quinta-feira, 4 de março de 2010

Na Rede do Pescador - Capítulo IX

O sol lançava seus primeiros raios de luz através das cortinas do quarto, quando Isadora se deu conta que Lucca havia passado a noite ao seu lado. Antes de abrir os olhos, pode sentir os braços fortes cruzados sobre seus seios, abraçando-a por trás, o suave vai-e-vem de sua respiração serena e o leve roçar dos pelos em suas costas. Uma incrível sensação de segurança e felicidade a invadiu. A tormenta da noite anterior se dissipara e, finalmente, eles puderam entregar-se um ao outro sem equívocos ou mentiras, despidos de qualquer receio. Juras de amor foram trocadas, entre suspiros e murmúrios de prazer, pela madrugada afora, unindo-os intensa e completamente.

- Já está acordada? – sondou a voz rouca, fazendo cócegas em seu ouvido.
- Já... Pensei que você estava dormindo...
- Acho que dormi um pouco, mas já estou de volta à ativa – sorriu maldoso, sentindo o desejo tomar conta de seu corpo mais uma vez – Não quero deixar de aproveitar nenhum momento ao seu lado...
- Mas vamos ter que descansar um pouco uma hora dessas, senão não vamos aguentar – censurou-o soltando uma risadinha tímida ao senti-lo em suas nádegas.
- A gente descansa depois... – disse com a voz mais rouca ainda, afastando-se o suficiente para poder virá-la de frente para ele – Eu prometo...
Ao sentir o peso e o calor daquele corpo viril, recendendo aquele cheiro que tanto a atraíra quando a pegou nos braços pela primeira vez, sentiu-se incendiar. O cansaço da noite passada desapareceu e deu lugar ao desejo de tê-lo mais uma vez confundindo-se ao seu corpo, entre os lençóis da cama, até não poder mais. Era uma ânsia que parecia não ter fim e que não queria que acabasse jamais...

Passaram o dia juntos no bangalô. Não saíram nem para fazer as refeições. Nada lhes fazia falta, a não ser a companhia um do outro. Só no final da tarde, resolveram sair para jantar. Foi então que o celular de Lucca tocou. Ao olhar o visor, reconhecendo a autora da chamada, franziu o cenho aborrecido e atendeu extremamente irritado, para surpresa de Isadora.
- O que você quer? Já não bastou eu jogá-la para fora da minha casa ontem para perceber que não me engana com suas artimanhas e que eu não quero mais ver você na minha frente?
Logo Isadora entendeu de quem se tratava do outro lado da ligação.
- Sobre Guilherme? O que tem ele? – olhou de relance para Isadora com expressão preocupada. Após alguns segundos passados entre a resposta de Ana e a pausa para pensar de Lucca, ele respondeu: – Se estiver tentando me enganar de novo para conseguir dinheiro, acabo com você! – e desligou furioso.
- O que ela queria? – perguntou Isadora assustada.
- Não sei. Não quis dizer ao telefone. Diz que tem algo sobre Guilherme que quer me dizer... – olhava para o chão, com as mãos crispadas, perdido nas tentativas de imaginar o que haveria sobre o irmão que a megera queria contar. – Quer que eu a encontre lá em casa agora.
- Eu vou com você – ofereceu-se imediatamente.
- De jeito nenhum. Não quero que ela coloque os olhos ou destile seu veneno sobre você.
- Mas... – tentou argumentar.
- Vamos fazer o que combinamos, Isa. Vamos sair para jantar. Eu vou até lá, ouço o que ela tem a me dizer e a coloco para fora. Volto aqui e saímos.
- Não vou aguentar saber que está lá, com ela tentando seduzi-lo, enquanto eu fico aqui roendo as unhas de preocupação.
Ele sorriu diante do estado de aflição que Isadora se encontrava e aproximou-se dela, carinhoso.
- Meu amor, já fui seduzido definitivamente por você. E só você tem esse poder. Quanto àquela, já a desmascarei e vi o que realmente existe por trás daquela beleza fútil. Não caio mais nas suas ciladas – Segurou-a no queixo, beijando-a suavemente nos lábios – Confia em mim. Eu te amo, Isa.
- Lucca... – sentiu-se amolecer diante daquele beijo e daquele olhar sincero e apaixonado.
- Arrume-se e me espere aqui. Eu não demoro.
- Mas, e se demorar? Depois de tudo que você me falou dela, fico até com medo do que ela possa aprontar.
- Ela não vai aprontar nada. Olhe, se eu demorar, ligue para o meu celular. – Dirigiu-se até a pequena escrivaninha que tinha num canto do quarto, onde havia papel e lápis e rabiscou dois números de telefone. – Aqui está o número do meu celular e o da casa. Se eu demorar demais, ligue. Mas não saia daqui. Está bem? – sua voz tornou-se muito doce nas últimas palavras. Deu-lhe mais um beijo e saiu, fechando a porta atrás de si.
Apreensiva, Isadora tentou pensar em outras coisas. Pensou que seria bom tomar um banho e relaxar um pouco. Talvez ligasse para casa para dar notícias. Ligara apenas duas vezes e sumira. Era isso mesmo que faria. Confiava em Lucca. Logo ele estaria de volta e sairiam para um jantar romântico. Pensando assim, escolheu a roupa que usaria para a noite e foi para o quarto de banho ligar o chuveiro.
Após a chuveirada, envolta na toalha, prendeu os cabelos e foi maquilar-se. Olhou-se no espelho e gostou do que via. A pele levemente bronzeada dava-lhe um aspecto saudável há muito perdido em São Paulo, na sua rotina de trabalho. Quase não estava necessitando maquiar-se. Apenas um realce nos olhos e um batom seriam suficientes para deixá-la satisfeita com sua aparência. Quando começou a pensar no que faria com os cabelos, ouviu alguém bater na porta. Seu coração quase saltou do peito de tanta alegria. Ele voltara! Correu para abri-la, mas ao fazê-lo, sua expressão murchou, os lábios ficaram entreabertos, procurando uma maneira de expressar o seu horror diante do que viu, mas sua fala desaparecera juntamente com sua alegria.

