Ana.
- Por que você não me falou que ele era viúvo? Fiquei numa saia justa daquelas e, ainda por cima... Você viu a carinha da pequenininha? Tadinha... – sentiu vontade de chorar ao lembrar a expressão de Tati.
- Pensei que você soubesse. Ia justamente falar sobre isso quando ele apareceu na porta.
- E eu pensando mal dele este tempo todo... – pensou alto.
- Por que pensando mal? O que está acontecendo? – Queria saber o motivo de Bruna ter ficado tão aborrecida – E que história é esta do carro?... Não me diz que foi ele que...?
- Foi, Ana, foi.
- Por que não me contou?
- Não sei. Acho que esqueci ou não achei relevante ou achei que tinha falado e não falei... Não sei. Isso não vem ao caso agora.
- Aqui está a bolsa quente, D. Bruna – disse a faxineira ao entrar na sala, interrompendo-as – Precisa de mais alguma coisa?
- Não, muito obrigada – respondeu Bruna aliviada com a intromissão da mulher. Colocou a bolsa de borracha avermelhada sobre o tornozelo que estava em repouso sobre a banqueta de madeira.
Ana resolveu não voltar a interpelar a amiga sobre o ocorrido, já que aquilo parecia incomodá-la. Além do mais estava atrasada. Deixaria a conversa para depois.
- Melhor eu ir. Tenho que dar minha última aula e sair correndo. Fiquei de passar na casa da minha mãe assim que terminasse aqui.
- Tá bom, Ana. Pode ir. Já estou bem.
- Amiga... Se precisar conversar, me liga mais tarde.
- Obrigada, Ana. A gente conversa em outra hora.
Ana saiu. A cabeça de Bruna rodava, lembrando da maneira como tratara Leonardo em todas vezes em que se encontraram. Agora percebia que estava furiosa consigo mesma, por sentir-se atraída por um homem casado e achar que ele era um safado por parecer estar interessado nela. Que loucura... Começou a lembrar da noite no restaurante, quando ele desviou o olhar timidamente ao vê-la sorrir para ele. Devia estar com amigos, apenas. Passou a vê-lo apenas como um pai solitário dedicado às filhas, levando-as para passear. Mesmo preocupado com a segurança delas, atirou-se ao lago para salvá-la. Está certo que tinha havido o acidente no supermercado, mas os dois foram culpados. E ele tinha sido grosseiro com ela. Em compensação, hoje, ele tinha demonstrado tanta preocupação e cuidados, quando a viu cair... Lembrou seu olhar... Aqueles olhos... A forte atração mútua na hora em que ele a ajudou a levantar-se. Eu devo estar imaginando coisas... Menos o que estou sentindo agora.

(continua...)




Desculpem ter demorado tanto com esta postagem, mas como expliquei no mural dos recados, viajei na sexta-feira, antes de postar o capítulo. Levei o computador comigo, mas não tive tempo de abrí-lo para entrar na internet. Espero que gostem da continuação. Muito obrigada às minhas amigas queridas que não deixam de comentar minhas postagens. Minhas boas-vindas à Taty, minha amiga de longa data e tb escritora.
Um beijo a todas vocês!