Acordou muito cedo pela manhã e mal-humorado. Tomou seu café e começou a preparar-se para mergulhar além dos arrecifes. Lá, no fundo do mar, com sua máscara e os cilindros de oxigênio, ao som de sua própria respiração, pescando ou apenas observando o movimento dos peixes entre os corais, encontrava uma paz indescritível. Não havia lugar mais apropriado para ficar a sós consigo mesmo e encontrar o seu equilíbrio. Partiu em seu barco, armado com um arbalete para pesca submarina, além de água e dois sanduíches reforçados, suficientes para passar o dia. Em torno das duas horas da tarde, avistou um caiaque amarelo, de propriedade do Mairi, com uma pessoa a remar próximo aos arrecifes, a cerca de quinhentos metros distante de onde ele estava. A maré a começara a baixar e o navegador corria o risco de encalhar ou de entrar no mar aberto e não conseguir voltar. Podia ser alguém com prática neste esporte ou um completo maluco. Foi quando viu que era uma mulher que “estacionava” a pequena embarcação e tentava descer sobre os recifes de corais, soube que ela pertencia à classe dos malucos. Soltando uma praga, entrou em seu barco a motor e partiu na direção de um acidente iminente. Quando se aproximou um pouco mais, reconheceu a jovem de biquíni que vira na tarde anterior, pois ainda vestia o mesmo traje mínimo. Ela estava sem os óculos e seu chapéu acabara de voar para dentro de uma das piscinas de água translúcida que a circundavam, fazendo-a deixar escapar um sonoro palavrão. Lucca riu da maneira desajeitada como ela tentava andar sobre os corais e procurava alcançar o chapéu. Só parou de rir e ficou seriamente preocupado ao ver que ela estava descalça. Perguntou-se se ela já havia lido sobre os perigosos ouriços que viviam nestes locais ou sobre os cortes profundos que os corais podiam provocar em pés sem proteção.
- Ei, você! – berrou, esperando que ela o escutasse de onde estava. – Tem que sair daí. Seu caiaque vai ficar encalhado nos corais se não sair logo.
- O quê? – exclamou surpresa ao ouvir uma voz masculina vigorosa. Tão deslumbrada estava com a descoberta de sua habilidade nata, até então desconhecida, em dirigir um caiaque e as belezas naturais no meio do oceano, que não viu o barco aproximando-se e tampouco seu condutor. Antes de reiniciar mais uma tentativa de alcançar seu chapéu, deu-se conta de quem partira a advertência para sair dali. Isadora desequilibrou-se e caiu sentada sobre uma pedra, soltando um lamento de dor. Ele aproximou-se o mais rápido que pode, temendo que ela tivesse caído sobre algum ouriço-do-mar.
- Você está bem? – gritou preocupado com ela – Fique onde está que eu vou até aí ajudá-la.
Tinha conseguido atenuar a queda apoiando uma das mãos sobre os corais. Com dor e trêmula, tentava buscar uma maneira para colocar-se de pé, apesar da orientação de seu inesperado salva-vidas.
Vendo que ela não tinha intenção de obedecê-lo, apressou-se em alcançá-la.
- Eu disse para ficar quieta – ordenou em tom extremamente irritado.
- Está bem. Desculpe... – acabou cedendo ao ver a fúria nos olhos... verdes. “Ele tem belos olhos verdes, como este mar que nos envolve”, observou temerosa e admirada ao mesmo tempo. Além dos olhos, chamou-lhe a atenção os traços másculos de seu rosto, o queixo levemente quadrado com uma covinha no centro. Detalhes que não conseguira definir no dia anterior, mas que não o deixavam menos atraente do que imaginara. Foi despertada de seu devaneio ao sentir uma garra de aço em torno de seu braço, puxando-a para cima. O aperto foi tão forte que a fez lançar um novo, mas tímido, gemido de dor. Aflito, mas com voz firme, perguntou:
- Onde está doendo?
- No meu braço. Você o está apertando muito forte – lamentou baixinho.
- Ah, desculpe – disse afrouxando a mão ao perceber que aplicara mais força do que devia sobre aquele braço frágil – Pode me processar se ficar roxo.
- O quê? – ela perguntou desconcertada.
- Nada. Esquece. Deixe-me ver aqui atrás se está machucada – ordenou novamente, erguendo-a rapidamente e forçando-a a virar de costas para ele, continuando a segurá-la firmemente.
- Espere um pouco aí, moço. O que pensa que está fazendo? Pode me largar, por favor? – Ela estava indignada com as atitudes grosseiras do desconhecido.
- Preciso ver se não sentou em cima de algum ouriço!
- Ouriço?
-Sim. Existe um grande número deles por aqui – informou, enquanto observava atentamente as nádegas e coxas de Isadora, certificando-se que, apesar de avermelhadas pelo trauma, elas continuavam belas, intactas e firmes, segundo constatou ao tocá-la enquanto a examinava – Parece que você tem mais sorte que juízo, moça. Se caísse alguns poucos centímetros para o lado... – Aliviado, mostrou-lhe os ouriços que estavam bem próximos a eles.
