quinta-feira, 2 de julho de 2009

Um Amor no Deserto






Capítulo III


O dia amanheceu e logo o sol já fustigava sem dó as areias que cercavam o acampamento. As mulheres já buscavam água num oásis perto dali e alguns homens alimentavam os animais ou trabalhavam como ferreiros, fazendo artefatos para o trabalho doméstico ou para venda nas cidades próximas.
Amy acordou sentindo muito calor. Sentiu que as forças haviam voltado ao seu corpo. Estava muito animada com a perspectiva de voltar à corrida. Olhou a sua volta, apoiada em seus cotovelos. Resolveu levantar-se, quando viu Daren entrar em sua tenda.
- Bom dia, nobre Daren.
- Vejo que acordou alegre esta manhã.
- Muito – dizendo isto, levantou-se rapidamente do chão.
Quando se colocava de pé, sentiu uma tontura e, não fosse o abraço firme e instantâneo de Daren, teria caído ao solo.
- Você tem que ir com calma. Tem que levantar-se devagar, pois ainda está em recuperação – comentou ele.
- Obrigada – disse, ainda agarrada a ele e podendo sentir a musculatura rija e forte de seus braços, através das roupas.
- Posso soltá-la agora?
- Acho que sim – sorriu – Já me sinto forte o suficiente para ir até o posto avançado do Paris-Dakar, que não deve estar longe daqui.
- Você ainda não está em estado de sair novamente para o deserto. Espere pela equipe de resgate aqui. Pedi a um dos nossos levar uma mensagem até a cidade mais próxima, avisando que você está aqui.
- Mas o posto avançado não deve estar longe. Eu posso perfeitamente ir a cavalo até lá e voltar o mais breve possível para a prova. Não posso perder muito tempo. Por favor, você pode me ajudar?
- O posto que você fala está a mais de 100 quilômetros daqui. Um cavalo não aguentaria. Estamos com risco de tempestades de areia. Não posso arriscar nossas vidas por um desejo bobo.
- Não é um desejo bobo. Tenho um compromisso com o jornal para o qual trabalho. Não estou na corrida para competir. Estou a trabalho.
- Mesmo assim. É perigoso e não posso permitir que você saia daqui nas condições em que está.
- Eu estou me sentindo muito bem – falou acintosamente.
- Mas ontem você estava praticamente morta, não fosse eu encontrá-la – sua voz já apresentava irritação.
- Eu serei eternamente grata a você por ter salvo a minha vida, mas agora eu preciso voltar ao meu trabalho.
- Não!
Ela estremeceu diante da negativa veemente de Daren. Estava inconformada e percebeu que não conseguiria nenhuma ajuda com ele. Se pudesse falar o idioma deles, talvez conseguisse um condução guiada por uma pequena soma de dinheiro.
- É melhor você voltar para sua cama e continuar a beber o soro.
Ela não respondeu nada. Apenas ficou a encará-lo com olhar arrogante. Ele apenas balançou a cabeça, convencido de que estava diante de uma cabeça dura. Teria de vigiá-la, pois sentia que ela era capaz de fazer alguma loucura. Depois daquele embate silencioso entre duas vontades férreas, Daren deu as costas à Amy, que começou a procurar onde ficavam os cavalos. Só via camelos. Procurou por sua mochila e não a achou. Se ao menos tivesse sua bússola ficaria mais fácil. Será que ele a deixara junto com a moto quando a resgatou? Provavelmente. Não tinha importância. Seguiria através da posição do sol. Enquanto tentava arquitetar um plano de fuga, uma das mulheres entrou com o que seria o seu desjejum. Tentou comunicar-se com ela para saber exatamente onde estava. Pediu algo onde pudesse escrever e um lápis. Fez um mapa grosseiro da região da fronteira, do que lembrava ter estudado para a viagem, e o nome de algumas das cidades vizinhas. Mostrou-o à mulher, que identificou que estavam próximos a uma cidade chamada In Talak, que ficava a cerca de 120 quilômetros do posto do Paris-Dakar, próximo à Akabar, na fronteira entre Mali e Niger, ao sul. Ela havia se desviado um pouco mais que o previsto de sua rota, pois encontrava-se mais ao norte do que imaginava. Mas agora que sabia sua localização, com um curto trajeto a percorrer, não teria problemas. Levaria um bom estoque de água e algum alimento. Em pouco menos de três horas, com uma boa montaria, poderia chegar ao seu destino. Quando perguntou como conseguir um cavalo, a mulher fez cara de espanto ao entender a mímica de Amy. Balançou a cabeça negativamente e saiu correndo. Esperava que ela não batesse com a língua nos dentes e contasse tudo à Daren. Estava decidida. Pegaria um cavalo e correria até Akabar.
