Capítulo II
Ele acabara de cumprir o seu prometido. O último desejo de alguém que tinha dedicado sua vida ao trabalho e à família. Finalmente estava unido aos elementos da natureza, no lugar que tanto amava. Montou seu camelo e seguiu na direção das tendas de seus primos que o abrigavam desde sua chegada a Mali. Foi quando viu alguma coisa caída sobre as areias, ao longe. Curioso, resolveu investigar. Ao chegar mais perto viu a silhueta de uma pessoa. Acelerou o cavalgar. Logo pode identificar o corpo de uma mulher, vestida apenas com uma bermuda curta, uma camiseta de algodão, com um boné vermelho, que foi o que chamara sua atenção, sobre o rosto. Desceu de sua montaria rapidamente e foi verificar se estava viva. Devia estar a algumas horas ali, sob o sol. Um exame rápido mostrou que ainda estava viva, apesar de muito desidratada. Pegou um cantil de água que trazia junto a si e, começou a molhar-lhe os lábios com cuidado, colocando-a junto a si. Passou a gotejar algumas gotas do líquido precioso dentro de sua boca. Ela ainda não reagia. Talvez precisasse hidratação intravenosa, mas isto seria impossível naquela região. O hospital mais próximo ficava a mais de 100 quilômetros dali. De repente, ouviu um gemido tímido. Logo um par de olhos azuis embaçados o olhava sem entender o que estava acontecendo.
- Você pode me ouvir? – falou em inglês perfeito.
Ela não tinha forças para responder.
- Você fala inglês? – perguntou novamente.
Ela assentiu com um movimento leve da cabeça.
- Então tente tomar um pouco de água... Aos poucos, para não engasgar...
A voz grave e ao mesmo tempo suave tinham um efeito tranquilizador sobre ela. Amy tentava seguir o conselho daquele estranho, do qual só podia ver os olhos. Não conseguia raciocinar muito bem. Estava com muito sono...
Ela perdera a consciência mais uma vez. Ele precisava levá-la para a aldeia a poucos quilômetros dali. Levantou-a nos braços, sem muito esforço e colocou-a atravessada sobre sela, de bruços. Assegurou-se de que ela não cairia e partiu. Faltava pouco para o sol se pôr.
Chegando, foi auxiliado por algumas mulheres da tribo. Ele explicou o que acontecera e determinou o que deveria ser feito. Ela foi levada para uma das tendas para ser lavada e hidratada oralmente. Duas horas depois, foi ver como estava sua resgatada. Encontrou-a deitada, vestindo uma espécie de túnica ampla, de cor branca, típica das tuaregues, com os cabelos curtos, louros e desgrenhados, a pele ligeiramente avermelhada e de olhos fechados. Sentou-se ao seu lado, no chão da tenda, sobre o modesto tapete feito à mão. Ficou observando-a, analisando seus traços delicados e imaginando o que ela estaria fazendo naquele lugar onde viviam os “abandonados por Deus”, como os próprios tuaregues se autodenominavam. Não resistiu e passou a mão suavemente pela curva de seu maxilar, num carinho que a fez abrir os olhos lentamente. Eles agora já tinham um brilho normal e o olhavam indiscretos. Ele afastou sua mão imediatamente.
- Onde eu estou? Que lugar é esse?
- Você está num acampamento tuaregue na fronteira de Mali com Niger. Eu a encontrei quase morta a alguns quilômetros daqui.
- Tuaregue? Você é um tuaregue? Como fala a minha língua?
- Esta é uma longa história, que poderei contar-lhe em outra hora – falando isso, pegou uma caneca com água que estava numa mesa baixa, próxima a eles, e ofereceu – Beba isto. Você tem de beber pequenas quantidades por mais algumas horas, até conseguir hidratar-se completamente. Você devia ter sido levada para um hospital, mas tive medo que não resistisse à viagem. Vejo que tem um organismo resistente.
- Argh! Esta água tem sal! – exclamou fazendo uma careta feia – O que tem aqui?
- É uma espécie de soro reidratante oral. É apenas água com um pouco de sal e açúcar para hidratar mais rapidamente.
- Como você sabe isso?
- Sabedoria tuaregue. Beba! – ordenou ele com um brilho nos olhos. Amy imaginou que ele estava sorrindo.
- Você nunca tira este turbante azul?