Ela viu horrorizada as inúmeras esferas, de diversos tamanhos, escuras e repletas de grandes e perigosos espinhos que apontavam ameaçadores para as eventuais vítimas.
- Obrigada por sua preocupação, mas acho que já posso me cuidar sozinha agora – replicou, ainda ruborizada com a sensação do toque íntimo feito por ele e por sua ignorância a respeito dos habitantes dos corais.
- Tem certeza disso? – perguntou sarcástico, olhando na direção do caiaque que agora se encontrava preso sobre as pedras do arrecife, encalhado, sem deixar de segurá-la pelo braço. – Acho que você não vai conseguir desencalhá-lo tão facilmente.
- Só tenho que levá-lo até a água e voltar para a praia. Tenho certeza que posso fazer isto sozinha – disse irritada com a presunção dele – Pode me soltar, por favor?
- Pois esteja à vontade – falou com um meio sorriso nos lábios, soltando-a finalmente. Seria interessante vê-la tentar colocar o caiaque de volta na água.
Por mais força que Isadora fizesse, não conseguia mover a bote do lugar, além de sentir os pés machucados pelas conchas e pedras. A cada segundo passado ficava mais injuriada por perceber que teria de dar razão àquele arrogante pescador, que continuava ali, de pé, com um sorriso lascivo pregado no rosto, observando-a como se ela fosse uma deficiente mental.
“Ela fica uma graça quando irritada”, comentou para si mesmo, observando seus cabelos castanho-claros, que apresentavam um tom dourado ao irradiarem a luz do sol, caindo sobre os ombros em cascatas onduladas, e a pele que permanecia alva e sedosa. Só então notou o sangue que vertia da mão que ela usara como apoio para tentar evitar a queda. Mais uma vez, num movimento rápido, a fim de analisar a extensão do ferimento, pegou-a pelo pulso e obrigou-a a mostrar-lhe a palma da mão, forçando-a a uma nova exclamação.
- Você precisa de cuidados. Não vai conseguir desencalhar o caiaque e muito menos remar de volta. Agora, se acalme e deixe que eu a ajude. Está bem? – sua expressão tornou-se branda e a voz suavizou-se. Ele parecia realmente preocupado com ela.
- Está bem – assentiu envergonhada por ter-se comportado como uma adolescente teimosa e insolente diante do auxílio prestado por ele.
No mesmo instante, ele a soltou, pegou o caiaque com as duas mãos, elevou-o no ar e colocou-o em águas menos rasas.
- Pronto, princesa. Agora venha. Entre na lancha. Vou amarrar o seu caiaque para rebocá-lo – falava mansamente, tentando tranquiliza-la, quando a pegou pela mão ilesa e ajudou-a a entrar na sua embarcação com cuidado.
Ele notou o tremor de suas mãos quando a transferia para a segurança do seu barco, e imaginou que ela ou estava ansiosa por ter visto seu próprio sangue, como era comum nas mulheres, ou estava com medo dele. Recriminou-se por ter sido tão rude ao tocá-la da primeira vez, mas é que estava realmente assustado com o que poderia lhe acontecer. Na verdade, não estava gostando das sensações que aquela maluca despertava nele. O melhor era prestar seu socorro e afastar-se dela o mais rápido possível.
Sem dizer mais uma única palavra, Lucca amarrou uma corda ao bote. Entrou na lancha, colocou uma toalha de banho seca sobre os ombros de Isadora, cobrindo-a, e ligou o motor. Ela apenas o observava, sem coragem de puxar conversa. Ele agora seguia muito sério e calado, provavelmente amolado por estar tendo que perder seu tempo com uma desmiolada inconseqüente. Ao chegar à praia, ele agilmente pulou sobre a areia tocada pelas ondas e soltou o caiaque, arrastando-o rapidamente até a areia seca e, quando ela menos esperava, voltou e retirou-a dali, elevando-a nos braços, apesar de um fraco protesto, e carregando-a escadas acima para o Mairi, até a enfermaria que ficava próxima. Lá explicou à enfermeira o que acontecera e deixou-a aos seus cuidados.
- Agora que está em segurança, vou embora. Adeus – despediu-se secamente sem esperar correspondência.