Lucca já estava impaciente com a espera. Ana havia dito que logo o encontraria ali, mas já chegara há mais de 20 minutos e nada dela aparecer. Pensou em ligar para Isadora para tranquilizá-la. Foi quando soou a campainha.
- Oi, meu querido – saudou-o alegremente, entrando sala adentro quando ele a atendeu. Não parecia lembrar-se da maneira como fora escorraçada na noite anterior.
- Muito bem, Ana. Diga logo o que tem para me dizer. Tenho um compromisso logo mais – avisou-a secamente.
- Ah! Vai sair com sua nova amada – exclamou sarcástica – Você não perde tempo, não é mesmo, querido? Não pode ver um rabo de saia que já está na cola.
- Diga o que tem a dizer e dê o fora – disse entre dentes, rispidamente.
- O que tenho a dizer, meu caro cunhadinho, é que tenho algumas procurações aqui para você assinar. É coisa rápida. Depois vou embora e você não me verá nunca mais.
Ele a olhou, divertido pela audácia da mulher.
- O que você tinha a dizer sobre Guilherme? – perguntou, desprezando o que ela tinha dito por último.
- Sobre Guilherme? Ah... Coisas que você, como irmão caçula sempre se recusou a ver. Que ele era um chato, certinho demais, pão-duro... E péssimo amante, se quer saber.
A ira de Lucca tornava-se insuportável e ele segurava os punhos fechados, tensos ao lado do corpo, para não bater na mulher que agora soltava farpas sobre o seu irmão morto.
- Sei que é difícil para você ouvir isto, mas é a verdade. Mas isso não vem ao caso. – Sentou-se calmamente no sofá a sua frente e tirou da bolsa  algumas folhas de papel. – Tome. É só assinar isso aqui, e eu sumirei da sua vida. Apenas quero o que me é de direito. Você anula o processo que jogou sobre mim, tirando meus direitos de pobre viúva, que aguentou por dois anos uma vida miserável e resignada ao lado de um marido ausente, e me dá quarenta por cento da sociedade na rede hoteleira Girard. E olhe que estou sendo boazinha.
Lucca caiu na gargalhada, por alguns instantes. Mas logo tornou-se sério e com o semblante tomado pela cólera.
- Você enlouqueceu, Ana? Pensei que você era apenas uma golpista de segunda, mas vejo que é louca. Como pode vir aqui, falar deste modo do meu irmão e ainda querer que eu lhe dê o que você não tem direito algum. Por sorte, Guilherme fez aquele contrato antes do casamento, isolando-a da empresa em quaisquer circunstâncias. Ele ainda tinha um pouco de lucidez e um bom advogado para orientá-lo quando fez isso.
Ana levantou-se, mantendo um ar vitorioso. Olhou-o friamente e pegou seu celular, diante da incredulidade de Lucca, e fez uma ligação.
- Pode vir. – foi só o que ela disse, antes de desligar e continuar a encará-lo.
Lucca começou a ficar preocupado e temeroso a respeito do que Ana estava preparando para forçá-lo a assinar os tais papéis. Sem entender por que, a imagem de Isadora lhe veio à cabeça.
- Acho que poderemos resolver tudo com muita tranquilidade e sem escândalos, cunhadinho. Você assina, eu vou embora e você fica com a linda mocinha que arranjou nestas férias. Tome. É bom ler antes de assinar. Mas pode confiar em mim – disse ao lhe alcançar a papelada, com um riso malicioso na boca.
A campainha soou mais uma vez.
- Pode deixar que eu atendo, meu bem – falou ao mesmo tempo em que se dirigia para a porta de entrada.