- Geralmente, apenas para dormir. É uma tradição entre nós. Afasta os maus espíritos.
- Nunca ouvi falar que houvesse tuaregues de olhos verdes.
- Acho que sou uma espécie de mutante.
Ela gargalhou diante do comentário sarcástico dele.
- Nem imaginei que um morador do deserto tivesse tão bom humor.
- Os moradores do deserto têm muitos outros segredos que você desconhece.
- Sério? Será que poderei desvendá-los?
Mais uma vez seus olhos iluminaram-se diante da pergunta maliciosa dela.
- Beba a sua água salgada. Volto mais tarde para vê-la – ordenou ríspidamente.
Após este comando, levantou-se, pronto para retirar-se da tenda.
- Posso ao menos saber o seu nome?
- Só se você disser o seu.
- O meu é Amy. Amy McGarvey.
- Pode me chamar de Daren.
Depois de dizer seu nome, virou-se e saiu do local, deixando Amy de boca entreaberta, querendo continuar o diálogo e saber mais sobre aquele seu estranho salvador. Ele era alto, de andar elegante e sua pele parecia alva, apesar de estar bronzeada. Imaginava como seria o seu rosto, enquanto fazia uma nova cara de nojo ao beber mais um gole daquela água salobra. Prefiria não pensar muito a respeito de onde ela teria saído e que mãos a teriam preparado.
Tinha que sair dali. Talvez pudesse pegar um cavalo emprestado e ir até o posto avançado do rally. Não devia estar muito longe, já que estava na fronteira. Pediria a Daren para ajudá-la. Ele talvez fosse o único que falava o seu idioma. Ainda sentia-se fraca, mas tinha certeza que mais um dia seria o suficiente para poder encontrar a equipe organizadora, recuperar sua moto e retomar a corrida.
Daren não voltou naquela noite. Com algum esforço e lutando contra uma tontura, ela conseguiu levantar-se de seu leito no chão, caminhar até a entrada de seu abrigo e observar o acampamento à sua volta. Podia ver as outras tendas, semelhantes à dela. Algumas cabras estavam reunidas numa espécie de cercado. As mulheres estavam junto à fogueira e entoavam cantos na língua tamacheque ou num dos dialetos tuaregues, enquanto os homens batiam palmas, dançavam e sorriam. Tudo era muito simples. Daren não parecia estar entre aquelas pessoas. Ele não parecia pertencer àquela comunidade. Tinha um porte altivo, falava como se estivesse acostumado a dar ordens. Talvez ele fosse o chefe deles. Já tinha ouvido falar que os tuaregues dividiam-se em várias castas sociais e que a mais nobre, que acumulava as maiores riquezas, era a dos guerreiros. Eles eram chamados de “Senhores do Deserto” antigamente. Eram eles que controlavam as rotas das caravanas no deserto e lutavam com grande agilidade sobre seus camelos. Talvez Daren fosse um descendente deles.
Enquanto observava a reunião noturna, uma das mulheres, muito sorridente e falante, veio ao seu encontro, trazendo o que deveria ser o seu jantar e um copo com ... chá de menta. Quente! Pelo menos era melhor que a água salobra. Apesar de não entender nada do que ela dizia, agradeceu a hospitalidade em inglês, recebendo mais um sorriso e um aceno de boa noite.
Depois de comer uma espécie de papa, feita de leite de cabra e algum tipo de cereal, acabou deitando-se e pegando no sono enquanto ainda tinha esperanças que Daren voltasse para vê-la.
- Você pode me ouvir? – falou em inglês perfeito.
Ela não tinha forças para responder.
- Você fala inglês? – perguntou novamente.
Ela assentiu com um movimento leve da cabeça.
- Então tente tomar um pouco de água... Aos poucos, para não engasgar...
A voz grave e ao mesmo tempo suave tinham um efeito tranquilizador sobre ela. Amy tentava seguir o conselho daquele estranho, do qual só podia ver os olhos. Não conseguia raciocinar muito bem. Estava com muito sono...
Ela perdera a consciência mais uma vez. Ele precisava levá-la para a aldeia a poucos quilômetros dali. Levantou-a nos braços, sem muito esforço e colocou-a atravessada sobre sela, de bruços. Assegurou-se de que ela não cairia e partiu. Faltava pouco para o sol se pôr.
