terça-feira, 19 de abril de 2011

Pelo de Punta (Arrepiada) - Capítulo X



Júlia acordou tarde naquela bela e ensolarada manhã. Sentia-se recuperada. Apesar de suas preocupações, o sono viera fácil e revigorante, graças a exaustão em que se encontrava. Pelo horário, imaginou que perdera o café. Vestiu-se e desceu até a sala. Lá estava Dona Rosário, aparentemente a sua espera.
- Buenos dias – cumprimentou-a sem emoção. Júlia pôs-se a imaginar o quanto aquela mulher teria sofrido para chegar àquele estado de inanição emocional, restando como resquícios só o medo do marido e do filho mais velho.
- Buenos dias! Perdão por ter acordado tão tarde, mas é que não havia dormido muito bem nos últimos dois dias. – Talvez fosse impressão, mas notou certo ar de compreensão e bondade transparecer no rosto precocemente envelhecido.
- Tem alguém a sua espera no gabinete.
- Miguel? – Infelizmente não foi bem alegria o que sentiu ao saber que finalmente veria o homem por quem até alguns dias atrás imaginava estar apaixonada. Ao invés disso, engoliu em seco, sentindo uma forte opressão no peito. Tentou afastar essa sensação, lembrando daquele rapaz gentil e bem humorado que sempre aparecia com um ramalhete de flores e palavras de amor a cada novo encontro. Muito provavelmente ele não mudara... Talvez a mudança tivesse ocorrido com ela...
De cabeça erguida e respirando fundo, andou apressadamente até a sala onde conversara com Isabel na noite anterior. Abriu a porta e sorriu ao ver a figura imponente de Miguel sentado atrás de sua escrivaninha. Ao vê-la, ele levantou-se. Não houve retribuição ao sorriso recebido, mas isso não impediu que Júlia caminhasse em sua direção para abraçá-lo.
- Miguel... – parou momentaneamente ao notar que ele continuava parado e fitando-a friamente. – O que houve? Por que está me olhando assim?
Antes que pudesse ouvir qualquer explicação, sofreu uma inesperada agressão. A mão de Miguel cortou o ar entre eles e foi direto ao seu rosto, extraindo-lhe um grito de dor e deixando um amargo gosto de sangue na boca. Antes que pudesse cair para trás com a violência da bofetada, foi segura por uma mão férrea, que estrangulou seu braço e a puxou para frente.
Incrédula e sentindo as lágrimas turvando sua visão, pode ver a expressão colérica do “desconhecido” que a segurava.
- Por que fez isso comigo, Júlia? Pensou que eu não descobriria? Pensou que me faria de corno e ficaria por isso mesmo? – esbravejou.
- Do que você está falando?
- Ainda por cima se faz de sonsa! O homem com quem você dormiu em Curaçao! Quem era ele? Há quanto tempo são amantes? – Ele a sacudia como se fosse uma folha de papel.
Júlia não conseguia raciocinar direito ainda abalada com o tratamento recebido. Estava confusa, tentando lidar com a dor física e o assombro pelo ataque sofrido.
Uma batida forte na porta o fez desviar a atenção por alguns segundos, afrouxando o nó em torno do braço de Júlia.
- Vá embora! – gritou exasperado.
Não obedecendo ao comando, a porta se abriu e Isabel apareceu.
- O que pensa que está fazendo, Miguel? Solte-a!
- Saia daqui, Isa, se não quiser levar o seu quinhão também!
- Acho melhor você se acalmar. A Júlia tem uma visita e não ficará nada bem se ela presenciar esta cena dantesca.
- Visita? Que visita? – grunhiu, enquanto Júlia também arregalava os olhos imaginando que aquilo devia ser uma manobra de Isabel para evitar o pior, afinal quem a visitaria ali? Até porque não dera o endereço para ninguém...
- Segundo ele, é quem dividiu com ela o quarto em Curaçao. Aliás, que desperdício... – complementou com pesar.
- O quê? O sujeito teve a coragem de vir até aqui?
- Bryan? – sussurrou Júlia entre surpresa e aflição.
- É esse o nome do cachorro que não vai sair daqui vivo? – sibilou raivoso, pegando algo de dentro de uma gaveta da mesa que colocou no bolso do casaco. Júlia estremeceu ao ver que era um revólver.
- Miguel! Não faça isso! Não aconteceu nada! Ele é só um amigo! – conseguiu expressar-se ao prenunciar uma tragédia ao mesmo tempo em que pensava o que estaria fazendo Bryan ali.
- Amigo? Vamos ver! – Tornou a pegá-la pelo braço e praticamente arrastou-a até a sala.
- Júlia, minha querida! – soou a voz estranhamente efeminada assim que entraram na sala – Tudo bem? Esse é que é o seu “bofe”? Ele é mesmo um gato, menina! Você deve ser o famoso Miguel. Ai, essa mulher não parou de falar o seu nome o tempo todo em que ficamos juntos... Muito prazer... Bryan, mas, prá você, apenas Bry... – e ofereceu a mão desmunhecada lançando um olhar lânguido para Miguel.
Não fosse a dor provocada pelo corte em sua boca, teria desatado a rir, apesar de sua posição precária. Bryan atravessou a sala na direção deles, vestindo um jeans e uma camiseta muito justa de cor preta. Os cabelos estavam jogados para trás pelo uso de uma tiara forrada por um tecido com estampa que imitava pele de onça.
- Você é o cara que ficou com ela em Curaçao?
- Com certeza! – disse revirando os olhos.
Miguel explodiu numa gargalhada, deixando todos perplexos a sua volta.
