segunda-feira, 22 de junho de 2009

DOCE ENGANO - PARTE II

Não conseguia abrir os olhos. Ouvia os sons da casa ao longe, mas não conseguia identificá-los. Minha cabeça parecia estar enorme e pesada. A boca seca e a língua grossa. Que sensações horríveis. Nunca mais ia beber um cálice de vinho. Aos poucos minha memória foi voltando. Olhei para minha mesa de cabeceira e vi um copo de água coberto por um guardanapo branco e dois comprimidos ao seu lado. Sorri ao lembrar vovô falando que ia deixar analgésicos para eu tomar pela manhã. Pelo menos eu lembrava detalhes como este. Afinal eu não ficara tão bêbada quanto parecia. Tomei as drágeas e sequei o copo. Estava com muita sede. Então me lembrei de Alex e de seus beijos antes de partir. Senti o corpo amolecer ao recordar o seu toque, o seu abraço e a pressão de seus lábios contra os meus. Ele tinha prometido vir à tarde. Oh, meu Deus! Que horas seriam? Quanto tempo eu ficara dormindo?
Neste instante entrou Agostina, dando bom dia alegremente, trazendo uma bandeja com um copo de suco de laranja.
- E então, a minha dorminhoca como está?
- Bom dia, Agostina. Que horas são?
- Quase hora do almoço. Trouxe este suco para animá-la um pouquinho e abrir o apetite.
- Não, acho que só vou tomar o suco. Não vou conseguir almoçar.
- Mas hoje é sábado. Você já não almoça durante a semana. Hoje é dia de almoçar. Você vai ficar muito fraca se continuar assim.
- Ai, Agostina, por favor! Eu estou com uma terrível dor de cabeça. Talvez eu coma alguma coisa mais tarde.
- Seu avô está lá embaixo. Pediu para avisá-la que quer conversar, assim que estiver em condições.
- Ai, o sermão vai ser hoje.
- Melhor você tomar um banho, arrumar-se e descer para falar com ele. Parece que está meio preocupado. Ficou muito nervoso depois que um homem veio até aqui hoje cedo. Ele já tinha estado aqui há dois dias.
- Como ele era, Agostina?
- Um sujeito baixo, troncudo, cabelos pretos, rosto redondo, com cara de poucos amigos – suspirei aliviada ao ouvir que a descrição não fechava em nada com a figura de Alex. Ele me dissera a verdade.
- Está certo, Agostina. Vou me aprontar e já desço para falar com Don Pippo.
Assim que ela deu as costas, levantei-me o mais rápido que a dor na cabeça permitia e fui para o banho. Quem seria este homem misterioso e o que ele estava fazendo para deixar vovô tão preocupado?

- Até que enfim, acordou! Tomou o analgésico que deixei na sua mesinha? – falou sorrindo.
- Tomei sim, obrigada. A Agostina me disse que queria falar comigo. Também preciso falar com o senhor.
- Vamos dar uma volta antes do almoço?
- Claro. Só deixe pegar meus óculos escuros. Não vou resistir toda esta luz nos meus olhos.
Saímos a caminhar em direção às oliveiras, tão logo me protegi contra os raios de sol.
- Então, você começa primeiro. Desde quando você conhece o Alex?
- Ah, eu o conheci na estrada há dois dias. Ele me pediu informações. Mais tarde nos encontramos de novo, durante o temporal de quinta-feira. Foi ele quem me trouxe para casa quando a Fiorino ficou sem gasolina, na estrada. Acabou me convidando para jantar e me trouxe em casa depois, como o senhor mesmo pode ver ontem á noite.
- É, eu vi muito bem – falou querendo parecer aborrecido, mas já mostrando os olhinhos brilhando – Estou brincando, Gigi. Fico contente que esteja saindo com alguém e que este alguém seja o Alex. Ele é um ótimo rapaz.
- Sério? O senhor já o conhecia? Eu nunca tinha ouvido falar dele, só da empresa para a qual ele trabalha.
- Empresa que ele trabalha?... Ah, sim – pareceu que ele tinha ficado com alguma dúvida, mas logo voltou a falar de Alex, confirmando tudo que ele me havia contado.
Minha dor de cabeça parecia ter desaparecido como por encanto. Sentia-me radiante depois das palavras de meu avô. Podia confiar em Alex, finalmente. Aí, lembrei do outro visitante.
- Vovô, o que o senhor queria realmente conversar comigo? A Agostina contou que esteve um homem aqui, pela manhã, que o deixou nervoso. Quem era?
- A Agostina não tinha nada que falar por mim – sua expressão ficou anuviada e as rugas da grande testa ficaram mais evidentes – Este homem é o tal que veio visitar-nos na tarde de quinta-feira. Diz ser de uma empresa que está interessada em comprar as pequenas vinícolas da região para industrializar a produção do chianti. É possível um absurdo destes?