Chegando, foi auxiliado por algumas mulheres da tribo. Ele explicou o que acontecera e determinou o que deveria ser feito. Ela foi levada para uma das tendas para ser lavada e hidratada oralmente. Duas horas depois, foi ver como estava sua resgatada. Encontrou-a deitada, vestindo uma espécie de túnica ampla, de cor branca, típica das tuaregues, com os cabelos curtos, louros e desgrenhados, a pele ligeiramente avermelhada e de olhos fechados. Sentou-se ao seu lado, no chão da tenda, sobre o modesto tapete feito à mão. Ficou observando-a, analisando seus traços delicados e imaginando o que ela estaria fazendo naquele lugar onde viviam os “abandonados por Deus”, como os próprios tuaregues se autodenominavam. Não resistiu e passou a mão suavemente pela curva de seu maxilar, num carinho que a fez abrir os olhos lentamente. Eles agora já tinham um brilho normal e o olhavam indiscretos. Ele afastou sua mão imediatamente.
- Onde eu estou? Que lugar é esse?
- Você está num acampamento tuaregue na fronteira de Mali com Niger. Eu a encontrei quase morta a alguns quilômetros daqui.
- Tuaregue? Você é um tuaregue? Como fala a minha língua?
- Esta é uma longa história, que poderei contar-lhe em outra hora – falando isso, pegou uma caneca com água que estava numa mesa baixa, próxima a eles, e ofereceu – Beba isto. Você tem de beber pequenas quantidades por mais algumas horas, até conseguir hidratar-se completamente. Você devia ter sido levada para um hospital, mas tive medo que não resistisse à viagem. Vejo que tem um organismo resistente.
- Argh! Esta água tem sal! – exclamou fazendo uma careta feia – O que tem aqui?
- É uma espécie de soro reidratante oral. É apenas água com um pouco de sal e açúcar para hidratar mais rapidamente.
- Como você sabe isso?
- Sabedoria tuaregue. Beba! – ordenou ele com um brilho nos olhos. Amy imaginou que ele estava sorrindo.
- Você nunca tira este turbante azul?
- Geralmente, apenas para dormir. É uma tradição entre nós. Afasta os maus espíritos.
- Nunca ouvi falar que houvesse tuaregues de olhos verdes.
- Acho que sou uma espécie de mutante.
Ela gargalhou diante do comentário sarcástico dele.
- Nem imaginei que um morador do deserto tivesse tão bom humor.
- Os moradores do deserto têm muitos outros segredos que você desconhece.
- Sério? Será que poderei desvendá-los?
Mais uma vez seus olhos iluminaram-se diante da pergunta maliciosa dela.
- Beba a sua água salgada. Volto mais tarde para vê-la – ordenou ríspidamente.
Após este comando, levantou-se, pronto para retirar-se da tenda.
- Posso ao menos saber o seu nome?
- Só se você disser o seu.
- O meu é Amy. Amy McGarvey.
- Pode me chamar de Daren.
Depois de dizer seu nome, virou-se e saiu do local, deixando Amy de boca entreaberta, querendo continuar o diálogo e saber mais sobre aquele seu estranho salvador. Ele era alto, de andar elegante e sua pele parecia alva, apesar de estar bronzeada. Imaginava como seria o seu rosto, enquanto fazia uma nova cara de nojo ao beber mais um gole daquela água salobra. Prefiria não pensar muito a respeito de onde ela teria saído e que mãos a teriam preparado.
Tinha que sair dali. Talvez pudesse pegar um cavalo emprestado e ir até o posto avançado do rally. Não devia estar muito longe, já que estava na fronteira. Pediria a Daren para ajudá-la. Ele talvez fosse o único que falava o seu idioma. Ainda sentia-se fraca, mas tinha certeza que mais um dia seria o suficiente para poder encontrar a equipe organizadora, recuperar sua moto e retomar a corrida.
Daren não voltou naquela noite. Com algum esforço e lutando contra uma tontura, ela conseguiu levantar-se de seu leito no chão, caminhar até a entrada de seu abrigo e observar o acampamento à sua volta. Podia ver as outras tendas, semelhantes à dela. Algumas cabras estavam reunidas numa espécie de cercado. As mulheres estavam junto à fogueira e entoavam cantos na língua tamacheque ou num dos dialetos tuaregues, enquanto os homens batiam palmas, dançavam e sorriam. Tudo era muito simples. Daren não parecia estar entre aquelas pessoas. Ele não parecia pertencer àquela comunidade. Tinha um porte altivo, falava como se estivesse acostumado a dar ordens. Talvez ele fosse o chefe deles. Já tinha ouvido falar que os tuaregues dividiam-se em várias castas sociais e que a mais nobre, que acumulava as maiores riquezas, era a dos guerreiros. Eles eram chamados de “Senhores do Deserto” antigamente. Eram eles que controlavam as rotas das caravanas no deserto e lutavam com grande agilidade sobre seus camelos. Talvez Daren fosse um descendente deles.