- Júlia, por que não me falou que ele era um maricón?
- V-você não me deu tempo de falar... – a raiva pelo ato cometido por Miguel começava a surgir, renovando-lhe as forças para reagir contra ele.
- Maricón não, por favor! Gay é uma palavra mais adequada... – arremedou Bryan com voz esganiçada e revirando os olhos. – O que foi isso na sua boca, Jú? – perguntou enquanto controlava a vontade de partir para cima do calhorda que a machucara.
- Não foi nada. – Miguel impediu que ela respondesse, voltando a ficar sério – Ela ficou tão emocionada quando me viu que tropeçou e bateu com o rosto na mesa do gabinete. Não foi, meu bem?
Amedrontada, apenas acenou com a cabeça confirmando o incidente, mas, no íntimo, aflita para subir logo ao seu quarto, pegar suas coisas e fugir dali o mais rápido possível, aproveitando a chegada de Bryan. Jamais imaginara que Miguel pudesse reagir daquela maneira, sem ao menos dar-lhe uma chance de defesa. Afinal a tese de Bryan se confirmara. Ele colocara alguém para segui-la. Teria sido apenas uma desconfiança ou Bryan sabia de alguma coisa a mais e não falara abertamente. Já não sabia o que pensar. O mundo virara de pernas para o ar e ela não via uma saída para escapar daquela loucura.
- Como conseguiu chegar até aqui e o que deseja de minha noiva? – indagou, pegando Júlia pelo braço novamente, agora de forma mais gentil.
- Ex - futura - noiva – disse ela entredentes de forma que só ele escutasse, provocando imediata reação dele que voltou a aplicar grande força na mão que a segurava.
- Pois é... Liguei para a Júlia para saber se tudo tinha corrido bem na sua chegada e ela me deu o endereço para o caso de eu precisar de alguma ajuda.
- Ora, mas que gentil... – falou com sarcasmo – E você está precisando de ajuda, meu caro?
- Que bom que perguntou, Miguel – respondeu em tom íntimo provocando visível asco no outro.
- É que aconteceu uma coisa muito chata e... Será que eu poderia falar a sós com a Júlia? Não consigo explicar o que houve na frente de tanta gente... – referindo-se à mãe e à irmã de Miguel e mais dois empregados presentes.
Após alguns momentos de vacilação, Júlia foi liberada para conversar com seu amigo, no mesmo gabinete onde poucos minutos antes enfrentara a fúria de Miguel. Ainda estava com as pernas e mãos trêmulas quando entrou no gabinete acompanhada por Bryan.
Tão logo entraram, ele fechou a porta, fez sinal com o dedo indicador sobre o lábio para que ela permanecesse em silêncio e passou a movimentar-se rapidamente entre os móveis, analisando cada canto do ambiente, gavetas, objetos, como quadros, vasos e o telefone. Dirigiu especial atenção para o computador que se encontrava aberto sobre a mesa, logo perdendo o interesse ao vê-lo desligado. Júlia a tudo observava com curiosidade e início de irritabilidade, esperando por uma explicação coerente para o que estava acontecendo.
- Bryan, o que está fazendo aqui e que história é essa de dizer que é gay? – cochichou com impaciente indignação.
- Acho que podemos falar aqui... cochichando, por favor.
- Por quê? O que significa tudo isso?
- Eu vim para ajudá-la a escapar daqui. Soube que você estava em dificuldades. Ele provavelmente iria matá-la de pancada se eu não aparecesse desse jeito.
- C-como você soube que ele estava me batendo?
- Está com o seu celular, não está?
Ela colocou a mão no bolso da calça folgada que vestia e tirou o aparelho de lá.
- Sim, mas o que tem a ver? Ele está desligado...
- Nós colocamos uma escuta nele, por isso sei tudo que está acontecendo com você.
- Nós?
- Olhe, não temos muito tempo para explicações. Nós vamos continuar esse teatro até eu poder pegar o que quero daqui e levá-la embora.
- Pegar o quê? – falou cada vez mais confusa.
- Depois eu explico, Júlia. Preste atenção. Miguel é um homem perigoso. Ele precisa acreditar na nossa história para podermos sair ilesos daqui. Você vai dizer que eu fui assaltado por um homem com quem saí e ele levou todo o meu dinheiro e minha bagagem. Não tenho como pagar um hotel, por isso vim para cá ficar com minha “amiga”. Prometo que sairemos daqui ainda essa noite. Confirme tudo que eu disser. Confie em mim.
- Como vou confiar num homem que agiu como um cafajeste comigo, desapareceu sem dar explicação alguma e agora aparece, se dizendo gay, falando que colocou uma escuta no meu telefone e que está me vigiando também??
Não conseguiu continuar seu discurso, pois Bryan saltou sobre ela, cingiu-a nos braços e colou os lábios sobre os dela, provocando-lhe susto e dor, devido ao machucado na boca, que logo se desvaneceram em um agradável torpor. O calor incitado pelo desejo que surgiu do contato com aquele corpo grande e quente que a envolvia a fez esquecer-se de tudo, ao menos naquele momento. Quando se afastaram, Bryan a olhou com carinho e determinação e disse:
- Confie em mim. É a nossa única chance de sair daqui com vida. Se não quiser mais olhar para a minha cara depois, tem todo o direito.
Atordoada entre o desejo e o medo, resolveu ao lado de quem ficaria.
- Está bem. Diga o que precisamos fazer.