Eu já havia dito que não aceitava nenhum tipo de proposta deste tipo, mas o sujeito é teimoso e parece não aceitar um não. O nome dele é Tomasino. Aliás, não quero que você chegue perto deste tipo, Giulia. Se ele tentar se aproximar de você, fuja. Fale comigo! Você entendeu? Diga que sim.
- S-sim, entendi. Mas ele pode ser perigoso?
- Talvez. Não sei. Mas não gostei do jeito dele. Só isso. Você sabe que você é o meu tesouro, não sabe, bambina? – falou isso e abraçou-me carinhosamente, enquanto voltávamos na direção de casa – Vamos almoçar? Agostina disse que ia preparar o seu prato predileto: lasanha de berinjela. Ela prometeu que ia fazer separado para mim, colocando massa. Não sei como você pode gostar de lasanha sem massa. Para mim, isto não é lasanha – antes que eu pudesse defender minhas teorias, ele adiantou-se e falou – Já sei! É mais saudável, não engorda, etc... Este mundo está perdido!
Continuamos caminhando, dando risada de nossas diferenças. Parece que eu não teria alternativa a não ser almoçar.
- O Alex ficou de vir hoje à tarde para conversar com o senhor.
- Só comigo? - falou, com um sorrisinho irônico.
- Comigo também. Mas ele ficou preocupado quando eu contei sobre o outro homem que o visitou.
- Vai ser bom. Tenho de conversar mesmo com ele. Não vai ficar chateada se for em particular?
- Não. Tem mais alguma coisa que eu não saiba? Vocês estão escondendo algo de mim?
- Não. São apenas negócios, nada de mais. Estou morrendo de fome! Você não está?
- Nada como mudar de assunto. Mas tudo bem. Eu respeito os seus segredinhos com o Alex. Esta conversa até já está me dando fome. Vamos!

Passei a tarde tentando me distrair, lendo um livro, caminhando, indo até o escritório revendo algumas contas, mas nada conseguia tirar aquela ansiedade do meu peito. Alex não tinha dito exatamente a que horas viria. Já estava a ponto de pegar o carro e ir até Arezzo, quando vi o seu conversível preto apontando nos portões da propriedade. Segurei a vontade de correr até ele. Não podia dar este gostinho de vitória para ele. Não podia ser tão fácil. Assim, fui avisar vovô da sua chegada e fiquei aguardando que ele estacionasse o Porsche e viesse até nós.
- Boa tarde! Don Pippo... Giulia...
- Boa tarde, Alex! Vamos entrando! Por aqui! – gritou meu avô.
Passou por mim sem tirar os olhos, me devorando com o olhar, deixando-me excitada como se tivesse sido despida na porta de casa. Fomos para a sala de estar. Sentei numa poltrona, de frente para o sofá onde ele acomodou-se confortavelmente.
- Pois é, Don Pippo, vim aqui para esclarecermos algumas dúvidas da sua neta a meu respeito – fez questão de dar ênfase na palavra neta como para me lembrar o que eu havia ocultado dele.
- Ela me contou. Mas já conversamos e tudo já foi esclarecido. Não é, Giulia?
- Claro. Não existem mais desconfianças – tentava não olhar para os seus olhos com medo de perder o controle e me jogar sobre ele ali mesmo. Ele estava mais lindo que nunca, numa calça caqui e uma camiseta verde oliva, grudada ao corpo, que o deixava mais sensual do que nunca.
- Alex, lembra quando lhe falei sobre o homem que havia estado aqui depois de você? Parece que ele voltou e ameaçou Don Pippo – falei, tentando dissimular o que eu estava sentindo com a sua presença ali, mas também para pedir ajuda.
- Ameaçou?
- Não. Não foi bem uma ameaça. Pelo menos não deixou nada claro. É o modo como ele fala, sabe. Muito desagradável - respondeu Don Pippo.
- O senhor já sabe se ele já visitou seus vizinhos?
- Parece que sim. Alguns ele conseguiu atemorizar e, estes, estão pensando em vender. Acham que já estão muito velhos para tocar o negócio e não tem herdeiros interessados em manter o negócio em família.
- O senhor pode me dar o nome destas pessoas? Vou tentar reverter esta situação.
- Como? – perguntei surpresa com o interesse dele naquele assunto.
- A minha empresa, como eu já havia lhe dito, tem interesse em manter a produção do chianti do modo tradicional. Não queremos que haja a industrialização, nem que para isto tenhamos que comprar as vinícolas e continuar o negócio.
- Que ótima notícia, Alex! - vibrou meu avô – Precisamos conversar um pouco mais. Giulia, por favor, querida, você pode nos dar licença? Tenho que falar em particular com Alex.