Enquanto observava a reunião noturna, uma das mulheres, muito sorridente e falante, veio ao seu encontro, trazendo o que deveria ser o seu jantar e um copo com ... chá de menta. Quente! Pelo menos era melhor que a água salobra. Apesar de não entender nada do que ela dizia, agradeceu a hospitalidade em inglês, recebendo mais um sorriso e um aceno de boa noite.
Depois de comer uma espécie de papa, feita de leite de cabra e algum tipo de cereal, acabou deitando-se e pegando no sono enquanto ainda tinha esperanças que Daren voltasse para vê-la.
Bem, agora que já conheceram o Daren, volto amanhã. Deixo mais um vídeo, mostrando um pouquinho deste povo simpático e misterioso que abrigou nossa amiga Amy.
Beijos!
Rô, minha querida!
ResponderExcluirÉ incrível essa sua capacidade de nos fazer viajar pelo mundo, atravéz de suas fics. Essa será mais uma fic que arrebentar,não tenho dúvida alguma.
Já estou curiosa para saber os próximos passos de nossa heroína Amy, e o misterioso tuaregue...
Um xêro♥
Carel disse:Ro... pra variar, to amando!!! Mas vou reclamar: se é tipo uma novela, os capitulos andam muito curtos viu??kkkkk Minha curiosidade vai ficar fervendo até ler o restante e saber mais sobre esse homem misteriosoooooooo..kkkkk
ResponderExcluirLy, querida, mais uma vez agradeço o teu comentário.Estás no meu coração. Beijos, amada!
ResponderExcluirCarel, minha leitora aflita! Como ainda não escrevi todo o romance (ele está na cabeça, mas não no Word), vou colocando os capítulos aos poucos para que não aconteça de ter de parar de postar por muito tempo, esperando que possa ter tempo de escrever. Desculpe pelos capítulos mais curtos. Vou tentar aumentá-los, se possível...rsrsrs. Muito obrigada pelo comentário e pela fidelidade a esta escritora amadora, tua amiga. Beijos, querida!
Bárbaro Rô, com todas as dificuldades os Tuareg encontram "consolo"na dança e no capricho de suas vestes é emocionante ver tamanha perseverança q exemplo d povo.
ResponderExcluirBom o q dizer da sortuda Amy com seu Daren? Q mesmo desacordada teve o privilégio d ser carregada por aqueles braços? ter aquela delíciosa mão percorrendo seu maxilar? Acordar com aquele oasis de olhos azuis penetrantes? O q sei é eu no lugar dela acharia q estava tendo uma Bela miragem, e dessa miragem ñ queria me livrar..rss
Bjkas
Amiga, nem sabia o que era um tuaregue, mas esse tuaregue de olhos verdes eu quero!!!
ResponderExcluirNão seria só a Amy a ficar imaginando o rosto de Daren, diante de um par de olhos verdes tão penetrantes e audaciosos, eu tb ficaria roxinha de curiosidade em dar uma espiadinha em todo o resto deste belo exemplar.
Eca, chá de menta quente no deserto, ninguém merece, mas fazer o que, eles entendem melhor da saúde e dos meios de sobrevivência no deserto do que a gente.
Judiação, o Daren nem voltou para vê-la... as borboletas já estão se movendo no meu estômago... tô ansiosa pelo que está por vir...
Menina, ainda bem que os tuaregues praticam a monogamia... já pensou ter que dividir o Daren com outras?!! NÃÃÃÃÃÃÃOOOOO!!! Já estou até imaginando nós dois fazendo tuareguinhos... com os olhinhos verdes do pai... ai...ai...
Beijinhos
Rosane, que maravilha!
ResponderExcluirAdorei a inovação! Temos a oportunidade de viver o romance mais intensamente, tendo a chance de ver o cenário ao invés de apenas imaginá-lo.
Bjs