Improvisou uma pequena mochila com um dos panos que lhe servira de lençol e lá colocou o seu café-da-manhã. Com o pano que restou, teve o cuidado de fazer um turbante, para que ninguém a reconhecesse Para sua sorte, alguém esquecera na sua tenda uma espécie de bolsa de couro usada para transportar água, cheia de água. Colocou tudo sob a túnica e, furtivamente, saiu da tenda à procura do cercado onde deviam amarrar os cavalos. Logo achou o que procurava. Era um belo puro-sangue castanho, de aparência descansada, pronto para enfrentar algumas horas de calor. Agradeceu à sua mãe que sempre insistiu em que ela frequentasse aulas de equitação. Nunca fora das melhores alunas, mas seria suficiente para que ela montasse razoavelmente bem naquela situação. Com cuidado, olhando para todos os lados, colocou seus mantimentos sobre ele, desamarrou o animal, e montou-o rapidamente. No início, ele estranhou seu cavaleiro e tentou empinar, mas Amy foi mais eficaz e conseguiu domá-lo. Assim, tendo o cuidado de verificar a posição do sol, seguiu para o sul, na provável direção de Akabar. Entretanto, o relinchar alto do equino despertou a atenção de um dos habitantes. Daren. Quando ele viu Amy partir rumo ao deserto, imediatamente correu na direção de seu camelo e iniciou a perseguição a ela. Seu último pensamento foi: “Ela é maluca!”.
Quando ela o viu, riu para si mesma, pensando: “Que idiota. Pensar que vai me alcançar naquele camelo pangaré. Coitado!”
Ela tivera sorte e pegara o animal mais rápido do povoado. Infelizmente, Amy esqueceu-se de um detalhe. Os cavalos no deserto são usados apenas para lazer e corridas de curta distância, em competições. Os camelos é que são moldados para grandes percursos, pois resistem mais ao calor. Assim, depois de alguns quilômetros, seu puro-sangue começou a cansar. Foi quando Daren conseguiu alcançá-la. Ele passou a frente dela, forçando-a a parar.
- Eu vou denunciá-lo por seqüestro! – gritou ela ensandecida.
- E eu a você por roubo. Você é louca? Isto é suicídio – replicou ele, desmontando, pegando as rédeas das mãos dela e puxando-a para baixo.
Ela acabou por cair sobre ele e, com as mãos cerradas batia contra o peito dele, furiosa por estar sendo impedida de realizar seu brilhante plano.
- Me solte, seu bárbaro prepotente – gritava Amy, raivosa por estar sendo imobilizada junto ao corpo dele, debatendo-se inutilmente.
- Você deve estar querendo dizer berbere – disse ele, rindo e caçoando dela, o que a deixou mais indignada.
A estas alturas, a parte do turbante que cobria o rosto de Daren caiu, deixando Amy ver o rosto dele em sua totalidade. Ele tinha a pele bronzeada pelo sol, traços másculos, com uma barba curta, com bigode arredondado, que lhe dava um ar de herói épico. Após breves segundos de admiração, ela notou que a expressão dele endureceu. Ele estava a olhar para alguma coisa atrás dela. Imediatamente, ele levantou-se e a jogou sobre seus ombros, levando-a até o camelo, que se deitou no chão a um comando de voz. Quando Amy pensava em começar a debater-se e a reclamar da violência dele, viu uma grande coluna de areia movendo-se na direção deles.
- Feche a boca e os olhos – foram as últimas ordens dele para Amy, que o obedeceu estarrecida diante da tempestade que se aproximava.
Ainda pode vê-lo cobrir os olhos do camelo e colocar o véu sobre a face. Abriu o manto de suas vestes, colocando Amy junto a seu peito, fechando o tecido rústico sobre o rosto dela. Ficaram assim abraçados durante uns 10 minutos, atirados ao chão, protegidos parcialmente pelo corpanzil da montaria de Daren. Sentiam o vento forte açoitando-os e a areia penetrando as tramas do tecido de suas roupas. Amy podia ouvir o ritmo acelerado do coração de Daren. Não fosse pelo animal que os protegera, teriam sido levados e enterrados vivos.
Quando sentiu que não corriam mais perigo, Daren afrouxou o seu abraço sobre Amy e perguntou, enquanto buscava ver o seu rosto:
- Você está bem?
- Sim. Acho que sim.
Com algum esforço, ele conseguiu levantar-se, lutando contra a areia acumulada sobre suas pernas e ajudando Amy a erguer-se.
- E agora? Acredita em mim?
Ela ainda tentava tirar o pó denso que se depositara sobre seu rosto e suas roupas. Seu cavalo desaparecera, bem como sua mochila improvisada e sua água.
- Bem, agora que a tempestade passou, posso prosseguir. Muito obrigada por sua ajuda.
Ele não conseguia acreditar no que estava ouvindo. Ela era o cúmulo da teimosia em pessoa.
- Não é possível que você ainda queira enfrentar esta região sozinha. Não notou que o seu cavalo se foi? O único caminho que podemos fazer é o de volta para onde estávamos, dando-nos por contentes de não ter acontecido coisa pior.
- Olhe, nós estamos perto do seu acampamento. Vai ser fácil você voltar para lá a pé. Empreste-me o camelo. Posso pagar muito bem por ele. Prometo que mando o dinheiro assim que chegar ao posto de checagem em Akabar.
Ela resistia em dar-se por vencida.
- Você está louca se pensa que vou lhe dar o meu camelo para que leve adiante esta sua ideia absurda de seguir sozinha por este deserto.