- Giulia, espero que não tenha esquecido do meu convite para logo mais. Lembra?
- Claro que lembro.
- Porque você não vai se arrumar e nos encontramos daqui a pouco para sair? – a sua voz rouca e mansa me hipnotizava. Deixava-me sem ação. Só consegui dizer que sim e nada mais. Nenhuma contestação.
- Então, com licença – aquele sorriso dançando em seus lábios e os olhos azuis me seguindo... Eu quase flutuava enquanto subia em direção ao meu quarto, apesar de estar curiosa para saber o que eles tanto tinham que conversar em particular. Tentaria descobrir alguma coisa, mais tarde, com Alex.
Naquela noite, resolvi colocar uma roupa mais sexy do que a da noite anterior. Como íamos dançar, coloquei meu vestido vermelho, de musselina, esvoaçante, próprio para dançar, com um generoso decote nas costas. Havia sido comprado nos tempos em que morava em Florença e muito pouco usado. Resolvi prender o cabelo. Quando terminei a arrumação, olhei-me no espelho e pensei se não estava parecendo muito “vamp”. Achei que tinha exagerado. Vestida daquele jeito eu o estaria provocando para outras coisas mais além de dançar. No fundo, era exatamente o que eu queria mesmo. Mas não podia ser tão clara. O que ele pensaria de mim? Que hipocrisia, não, dona Giulia? Depois de muito olhar, resolvi diminuir um pouco a maquiagem e soltar o cabelo. Coloquei apenas um conjunto de colar e brincos de cristais Swarovski, muito delicado, que tinha sido de minha mãe. Pus o meu perfume predileto e saí do quarto. Havia se passado quase duas horas.
Desci as escadas, ouvindo as risadas de vovô e de Alex, vindas da sala. Quando surgi na sala, notei a expressão embasbacada de Alex.
- Pelo menos valeu esperar todo este tempo. Você está linda!
- Alex, lembre-se de que ela é minha neta, ouviu? – olhou para mim preocupado, aproximou-se e disse, quase sussurrando em meu ouvido – Está linda, mas precisava deste decote todo?
- Ah, Don Pippo. Nós vamos dançar e este vestido é apropriado para isso.
- No meu tempo, este vestido seria apropriado para outros fins.
- Don Pippo, não se preocupe. Eu trarei a Giulia sã e salva no final da noite.
- Assim eu espero. E não me dê aquele seu vinho da Califórnia para ela. Não a quero bêbada do jeito que ela chegou ontem.
- Vovô, eu não fiquei bêbada. Só um pouco mais alegre.
- Está bem, está bem! Dêem o fora daqui antes que eu não permita esta sem-vergonhice.
Alex deu-me sua mão e saímos.
- Vou ser obrigado a passar no hotel e vestir uma roupa mais adequada para sair com você.
- Não, você está bem.
- Estou bem para comer um sanduíche na lanchonete mais próxima.
- Se você for sentir-se melhor, vamos.
Quando ele foi abrir a porta do carro para eu entrar, deu um jeito de me escorar contra a lataria, prendendo-me contra o seu corpo. Suas mãos agarraram minha cintura e logo estava sentindo o gosto de seus lábios mais uma vez. Quase perdi o fôlego. Lembrei que meu avô poderia estar olhando e o afastei o mais rápido possível.
- Alex, vovô pode estar olhando!
- Desculpe, mas é que não resisti. Estava com vontade de beijá-la desde que cheguei aqui. E agora, com você vestida desse jeito, sou capaz de fazer amor aqui mesmo.
- Alex! – exclamei, deixando escapar um riso nervoso – Acho que quem vai trocar de roupa sou eu. Vou voltar para casa e vestir a roupa de ontem.
- De jeito nenhum! Vamos! Entre logo no carro! – disse, sorrindo e empurrando-me delicadamente.
Durante a curta viagem até Arezzo, não pude resistir e perguntei a respeito da conversa em particular dos dois.
- Nós só conversamos sobre negócios. Peguei o endereço dos dois produtores que estão dispostos a vender suas vinícolas. Você demorou tanto que até já entrei em contato telefônico com eles e acertei uma visita.
- O que mais?
- Nada mais. Falei sobre as possibilidades de aumentar a produção de uvas por metro quadrado. O que mais? – lançou um olhar pensativo, como se quisesse lembrar-se de mais alguma coisa.
- Tenho certeza de que vocês estão escondendo algo de mim. Estou muito preocupada com este homem misterioso que visitou a vinícola. Don Pippo não é de assustar-se facilmente.
- Neste ponto, já estamos tomando providencias. Não se preocupe. O seu avô me disse que já lhe pediu para manter-se afastada dele, não? Obedeça-o, ok? Pode ser perigoso mesmo – ele agora falava sério e apresentava uma charmosa ruguinha no meio da testa, entre as sobrancelhas.
- Eu estou começando a ficar com medo. Sinto que tem mais coisas aí do que vocês estão dizendo.
Ele continuava muito sério. Parecia tentar encontrar as palavras certas para me tranquilizar, até que falou:
- O que eu posso te dizer, Giulia, é que não sabemos até que ponto estas pessoas podem chegar para conseguirem o que querem. Até tudo estar resolvido, todo cuidado é pouco. Não fale com ninguém sobre isto. Se tiver qualquer dúvida ou temor, fale comigo. Não importa a hora, está bem?
- Está bem.
- Olhe, já estamos chegando – ele estacionou diante do hotel e, enquanto o manobrista levava o carro, pegou-me pelo braço e entramos no saguão. Pediu sua chave:
- Apartamento 38, por favor.
Assim que as pegou, olhou-me daquele jeito que me fazia estremecer toda e disse:
- Vamos? Eu me arrumo rápido e saímos.
- Não. Eu espero por você aqui no saguão – falei, sem conseguir encará-lo.
Levantei os olhos quando ouvi a sua risada.
- Eu não gostaria de deixá-la aqui sozinha, sob os olhares de todos estes italianos indo e vindo por aqui.
- Acho que é mais seguro aqui do que com você lá.
- Você que sabe – falou assim e deu de ombros – Não saia daqui, então. Logo estou de volta – deu-me um beijo rápido e inesperado na boca e saiu caminhando em direção aos elevadores.
Procurei uma poltrona confortável para sentar-me e fiquei observando o movimento das pessoas que entrava e saíam do hotel. Adorava fazer isto. Sempre se encontravam tipos interessantes e engraçados, vindos do mundo todo.
Enquanto seguia na minha diversão, subitamente notei que estava sendo observada intensamente por um homem. Fiquei tensa ao perceber que a descrição de Agostina batia exatamente com o aspecto dele. Gelei ao ver que estava começando a caminhar na minha direção.
- E então? Demorei? – a voz de Alex foi como um bálsamo sobre minha sensação de terror - O que houve? Você está pálida!
- Não olhe agora, mas o tal homem, Tomasino, está aqui.
- Onde?!
- Ele estava aqui, agora a pouco, me olhando, quando você apareceu – tentei achar aquela figura sombria no saguão, mas não o vi mais – Ele desapareceu. Pouco antes de você chegar. Pensei que ele viria falar comigo. Estava apavorada.
- Calma. Vamos sair daqui.
Intrigado, me perguntou:
- Mas você já o conhecia? Achei que ele falara apenas com Don Pippo.
- A Agostina, que trabalha em nossa casa, o viu e deu-me a sua descrição. Tenho certeza que era ele.
Só então notei a elegância de Alex. Ele havia trocado sua roupa esportiva por um belo terno marinho, com uma camisa branca por baixo, aberta até o terceiro botão, o que deixava vislumbrar parte de seu peito e alguns pelos grisalhos. Ele também parecia estar com péssimas intenções.
- Você está muito elegante.
- Para poder acompanhá-la, não podia estar vestido de outra forma – falou extremamente sedutor.
Pediu o carro e logo estávamos a caminho de uma casa noturna muito conhecida em Arezzo. Lá já nos aguardava, em um local mais discreto, uma mesa finamente decorada para o jantar, com um grande balde de gelo e uma garrafa de champagne “Veuve Clicquot”.
- Achei que podíamos jantar tranquilamente antes de cairmos na dança. O que acha?
- Maravilhoso! – realmente, eu estava adorando cada detalhe, principalmente por ter sido ele que tivera estes cuidados - Se você está tentando me impressionar com tudo isto... Está conseguindo.
Ele mostrou um sorriso de vitória adorável. Senti que estava ficando irremediavelmente apaixonada por aquele homem.
Os assuntos desagradáveis foram esquecidos durante o jantar. Ele me contou sobre seus estudos na faculdade, sobre suas viagens e fatos pitorescos. Quis saber mais sobre minha família, sobre meus pais e minha avó. Demos boas risadas. Várias vezes ele pegou em minha mão, acariciando-a. Sentia que podia afogar-me naqueles dois oceanos azuis que cintilavam diante de mim. Não teria ninguém que pudesse me resgatar.
- Vamos para a pista dançar? – perguntou-me assim que terminamos a sobremesa e a última taça de champagne.
- Sem dúvida! - Sentia-me leve, mas não tonta como na noite anterior.
Já havia alguns casais dançando animadamente. O DJ era excelente..
Alex dançava muito bem. Logo começaram as músicas lentas. Aí, não tive como escapar do seu abraço. Aquela proximidade... Sentir o calor do seu hálito no meu rosto, em meus cabelos. A pressão de suas mãos sobre o meu corpo. Ondas de desejo percorriam todos os meus sentidos. Quando nossos olhares se cruzavam sentia faíscas saltando no ar, confundindo-se com a iluminação cintilante do salão. Depois da segunda dança, o ouvi dizendo baixinho no meu ouvido, provocando um arrepio no pescoço:
- Vamos embora? Preciso ficar sozinho com você – sua voz estava mais rouca que o normal e seu olhar era de súplica.
- Para onde você quer ir? – tinha medo da resposta, mas ao mesmo tempo, ansiava por segui-lo e me deixar abandonar completamente em seus braços.
- Para o hotel – dizendo isto, beijou-me o pescoço, deslizando os lábios até o ombro, arrancando-me um gemido.
- Vamos...
Pegamos o carro e partimos rapidamente para o hotel de Alex. Sabia que aquilo era uma loucura. Afinal, eu o conhecia há pouco mais de três dias. Mas não me importava com mais nada. Eu estava louca por ele.
Subimos até o terceiro andar, impacientes, aos beijos, sofregamente. Quando a porta finalmente se abriu, corremos até o número 38.
O desejo tomou conta de nós completamente. Quando dei por mim, já estava sem a parte de cima do vestido. As alças haviam sido baixadas com grande habilidade, e aquelas mãos fortes e macias acariciavam meus seios e minhas costas com impaciência. Afastei-o um pouco para poder tirar o seu casaco e começar a desabotoar sua camisa. Logo, pude ver seu tórax esplêndido, os braços magníficos, que me puxavam ao seu encontro, e a boca que procurava meus lábios avidamente. Fomos andando, desta maneira, agarrados, até o quarto. Lá, fui jogada na cama e pude ver Alex tirando suas calças agilmente, colocando a mostra seu sexo latejante e ansioso por mim sob sua roupa íntima. Terminou por despir-me e lançou-se em mais carinhos. Agora, não só com as mãos, mas também com os lábios e com a língua, que passeava por todos meus contornos, deixando seu rastro úmido, marcando minha pele, arrancando gemidos intermináveis. Minhas mãos agarravam-se em seus cabelos, puxando-o contra mim. Já não aguentava mais. Precisava dele dentro de mim, com urgência. Senti-o deitando-se sobre meus quadris, encaixando-se em minha pelve e penetrando-me, como fogo ardendo. Eu queria queimar e ser queimada. Ele cavalgava, quase com fúria, levando-me ao prazer total. Logo, ele também gemia alto, satisfazendo seus sentidos e chegando ao orgasmo. Quando os movimentos tornaram-se mais lentos, deitou-se sobre mim, ainda arquejando, dizendo meu nome em voz baixa e chamando-me de seu amor. Eu chegara ao paraíso e lá continuava, ao ouvir aquelas palavras. Deixamos-nos ficar assim,. Exaustos, por algum tempo. As palavras não eram necessárias. Estávamos completos.
Não tinha noção de quanto tempo ficamos ali deitados, lado a lado, pernas e corpos entrelaçados. Abri meus olhos e vi que Alex ainda estava dormindo. Observei as linhas de seu rosto, suas marcas de expressão, os sulcos de sua testa, o cabelo levemente prateado, aquele perfume amadeirado misturado ao cheiro de seu suor. Tive vontade de acariciá-lo, mas medo de acordá-lo. Vontade de começar tudo de novo. Acabei não resistindo e passei a conduzir minha mão por seu peito, sentindo os movimentos de sua respiração, os pelos do tórax. Eu poderia ficar por horas a adorá-lo em seu sono. O desejo voltava aos poucos, fazendo com que minhas mãos descessem ao seu abdômen, em direção ao púbis. Foi quando seus olhos abriram-se e um lindo sorriso iluminou a penumbra do quarto.
- Está tentando abusar de mim?
- Só um pouquinho...
Ele virou-se um pouco mais e puxou-me contra si, acariciando-me as costas e já procurando por meus beijos. Os gemidos de prazer reiniciaram-se e mais uma vez nos amamos loucamente.

- Alex, vou ter de sair. Tenho que voltar para casa. Está muito tarde.
- Não... Vamos passar a noite juntos – falou ainda sonolento.
- Eu adoraria ficar, mas o meu avô... Ele vai ficar preocupado.
- Ele sabe que você está comigo. Deixe de ser boba. Ele é italiano. Vai entender.
- Ele é italiano e eu, sua neta. Ele poderia entender isto com outras mulheres, não comigo, sua bambina. Capice? Olha, eu pego um táxi. Não se preocupe.
- Como não me preocupar, com aquele Tomasino a solta por aí? – ele parecia um pouco irritado – Eu a levo. Podemos ao menos tomar um banho juntos? Ou a bambina não pode?
- A bambina é italiana. Pode sim. Quero!
- As italianas são realmente quentes como dizem, então?
- Falando por mim, pode-se dizer que sim – falei, rindo das suas insinuações.
- Uau! Pelo jeito vou me dar bem – e mostrou um sorriso mais que safado.
- Acho que já estamos nos dando muito bem, não acha? – não resisti e dei-lhe um beijo bem molhado.
Levantamos e fomos direto para o chuveiro.
Pode-se dizer que foi o melhor banho da minha vida, pelo menos até aquele momento. Ansiava pelos próximos.
Quando terminamos de nos arrumar, saímos para pegar a estrada. Eram quase três horas da manhã. A estrada estava deserta. Ele estava visivelmente cansado. Tive vontade de convidá-lo para ficar e dormir em meu quarto, mas não teria como explicar a sua presença no café da manhã.
- Pronto! Chegamos. Vemos-nos amanhã? Quer dizer, hoje, durante o dia?
- Desculpe ter feito você dirigir a esta hora para me trazer. Estou me sentindo mal por isso.
- Não precisa sentir-se mal. Você tem razão. O seu avô não ia gostar muito desta situação. Eu estou bem. Passo aqui amanhã á tarde, ok? Vá dormir. Quero-a refeita para amanhã – e olhou-me insinuante.
- Alex!
- Não diga que não quer mais?
- Claro que quero. Muito mais...
Beijamos-nos mais uma vez e, com dificuldade, consegui deixá-lo partir.
Entrei em casa, na ponta dos pés para não fazer barulho. Tirei os sapatos de salto alto para poder subir as escadas. Fiquei surpresa por não ver Don Pippo a minha espera na sala. Será que ele tinha tanta confiança assim em Alex?
Fechei a porta de meu quarto e fui abrir a janela para respirar um pouco do ar noturno e relembrar os belos momentos que acabara de viver. Ao fazer isto, vi uma luz ao longe, vinda do prédio da vinícola. Fiquei curiosa e mantive-me a espreita para ver alguma movimentação por lá. Será que vovô cansara de esperar por mim em casa e fora dar uma volta até as adegas? Passaram-se alguns minutos e a luz apagou-se. Continuei na janela escondida na escuridão do quarto, um pouco atrás das cortinas, desconfiada de tudo aquilo. Foi quando vi Genaro esgueirando-se pela noite, muito suspeitamente, carregando duas sacolas, indo em direção ao dormitório dos funcionários que moravam na vinícola. O que estaria ele fazendo lá, àquela hora? O que teria dentro das sacolas? Muito estranho. Depois que ele sumiu de minha vista, vesti minha camisola e fui dormir, ainda intrigada com o que vira. Peguei logo no sono, desejando que a tarde chegasse logo para encontrar o meu amor de novo.

Mais uma vez, acordei muito tarde. Mas afinal, era fim de semana. Um fim de semana muito agitado. Será que ele tinha chegado bem ao hotel? Ele estava tão cansado quando saiu. Resolvi levantar-me logo, antes que alguém aparecesse no quarto.
Vovô estava na sala, tomando seu cálice de vinho.
- Bom dia, dona Giulia. Nem vou perguntar a que horas a senhorita chegou para não ser inconveniente. Desisti de esperá-la.
“Ele havia me esperado, então”, pensei.
- Tive uma ótima noite. Acabamos jantando e indo dançar depois. Não vimos o tempo passar.
- Imagino que não...
- Bem, vou comer alguma coisa e dar uma volta. O senhor já almoçou?
- Não. Estava esperando por você. Além do mais, a Agostina ainda não terminou de preparar.
- Então almoço com o senhor. Vou tomar um suco e ir até ao escritório dar uma olhada nuns papéis – disse isso e segui em direção á cozinha. Dei bom dia para Agostina, que me olhou com aquele seu ar maternal preocupado, balançando a cabeça , como se eu fosse um caso perdido.
- Não me diga que não vai almoçar.
- Vou até fazer um aperitivo antes do almoço, está bem? – realmente hoje eu estava com fome.
Peguei uma maçã, que estava mais a mão, dei um “ciao!” e segui para a rua. Estava curiosa com o que tinha acontecido durante a madrugada. Queria ver se descobria o que Genaro estava fazendo àquelas horas na vinícola.
Verifiquei o escritório, andei pelos pavilhões que guardavam os diversos estágios da produção de nosso vinho e as adegas. Contudo, não pude achar nada diferente. Não queria falar com vovô para não deixá-lo preocupado. Provavelmente não fosse nada. Talvez ele tivesse perdido o sono e resolvido beber uma taça de vinho direto das pipas.
Minha surpresa foi maior quando, ao voltar de minha visita, deparei-me com o tal Tomasino, dentro de seu carro, estacionado nos portões da propriedade, conversando com Genaro. Resolvi ir até lá e saber o que estava acontecendo. Achei a cena muito suspeita.
- Bom dia, signorina! – gritou Genaro ainda de longe, ao me ver em passos firmes, aproximando-me deles.
- O que este senhor deseja, Genaro?
Neste momento, o sujeito abriu a porta do automóvel e saiu para cumprimentar-me. A sua aparência era de arrepiar. Lembrava um daqueles capangas do cinema, tipo os de “O Poderoso Chefão”. Lançou-me um sorriso armado e frio e falou:
- Bom dia, senhorita Giulia. Parece que estamos nos encontrando com freqüência ultimamente.
- Acho que não o conheço, senhor...
- Tomasino, a seu dispor. Realmente, não fomos apresentados formalmente, mas creio que a senhorita lembra-se de ter me visto num certo hotel, ontem á noite. Não lembra?
Sua voz parecia vinda de alguma catacumba. Tudo nele era sinistro.
- Não. Não estou lembrada – menti, encarando–o e tentando manter a calma.
- Pois creio que ainda vamos nos ver várias outras vezes, o que para mim será um prazer.
- Não creio. Se o senhor é quem eu penso que é, gostaria que não aparecesse mais por aqui. Acredito que meu avô já lhe disse isso. Estou apenas reforçando o desejo dele. E você, Genaro, não tem nada que ficar conversando com este “senhor”. Deve apenas barrar a sua entrada em nossa vinícola.
Vi o rosto de Genaro empalidecer, enquanto olhava o tal Tomasino com olhos aterrorizados, para depois ficar cabisbaixo e dizer:
- Sim, signorina.
- Vejo que a senhorita é muito segura de si e autoritária. Mas as coisas mudam, senhorita. Nada é imutável. Às vezes podemos perder o controle da situação, ficando em condição muito frágil.
- Por acaso o senhor está me ameaçando?
Ele lançou outro sorriso enigmático através daqueles olhos cinzentos e gelados.
- Tenha um bom dia, Giulia – falando isto, deu-me as costas, entrou em seu carro e, após um sutil cumprimento de cabeça para Genaro, deu a partida e saiu de ré, até pegar a estrada novamente.
- Que homem asqueroso! Genaro, ele está proibido de entrar aqui. Entendeu?
- Mas, senhorita, ele pode ser perigoso.
Mais um que pensava no perigo que aquele homem representava, sem ele ter feito nada.
- Mais um motivo para não deixá-lo entrar. Capice??
- Sim, senhorita.
Eu estava furiosa com os dois. Minha desconfiança sobre Genaro só aumentou depois deste incidente. Voltei para casa, tentando acalmar-me. Sentia todas as fibras de meu corpo retesadas e tremulas. Eu não costumava perder a calma daquela maneira, mas aquele homem me deixara extremamente exasperada e, ao mesmo tempo, amedrontada.

- O que houve, Giulia? O que aconteceu lá no portão? Eu vi o carro “daquele” homem partindo e você praticamente gritando com o Genaro. O que ele queria?
- Nada, Don Pippo. Não se preocupe. Acho que não vamos mais ver aquele sujeito por aqui.
- Me conte o que aconteceu, Giulia. Por favor!
Relatei os fatos e o meu diálogo com o “pústula”. Apenas ocultei as minhas desconfianças para com o nosso funcionário.
- Você não devia ter falado com ele. Porque não me chamou? Eu já havia dito para não se aproximar dele.
- Eu não sou mais nenhuma criança. Além do mais, esta propriedade também é minha. Tenho obrigação de defendê-la. Jurei para minha avó que ficaria ao seu lado para isso. Apenas agi como proprietária, defendendo nossos interesses.
- Está bem, minha filha. Não precisa ficar assim. Sei que agiu com a melhor das intenções, mas não sabemos com quem estamos lidando. Todo o cuidado é pouco.
- Acho que o senhor está me escondendo algo. Porque este medo deste homem? Ele não é apenas um funcionário de multinacional? Está certo que ele tem um aspecto sombrio, mas só isso não é motivo para tanto receio. O que o senhor e o Alex estão escondendo de mim?
- Nada! Não estamos escondendo nada - estava visivelmente nervoso, com gotas de suor a brotarem da testa calva, sendo que o tempo não estava exatamente quente – Olhe, vamos almoçar. A Agostina avisou que já está tudo pronto. Não vamos mais falar deste assunto. Está bem?
- Está bem – fiquei preocupada com o estado em que ele ficou e resolvi não tocar mais naquilo, por enquanto. Pretendia ter uma conversa com Alex, mais tarde. Achava que ele sabia mais do que queria aparentar – Vamos ver o que a Agostina preparou de gostoso para hoje.
Abracei-o carinhosamente e seguimos rumo ao almoço.

Mais uma tarde que passava muito lentamente. Lenta demais para o meu gosto. Nada de Alex aparecer. Nem o seu número de celular eu tinha. Poderia ligar para o hotel em Arezzo e tentar falar com ele, mas não queria ser chata. Achava horrível aquelas mulheres que grudam no homem feito goma de mascar. Talvez estivesse com algum problema. E se tivesse acontecido alguma coisa, ontem á noite, quando voltava para o hotel?
Acabei ligando para o hotel e perguntando por ele na recepção. Qual não foi minha surpresa ao saber que ele tinha viajado para Roma. Apesar de não ter fechado a conta, dizendo que voltaria logo, fiquei magoada por ele não ter me avisado. Talvez eu não significasse nada para ele, afinal. Será que eu tinha me enganado tanto assim? Não era possível. A vontade de chorar tornou-se presente até a noite. Fui tomar um banho antes do jantar. Quando saí, já resolvida a esquecer aquilo tudo e ir dormir sem jantar, vovô me chamou:
- Gigi, o Alex ligou, mas você estava no banho.
- O quê? Ele liga exatamente na hora em que não posso atender? Porque o senhor não me chamou? Eu aflita sem notícias e ele liga só agora?O que ele está pensando?
- Se você se acalmar, vou transmitir o recado que ele deixou.
- Qual o recado?
- Que sente muito, mas teve de viajar com urgência para Roma, para resolver negócios da empresa. Espera retornar em três dias, no máximo.
- Como assim, resolver negócios num domingo? Ele acha que me engana? – aquela altura eu já estava quase histérica.
- Posso continuar? Acho que vai querer ouvir o final do recado. Ou não?
Percebi que estava sendo muito imatura comportando-me daquele jeito. Dei um longo suspiro e falei mais calma:
- Desculpe, vovô. Qual o final do recado?
- Ele mandou dizer vai tentar ligar de novo. Que está com saudades. Pediu para que eu cuidasse de você. Imagina! Ele me mandando cuidar de minha neta! O que ele está pensando? – falou sorrindo e dando uma piscadela de olho para mim – Gostou? Ou ainda vai continuar tendo um chilique?
- Ah! Vovô... Acho que estou ficando apaixonada.
- Isto é bom, mas vá com calma. Cuidado com este coraçãozinho.
Apesar de estar mais aliviada com as notícias, ainda me perguntava por que ele não ligara antes de partir? Porque tanta pressa assim? Por razões de trabalho? Achava aquilo muito estranho.
Acabei por fazer companhia para o meu avô durante o jantar, apesar de mal tocar na comida.
- Ainda está preocupada?
- Não. Só estou sem apetite – não queria retomar a discussão anterior e deixá-lo perturbado como antes.
Naquela noite, fui deitar cedo, sob os olhares perscrutadores de Don Pippo. O sono, porém, demorou a chegar. Por isso acabei perdendo a hora na manhã seguinte . Não houve tempo para minha caminhada habitual da manhã. Mal tive tempo para tomar um café. Tinha muito trabalho pela frente. Hoje seria o dia de rotular e encaixotar os vinhos e azeites engarrafados no sábado. Tinha de preparar as notas fiscais necessárias para despachar as caixas com vinhos e azeites para os nossos principais compradores, inclusive para a Calvine, onde Alex trabalhava, no dia seguinte. Enfim, ficaria ocupada o suficiente para não pensar nos últimos acontecimentos do final de semana.

Muitas emoções ainda a caminho... Aguardem a continuação... Amanhã tem mais!
Beijinhos!!

2 comentários:

  1. Nossa infelizmente é uma triste realidade q se arrasta por vários anos, lugares, setores, profissionais ou pessoais, resolver tudo na maldita violência qdo teremos paz? Pq o ser humano tão racional perde tempo com maldades? Q mal, o bem vai fazer nas mentes insanas desses cruéis? Só nós resta esperança!!!
    Bjkas

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  2. Vixe, ela não escapou dos efeitos danosos do vinho... Mas valeu a pena (hehehe)
    Ai que essa blusinha aberta me deixa eufórica, para dizer o mínimo!!!
    Mas esse Tomasino tem jeitão de mafioso, um homem asqueroso, eca...
    E esse Genaro tb... sei não... fazendo as coisas na surdina e de papinho com o Tomasino...
    Ai, que dó... Depois de uma noite tão deslumbrante, Alex teve que viajar... Imagino só a saudade que a Giulia deve estar sentindo, pois encontrar um rei grego-escocês desses não é para qualquer uma... invejinha...
    Beijinhos

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