(continua...)


Aqui está como prometi. Sei que foi um capítulo mais curto, mas dá para perceber que nos próximos teremos um pouquinho mais de agitação.
Vou tentar postar o 11º capítulo até o domingo, como presente de Páscoa para minhas leitoras fiéis.
Beijos, minhas queridas!

8 comentários:

  1. Ai meu Deus, que tensão!
    Que cafajeste esse Miguel, merecia levar uma surra do Bryan, mas tenho certeza que em breve ele terá o que merece.
    Tadinha da Júlia, perceber dessa forma o quanto tinha se enganado a respeito dele, deve ser uma dor muito grande, não só a dor físíca mas, principalmente a decepção. Ainda bem que existe esse homem íntegro, gentil e lindo tomando conta dela, rsrsrs.
    Beijos amiga e uma Páscoa de Paz e tranqulidade pra você e sua família.

    ResponderExcluir
  2. Rosane!!! Que criatividade... adorei esse capítulo e digo que sempre quis um amigo gay. Mas se for um como Bryan, melhor ainda! Aguardo ansiosa os próximos capítulos. Estou adorando essa história! Bjos!

    ResponderExcluir
  3. Rô!!!

    Demorei para aparecer, mas apareci! Estou acompanhando desde o primeiro capítulo, e AMANDO!!!!

    A história está ótima! Que bom que a Júlia agora viu quem realmente é o Miguel, triste isso.
    Mas o Bryan, lindo, gostoso, apareceu!!

    ADOROOOOOOOO

    Tô amando a história e muito ansiosa para ler o próximo cap. e saber como eles vão fugir dali.

    Bjos!

    ResponderExcluir
  4. Rosane só vc mesmo, eu ri muito imaginando o bryan daquele tamanho, com aqueles músculos maravilhosos diga-se de passagem, de "maricón" kkkk muito engraçado, e a julia coitada no meio de toda essa confusão, o que será que eles vão aprontrar no próximo capítulo tô super curiosa... beijosss e uma ótima páscoa pra vc e sua família

    ResponderExcluir
  5. Só pude comentar hj...
    TA DEMAAAAAAAAAAAAAIS!!
    adooooooogo!

    ResponderExcluir
  6. Q mix de sensações, estou até me abanando por raiva pelo Miguel (como citei antes, pior q o pai dele) e por extase pelo heroí pegador Bryan.. kkk...

    Please ficaremos aqui anciosas pelo presentaço de páscoa hein... kkk

    * * *Bjkas e Ótimo Feriadão* * *

    ResponderExcluir
  7. Olá Rosane! Tudo bem com você?
    Nossa adorei os dizeres sem palavras,
    Mas não sou tudo isso não...rsrs
    Toda essa inspiração só tem um nome Léia...rsrs

    Agora o seu texto sem palavras, muito bom parabéns
    E tudo de bom sempre, Sucesso!

    Beijo

    ResponderExcluir
  8. Rose, tem um meme pra você bem lindo lá no blog.
    http://meulivrorosa.blogspot.com
    vai lá ver.
    beijokas enormes.

    ResponderExcluir

Cantinho do Leitor
Este cantinho está reservado para que coloquem suas críticas a respeito de meus romances e do blog. A sua opinião é muito importante para mim. Se tiverem alguma dificuldade em postar aqui, deixem mensagem na caixa de recados.
Beijos!