Saiu sem dar tempo à Isadora de recuperar-se da surpresa ou agradecer sua ajuda. Após receber compressas geladas sobre a região atingida, sentindo-se ridícula pela posição em que teve de deixar-se ficar para o tratamento, foi medicada com um antiinflamatório e orientada a fazer repouso pelas próximas vinte e quatro horas. Provavelmente apenas desenvolvesse um pequeno hematoma localizado, já que o trauma não havia sido grave, graças ao apoio da mão. Esta, consequentemente, havia sofrido algumas escoriações mais profundas, mas que certamente estariam cicatrizadas em poucos dias. Teria de evitar molhar o curativo por aproximadamente uns três a cinco dias. Saiu dali direto para o seu chalé, relembrando tudo que acontecera nos arrecifes e, principalmente, do homem que a ajudara. Não sabia sequer o seu nome. Começou a pensar se não tinha sido muito teimosa ao rejeitar a ajuda que ele lhe oferecera. Acostumada a não precisar de ninguém para resolver seus problemas, havia sido grosseira com ele. Talvez tivesse ajudado o nervosismo que a presença dele lhe impunha. Nunca sentira o coração bater tão descompassado diante de um homem. Quando ele a pegou nos braços e pode sentir seu corpo colado ao seu, a solidez de seus músculos e o cheiro de seu suor, uma agradável mistura de brisa marinha e madeira, pensou que fosse desmaiar. Naquela segunda noite, pediu a refeição no quarto e custou a pegar no sono, imaginando se teria coragem de ir até ele, pedir desculpas e agradecer por sua ajuda.
A algumas poucas centenas de metros do Mairi, Lucca tentava tirar aquela mulher de sua cabeça, sem muito sucesso. Nunca se sentira tão excitado por alguém. Em certo momento sentiu vontade de calar sua voz indignada com um beijo. Aquela boca de lábios cheios era um convite tentador, assim como aquele corpo quente e macio era um apelo para o amor. A lembrança daquele olhar de mel, o modo como ela acabou submetendo-se a ele, de como havia colocado seus braços em torno de seu pescoço quando a levou para a enfermaria... Mas não podia cair neste tipo de armadilha. Certamente ela era mais uma dessas mulheres solteiras que vinham a um resort a procura de uma aventura amorosa ou de um “trouxa” rico para depená-lo. Não se deixaria enganar novamente. A experiência com Ana tinha sido suficiente para abalar completamente a sua confiança nas mulheres. Por mais atraente e desejável que ela fosse, ele precisava controlar-se. Desistiu de ficar andando de um lado para o outro e foi andar pela praia numa tentativa de afastar a inquietude que tomava conta dele. Isto sempre funcionou em outras épocas. Funcionaria agora também. Estava certo disso. Ou pelo menos, quase certo...
Estão gostando? Espero que sim. Vocês já devem ter uma imagem do Lucca na cabecinha. É difícil de imaginar quem seja ele, não?...rsrsrs. Eu já tenho até uma foto, que devo postar no Capítulo IV. Mas ainda não consegui visualizar alguém com as características da Isadora. Quem quiser dar uma sugestão, por favor habilite-se.
Espero postar o terceiro capítulo no início do fim de semana. Aguardem.
Não poderia deixar de agradecer aos comentários e recados mais que carinhosos da Ly, da Cris, da Lucy, Nadja e Vanessa, minhas fiéis leitoras. Grande parte do meu prazer em escrever é este retorno que recebo de vocês, minhas queridas. Sem vocês, este blog não existiria. Beijos!!
UPDATE
Resolvi colocar uma fotinho do "Lucca", dando o seu olhar sombriamente sedutor, para dar maiores asas à imaginação...
Legal!!!!
ResponderExcluirVou ser a primeira a postar neste cap..Amei,adorei e não sei o que dizer a não ser que vai ser mais um do seus sucessos,pois tem suspemse,amor,intriga tdo na medida certa.
Além do ator principal ser o nosso adorado escocês,que está divino nesta nova história que promote ser uma das melhores e como a Lucy e a Nadja já disseram que a imaginação já viajou e que já fui pescada por ele.E não demore mto para postar o terceiro cap.
P.s:Está foto do pescador está demais.
Carel disse:
ResponderExcluirAIiiiiii!!!! Adoro homi brabo...e se tiver esse rostinho do Lucca, melhor ainda..kkkkk... Putz, Ro...maravilhoso!!!!To ansiosa pela continuação... Não demora viu??? E dou minha sugestão pra Isadora: Scarlet Johanson ou a Natalie portman... sugestões apenas,viu??Bjkas!!!
Rô, nem preciso dizer que estou adoraando esse pescador, rude porém sensível...
ResponderExcluirE fecho com a Carel, Scarlet Johanson para Isadora!
O coisa boa esse tal de Lucca, e pra agravar a situação, com dois Cs. Que tal eu para Isadora. kkkkkk
ResponderExcluirCapítulo bárbaro querida! Estou adorando.
Bjs
Oi, Rô!
ResponderExcluirConcordo plenamente: o mar é um dos melhores lugares para nos interiorizarmos, para ficarmos em paz, esquecermos do tempo e minimizarmos os problemas do cotidiano.
Ai... ai... ai... eu adoraria ver esses olhos verdes enfurecidos...
Amiga, deixa o coitado calar a voz dela com um beijaço daqueles capazes de nos fazer dar a volta no universo três vezes!!!
Vixe, eu já estava por aqui imaginando o Lucca e vc ainda adiciona essa fotinho... Socorro!!! Com carinha de pidão... Já era o meu rei, agora vai ser o meu pescador...
Beijinhos