Estarrecido, Lucca viu Isadora entrar, acompanhada por Mauro. Ela estava de jeans e camiseta, com os cabelos úmidos e uma face aterrorizada. Logo ele viu a causa de tanto terror. Havia uma arma apontada em suas costas, segura pela mão direita do amante de Ana, enquanto a esquerda a agarrava firmemente no braço.
- Como vê, Lucca, possuo um ótimo argumento para forçá-lo a assinar estas folhas. Ainda acha que sou louca?
Lucca não pode conter sua fúria, ensandecido que ficara diante da visão de Isadora nas garras daquele pústula e com uma arma a ameaçá-la. Lançou-se sobre Ana, pegando-a pelo pescoço.
Assustada com a reação de Lucca, apesar de já esperar uma atitude desesperada dele, empertigou-se e, com a voz quase sumida entre os dedos que pressionavam sua traquéia, conseguiu dizer:
- É melhor me largar, ou Mauro a mata agora mesmo.
Ambos não notaram a sombra que passou através do semblante de Mauro. Ele não estava se sentindo a vontade naquele papel de gangster assassino no qual Ana queria que Lucca acreditasse. Mas tentava manter-se atuando daquela forma, convencido por ela, para conseguirem sua independência econômica e poderem viver longe do Brasil, finalmente juntos. Ana o assombrava com estas atitudes extremas. Este seu lado perverso, de certa maneira o fascinava, mas também o assustava. Isadora sentiu que a mão que segurava seu braço afrouxou o laço e a ponta da arma desencostou de suas costas. Ficou mais alerta.
Aos poucos Lucca foi diminuindo a pressão dos dedos e trêmulo de raiva, olhou para Mauro que se mantinha junto a Isadora. Sua mente procurava pensar rápido num meio de livrá-la daquele perigo. Sofria intimamente ao vê-la envolvida naquela situação por sua culpa. Foi então que lançou mão de um recurso que já vira em alguns filmes policiais. Dirigiu-se à Mauro, tentando manter a voz o mais firme possível.
- Mauro, então agora você vai se tornar assassino também? Pensei que era só um “bom vivant” e um gigolô, mas vejo que virou um assaltante à mão armada. A pena por este tipo de crime é bem maior, sabia? – provocou-o.
- É melhor calar-se, Lucca – aconselhou-o em tom baixo de voz, tentando disfarçar sua hesitação – Faça como a Ana está pedindo e logo acabamos com isto.
- É incrível o que uma mulher pode fazer com um idiota. Ela manda e você faz.
Mauro o encarou carrancudo, mas não revidou. Ana começou a apresentar sinais de irritação.
- Lucca, pegue esta caneta e assine – disse.
Lucca a olhou com a maior frieza possível e pegou os papéis de sua mão, bem como a caneta. Isto a fez relaxar um pouco. Ele olhou os papéis, lendo atentamente um por um.
- Você já leu estes documentos, Mauro? – voltou à carga contra seu oponente – Só aparece o nome de Ana aqui. Quem te garante que ela vai dividir alguma coisa com você? Ela é gananciosa – afirmou, lançando um olhar de soslaio para Ana, que tornara a ficar tensa e irritada – Através destas procurações ficará com mais dinheiro à disposição que antes. Acha realmente que ela vai continuar sustentando um panaca como você, se ela pode ter coisa melhor?
O olhar de Mauro voou de Lucca para Ana e os sinais de sua dúvida cruzaram o ambiente. Lucca estava conseguindo seu intento, deixando-o inseguro em relação à amante.
- Lucca, pela última vez. Pare de falar e assine. – exclamou Ana asperamente – E você! Não preste atenção ao que ele diz. Está tentando jogar você contra mim. Não percebeu?
- Olha, