terça-feira, 1 de setembro de 2009

A APOSTA - continuação

Assim, ele encaminhou-se diretamente para a mesa da assistente de produção e parou de pé ao seu lado, aguardando que ela o notasse. Depois de aguardar alguns segundos, recebeu o olhar indagador e sisudo de Samantha, que se manteve calada, como que esperando uma explicação para aquela presença junto à sua mesa.
- Posso sentar-me aqui?
Ela continuou olhando para ele com intensidade e, impassível, disse:
- Não.
Sem ligar para a resposta, ele puxou a cadeira vaga defronte a dela e sentou-se, encarando-a.
- Acho que você não me entendeu – repreendeu-o com olhar faiscante de desprezo – Eu disse NÃO.
- Eu entendi, mas estou aqui para me desculpar por minha grosseria inconsciente, hoje pela manhã...
- Desculpas aceitas – cortou ela – Agora, por favor, pode voltar para sua mesa e seu agradável grupinho de amigos.
- Vi que está lendo um bom livro. Eu o li há uns quatro anos. “The Wind-Up Bird Chronicle, do Haruki Murakami – ele tentou mudar o rumo da conversa, fazendo que não percebera a hostilidade por parte dela.
Ela resfriou ainda mais o olhar, como se isso fosse possível.
- Espero que não queira me contar o final do livro.
- Absolutamente. Não sou este tipo de pessoa.
- E que tipo de pessoa o senhor é, senhor Butler? Do tipo que dá cantadas no meio de restaurantes em mulheres sozinhas?
- E quem disse que estou dando uma cantada em você? – respondeu com um sorriso cínico – Acho um pouco de presunção de sua parte. Estou apenas tentando ser gentil e desculpar-me.
- A presunção e a falta de educação são suas. Já desculpou-se e tentou ser gentil. Agora, me deixe... Por favor.
Ele começava a ficar sem jeito, mas não queria desistir tão facilmente. Podia sentir os olhares atentos do trio que ficara em sua mesa.
- Por que esta animosidade? Estou apenas tentando fazer as pazes com você. Acho que começamos mal. Já que vamos trabalhar juntos por um bom tempo, por que não melhorar o clima entre nós?
- O “bom tempo” ao qual se refere é efêmero. Não vejo a necessidade de maior intimidade. Quando este trabalho acabar, acabou... – respondeu com olhar enfadado, para logo em seguida voltar à leitura de seu livro.
Ele estava impressionado e indignado com a resistência dela em ceder ou ser mais simpática.
- Bem, já que é assim... Desculpe ter-lhe feito perder estes minutos preciosos do seu tempo.
Butler levantou-se e a deixou a ler o seu livro. Ao virar as costas, não percebeu o discreto olhar preocupado de Samantha acompanhando-o por cima da capa do livro.
“Ainda vou me indispor com o Joseph por causa dele...”, pensou.
Voltando à sua mesa, encontrou os três novos amigos ansiosos por saberem como tinha sido o diálogo.
- Acho que vou topar o “desafio”. O que eu ganho com isso?
- Nós lhe pagamos um jantar onde você escolher.
- Se eu perder?
- Você paga um jantar para nós três.
Lindsay parecia animadíssima. Já pensava em combinar com os outros dois amigos a possibilidade de eles não comparecerem ao jantar da vitória, de quem quer que fosse, e deixá-la a sós com Gerry, pelo qual ela estava interessadíssima.
- Eu não costumo fazer isso, mas ela foi tão esnobe comigo que acho que merece uma lição.
Ainda deram algumas boas risadas até o final do almoço, enquanto Samantha permaneceu fiel a sua leitura, sem perceber que estava tornando-se alvo de um jogo.
.
Até o final do dia, Gerry e Sam tentaram evitar-se. Às vezes seus olhares se cruzavam e ele quase podia perceber algum interesse dela, mas eram apenas algumas frações de segundos e logo o brilho de seu olhar extinguia-se. Percebeu que as únicas pessoas com as quais ela conseguia relacionar-se com um sorriso eram Farrell e MacAlister.
Na sexta-feira, Gerry levou sua pug, Lolita, para acompanhá-lo ao Ultimamente tinha pouco tempo disponível para ficar com ela e, como naquele dia não tinha muitas cenas a rodar, decidiu que sairiam para passear nos intervalo do trabalho. Deixou-a aos cuidados de sua assistente. Porém, quando voltou, encontrou a mulher desesperada a procurar a cadelinha por todo o canto sem achá-la. Gerry saiu em sua busca. Quando já estava certo que ela fugira para a rua, viu Samantha, num canto do estúdio, abraçando e confortando Lolita, que estava alegre em seu colo, abanando entusiasmada o rabinho. Ficou surpreso ao vê-las, pois não conseguia imaginar Samantha gostando de animais. Aproximou-se silenciosamente delas e, depois de observá-las um pouco mais, disse:
- Vejo que Lolita arrumou uma nova amiga.
- Ela é sua? – perguntou Samantha meio sorrindo, pois a cadelinha começava a lamber seu rosto mais uma vez.
- Sim, é minha – respondeu, pensando que afinal, Samantha não devia ser tão ruim assim. Lolita não costumava enganar-se com suas amizades.
Imediatamente, ela entregou Lolita para ele, dando, instintivamente, um beijo na mascote antes.
- Então, você deveria cuidar melhor dela e não deixá-la por aí à solta. Eu a encontrei presa entre estes cavaletes – falou autoritariamente, enquanto ele segurava o animal entre as mãos, e saiu andando.
Ele praguejou baixo ao vê-la sair daquela maneira e virou-se para Lolita, acariciando-a, e perguntou:
- Qual é o segredo dela?Você descobriu?
Lolita o olhou com ar de satisfação e o lambeu no rosto também.
- Estou vendo que essa aí é páreo duro... – confessou à sua companheira fiel.

Na manhã seguinte, durante um intervalo para o lanche, Gerry procurava um lugar para sentar, quando viu Samantha destratando uma das costureiras que não aprontara algumas das roupas que tinham de ser usadas nas cenas seguintes. Imediatamente, ele partiu em defesa da mulher, que era uma senhora de mais idade e com aspecto humilde.
- Por que você a está tratando desta maneira? O que ela fez? – perguntou indignado.
- Não se meta, senhor Butler, por favor! – repeliu-o com vigor – Pode ir agora e que isto não se repita mais – ordenou à mulher, que saiu chorando e pedindo desculpas.
- Por que você tinha de falar com ela daquele jeito. Olhe o estado em que a pobre ficou.
- A pobre senhora que você está defendendo é alcoólatra e não acabou seu serviço porque tomou “todas” durante seu expediente – exasperou-se ela – Peço que não se intrometa mais no meu trabalho.
Ele não podia admitir que ela lhe falasse daquela maneira.
- Você a humilhou – disse ele – Não podia adverti-la de forma menos agressiva?
- Que tal se fizer apenas o seu trabalho, enquanto eu cuido do meu?
- Por isso você tem esta tremenda fama de antipática. É tão difícil ser mais meiga e menos hostil com as pessoas com quem trabalha? Qual é o seu problema?
Ele tentava manter um tom de voz mais baixo para não chamar a atenção. Por sorte estavam todos distraídos com o lanche e distantes dos dois.
- O meu problema? – apesar da indignação com o protesto de Gerry, também tentava não chamar a atenção, falando sem gritar, como era sua vontade – Vou lhe dizer qual é o meu problema. É ter de trabalhar com pessoas como você que acham que tudo pode ser levado na “brincadeira”, prepotente e irresponsável.
Ao ouvir a última palavra dela, enfureceu-se e a pegou pelo braço, com força, fazendo-a gemer de dor.
- Você pode me chamar do que quiser, mas jamais de irresponsável.
Ela se assustou com a explosão de raiva dele e percebeu que exagerara no linguajar.
- Me solte, por favor... – disse, tentando desvencilhar-se daquela garra de aço.
- Só depois que você voltar atrás no que disse.
Sentiu que se não se desculpasse perderia a circulação do braço em breve.
- Talvez eu tenha exagerado. Retiro o termo irresponsável, pois não o conheço o suficiente para afirmar isto... mas, prepotente e inconveniente, não – afirmou olhando-o desafiadoramente.
Ele afrouxou um pouco a força do aperto em torno de seu braço e ficou a fitá-la com seus olhos verdes faiscantes de cólera.
- Você deve ter sofrido muito para se tornar uma pessoa tão amarga e hostil. Eu gostaria de poder ajudá-la, mas parece que você construiu uma barreira tão sólida em torno de si mesma, que a torna inacessível. Talvez não valha a pena tanto esforço...
Subitamente ele sentia-se extremamente desanimado, o que ela pode perceber pelo modo como seus olhos escureceram o brilho de antes. Paralisada e chocada com as palavras dele, viu-o soltá-la, virar-se e, simplesmente ir embora. Gerry nem percebeu que os olhos de Samantha tornaram-se turvos, cheios de lágrimas acres, nascentes de uma profunda dor em seu coração e sua alma. Foi quando a voz de Farrell chegou até seus ouvidos, chamando-a insistentemente.
- Sam, Sam!
Rapidamente ela secou os olhos, tentou esboçar um sorriso e respondeu:
- Estou aqui, Joseph!
- O que está fazendo aqui. Estava a sua procura... – ele parou de falar, pois percebeu que alguma coisa não estava bem. Notou os olhos vermelhos de sua assistente – O que houve, Sam? Algum problema?
- Não. Imagina... Está tudo bem. É que tive de passar um “sermão” na senhora Smith, a costureira. Ela estava bebendo em serviço.
- De novo? Quantas vezes você já a repreendeu? Melhor é despedi-la.
- Não, Joseph. A coitada tem um filho deficiente que depende só dela. Se ela perder este emprego, vai ficar na maior pobreza. Com a sua idade vai ser difícil de conseguir outro trabalho.
- Você e suas caridades, Sam. Depois os outros ainda falam que você não tem coração. Só eu sei.
- Deixe disso, Joseph. Melhor eu continuar passando por durona para que me respeitem...
- E não se aproximem muito, não é?
- É... – disse ela, com um meio sorriso, e abaixando a cabeça tristonhamente.
Joseph pensou em tentar saber mais sobre o motivo do evidente choro de Sam, mas não havia muito tempo para isso. Talvez mais tarde... Numa outra hora.

Finalmente a semana chegou ao fim. O domingo serviu para que todos descansassem para a viagem que teriam pela frente logo no dia seguinte. A produção havia fretado um avião que levaria a equipe principal para Breckenridge, no Colorado, onde teriam as locações junto às montanhas nevadas.
Sempre ao lado de Farrell, Samantha evitou o olhar de Gerry quando se encontraram no aeroporto. O produtor notou o mal estar entre ambos e não gostou. Daria um jeito de informar-se sobre como andavam as relações entre os dois. Não parecia ser das melhores.
Gerry acabou por sentar-se ao lado de Farrell durante o vôo. Samantha sentou-se sozinha numa poltrona cerca de seis fileiras à frente. No vôo também estavam Steve, Lee e Lindsay. Esta última, ao passar por Gerry, deu um sorriso fulgurante e sussurrou-lhe:
- Não esqueça da nossa aposta – e saiu sem dar chance a Gerry de dizer que já nem lembrava mais daquela bobagem e que já estava arrependido de ter entrado em tal jogo. Esclareceria isto mais tarde com o trio.
Assim que o avião partiu, Farrell virou para Gerry e disparou uma pergunta:
- Ela aprontou alguma com você?
- Quem? – fez-se de desentendido. Não queria prejudicá-la, apesar de tudo.
- Você sabe de quem estou falando. Da Sam – respondeu Farrell impaciente.
- Não, claro que não! Por que pergunta?
- Notei que vocês estão evitando até olhar-se. Falar então... Nada. O que aconteceu?
Depois de alguns instantes, pensativo, procurando as palavras certas para falar, de maneira a não embaraçar Samantha, Gerry finalmente respondeu:
- Só queria entender por que ela se comporta tão fria e distante de todos, com rispidez. Parece não ter sentimentos. Sinto que é só uma barreira, mas não entendo o por quê.
- Eu diria que ela está um pouco pior, principalmente depois que o conheceu. A couraça fechou-se um pouco mais depois disso. Você deu em cima dela?
- Não! Como assim?
- Não?
- Bem, na verdade, não posso negar que ela desperta sentimentos controversos em mim, mas... É complicado – falou sentindo-se confuso e inibido por estar discutindo um assunto íntimo com alguém que conhecia há tão pouco tempo. Ficou olhando para a janela do avião, procurando evitar pensar sobre o assunto.
Farrell resolveu respeitá-lo e parar com aquela conversa, apesar de estar tentado a contar algumas coisas de Sam que poderiam ajudar Gerry a entender melhor as atitudes dela. Não gostava que pensassem ou falassem mal de sua assistente. De certa forma, sentia-se responsável por ela.

Afinal, chegaram à Breckenridge, depois de duas horas de vôo e mais uma hora e 30 minutos de ônibus. Apesar do cansaço, devido principalmente pela espera nos aeroportos, todos concordaram que a escolha do local para as filmagens tinha sido perfeito. O lugar era belíssimo.
Chegaram a um dos hotéis escolhidos para hospedar os atores principais, diretor, produtor e assistentes. Foram feitas as fichas e distribuídas as chaves de cada um.
Samantha estava exausta e doida por um banho. Notou com surpresa que tinham lhe dado um quarto com duas camas, sendo que reservara um quarto para uma pessoa, com o intuito claro de ficar sozinha. Nada mais a fazer do que aproveitar a sorte. Atirou-se sobre uma das camas e fechou os olhos, aproveitando a sensação de bem estar oferecida pela maciez do edredom de penas de ganso sobre um colchão de molas. Depois de um minuto de relaxamento, foi para o desejado banho.
A água quente corria por seu corpo causando-lhe um amolecimento gostoso. Andava muito estressada ultimamente. Sua mania de tomar conta de tudo, sem dividir encargos com o restante da equipe era a responsável por isso. Talvez devesse seguir o conselho de Joseph para procurar ajuda neste quesito... e em alguns outros. Às vezes se perguntava até quando conseguiria manter este ritmo, afogando-se no trabalho, para esquecer sua vida pessoal e seu passado, evitando qualquer forma de sentimento por alguém... Gerry Butler... A imagem dele invadiu seu pensamento instantaneamente. Naquela última semana se pegava pensando nele com mais freqüência que o desejado. A sua figura a irritava mais do que qualquer outra pessoa. Não via a hora de acabar com aquela produção e ficar livre da presença dele. Arrepiou-se quando abriu os olhos e viu-se no espelho do banheiro enquanto estava sob o chuveiro, com aqueles pensamentos em mente. Ela estava sorrindo bobamente. Devia estar ficando louca. Era o estresse. Como podia pensar mal de alguém e sorrir ao mesmo tempo?
Desligou a água, enrolou-se na grande e felpuda toalha branca e olhou mais uma vez no espelho. Os cabelos castanhos molhados caindo desalinhados sobre o rosto corado em decorrência do calor do banho. Lembrou-se de como era quando ainda tinha ilusões a respeito dos homens. Sacudiu a cabeça, tentando afastar aquelas idéias estúpidas e foi para o quarto, onde pensou ter visto um roupão sobre a cama. Lá estava ele. Tirou a toalha, jogando-a ao chão e abriu a embalagem que continha um grande roupão atoalhado, fofo e branco como as toalhas. Vestiu-o e aconchegou-se dentro dele, soltando um suspiro longo e relaxado.
- Acho que vou aproveitar e tomar um banho também. Pelo visto está bastante relaxante... – soou a voz grave e rouca, como um alarme aos ouvidos de Samantha, vinda da ante-sala do apartamento onde havia um sofá de dois lugares, defronte ao quarto.
Ela soltou um grito, assustada com aquela presença inconveniente. Cobriu-se com as mãos, retraindo-se como se estivesse nua. Mais alarmada e vexada ficou quando se deu conta de que acabara de ficar totalmente sem roupas diante de Gerard Butler.


Continua amanhã...

Um comentário:

  1. Amei muito essa fic...
    espero que vc poste logo mais...
    se não vou morrer de curiosidade!!!
    ele é lindo mesmo
    ai... chama o bombeiro ai que esse homem me faz delirar...
    bjos!!

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