- Está bem. Eu posso ser louca, mas não tanto – lançou-lhe um olhar sedutor e continuou – Que tal você ser o meu guia?
- Não! – gritou mais uma vez, extremamente irritado com a teimosia de Amy.
- Então eu vou a pé sozinha. Você vai ser responsável pela minha morte. Mas se eu conseguir chegar até a civilização, pode ter certeza que vou processá-lo por manter-me presa, contra a minha vontade, para depois me abandonar só e desamparada neste deserto.
Com essas palavras tentava sensibilizá-lo. Achava que ele não teria coragem de deixá-la ali, sozinha.
- Definitivamente, você não regula bem da cabeça – disse balançando a cabeça – Estou voltando agora para a minha tenda. Se quiser vir comigo, ótimo! Caso contrário, tenha um bom dia.
Ela não acreditava que ele a estava deixando daquele jeito. Ficou observando-o incrédula, enquanto ele calmamente montava seu camelo e, depois de um último olhar indagador, fez o animal levantar-se sem dificuldades e partir dali.
Não demorou nem dois minutos, ela começou a correr atrás de Daren, gritando seu nome. Quando sua voz o alcançou, ele abriu um sorriso de vitória e, ao mesmo tempo de alívio. Afinal, ela não era tão doida assim. Imediatamente, ele estacionou seu camelo e ficou esperando que ela se aproximasse, sem virar-se para olhá-la.
- Está bem! Está satisfeito? Eu me rendo! – disse quase sem fôlego - Mas assim que chegarmos...
- Quando chegarmos vamos ter uma outra conversa – disse irritado, do alto de sua sela.
- Quem você pensa que é para me tratar deste jeito?
- Alguém que conhece a região e sabe que alguém como você não vai sobreviver por muito tempo, se continuar não respeitando os perigos que existem aqui. Pare de se comportar feito uma criança mimada ou vou ter de lhe dar umas palmadas.
Esta última frase dele a fez corar, num misto de raiva e vergonha. Nem conseguiu responder, pois lhe faltaram as palavras, tal sua indignação pela forma como ele a estava tratando.
Como ela continuasse parada no meio do nada, com expressão indignada, procurando por uma resposta desaforada, ele falou:
- Se quiser seguir comigo, vamos logo. Não tenho todo o tempo do mundo.
- Grandes compromissos você deve ter por lá, tratando de camelos ou jogando charme para aquelas coitadas que passam o dia indo e vindo do oásis para buscar água.
Ele não pode deixar de dar uma gargalhada diante daquele comentário infantil.
- Vá rindo, vá! Aliás, pode ir andando. Eu me recuso a subir neste monstrengo com você. Posso perfeitamente seguir a pé atrás de vocês.
-Você é quem sabe...
Logo em seguida, com um estalar de língua, Daren pôs seu camelo a movimentar-se lentamente.
Em silêncio, Amy começou a segui-lo. Ela sabia que ele não estava totalmente errado. Para falar a verdade, pensando bem, ele tinha toda a razão. Ela passara dos limites esta vez, pondo em risco a vida deles. Mas ela não diria nada. Não estava acostumada a ceder em suas vontades. Daria um outro jeito quando chegassem ao seu destino.
Eram poucos quilômetros que os separavam do acampamento tuaregue, mas o sol do meio dia e a falta de água, pois Amy recusava a água oferecida por Daren, começou a provocar seus efeitos. Em determinado trecho, Amy caiu e viu ele afastando-se. Acabou por chamar seu nome, pensando se ele seria capaz de ouvi-la e deixá-la para trás sem nem ao menos olhá-la.
No segundo chamado, ele voltou-se para o lugar onde ela estava caída, e depois de um pequeno instante de aparente dúvida, começou a caminhar na sua direção. Pensou se ela não estaria simulando um desmaio para chamar sua atenção?
Ao chegar ao seu lado, desmontou e foi verificar o estado de Amy. Verificou que ela já apresentava novamente sinais de uma desidratação leve. Pegou seu cantil e deu-lhe de beber.
- Quando a senhorita vai entender que não foi feita para este clima? – perguntou enquanto a ajudava a sentar-se.
- Quando o senhor parar de querer bancar o meu pai – falou com voz fraca.
- Talvez o seu pai não tenha lhe dado educação suficiente.
Alguns segundos se passaram antes que ela falasse algo.
- Talvez ele não tenha tido tempo para isso, pois está morto – a voz agora, além de fraca, dava sinais de grande tristeza, o que comoveu Daren.
Ficaram em silêncio depois disso. Tão logo ela terminou de beber mais um gole, ele a ergueu no colo e colocou-a sobre a sela entre as duas corcovas, sentada à sua frente, segurando-a firmemente pela cintura com uma das mãos enquanto com a outra puxava os arreios. Ela sentia-se tão fraca que não conseguiu contrapor-se a ele. Partiram de volta ao acampamento tuaregue. Daren sorriu ao sentir que Amy finalmente descansava a cabeça sobre seu peito, acabando por acomodar-se junto ao seu corpo. Esperava que ela adquirisse um pouco de juízo depois dos últimos acontecimentos.




Esta foto mostra o que seria uma tempestade de areia no deserto. Dá para ter uma ideia do estrago que ela pode fazer, não?


Este capítulo foi maior, não, Carel? Gostou?
Não sei se conseguirei postar amanhã, pois vou viajar e não sei se terei acesso à internet no lugar para onde vou...Voces sabem como é o deserto, não?...rsrsrs
Assim, não fiquem tristinhas se eu só voltar a postar a continuação domingo à noite. Vou fazer o possível para voltar o mais breve possível. Beijos a todas!!

4 comentários:

  1. Rô, estou cada vez mais curiosa com os próximos capítulos!
    E realmente, me senti na tempestade, antes mesmo de ver a foto.
    Vc é demais!
    Bjim♥

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  2. Tá muito hilário a estória dos dois me fez lembrar fotinhos do nosso amado no filme Sahara, do filme Ilha da Imaginação como Alex Rover...rss!
    Menina q tempestade da areia, me impressionei com a foto, quem dera fosse uma tempestade de Gerrys...já pensou, faria como a Rose do Titanic abriria os braços fechava os olhos e deixava rolar...rss!
    Bjkas

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  3. Primeiro quero dizer que achei linda a foto do Oásis que vc adicionou e fiquei imaginando como deve ser mais lindo ainda de pertinho, no meio ali de tanta coisa seca, encontrar algo assim deve ser de deixar os olhos marejados de emoção...
    Ai, meu Cristinho, tombalear e se apoiar nos brações do Daren é tudo de bom, bendita tontura que veio na hora exata!!!
    Hummm... amiga, agora vc me desmontou de vez... tirou o turbante e deixou transparecer a barbinha!!! Socorro!!! Estou em estado além da fervura!!!
    Nossa, essas tempestades de areias são mesmo uma grande ameaça lá no deserto... mas foi óóóóóóóóóóótima para a Amy... imagina, ficar agarradíssima naquele chester ostentoso por dez minutos... já nem sai mais como estou depois de ler isso...
    Vixe, mas cabeça dura é pouca para a Amy, tá mais pra mula empacada mesmo... me diga, pra que essa pressa toda... eu lá, no lugar dela, garanto que não teria pressa alguma em deixar o acampamento do Daren, ao contrário, estaria tão fraquinha que precisaria sempre me apoiar naqueles brações fortes e no seu chester suculento...
    A foto da tempestade de areia é de dar pânico, a gente nem imagina que seja tão cruel assim, com certeza os estragos são incomensuráveis. Somos abençoados por não termos tais fenômenos em nossa terra.
    Essa história está pra lá de empolgante, Rô!!!
    Beijinhos

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  4. Que guria teimosa!
    Adorei a forma como ele agiu! Isso é que é homem! Adoro!

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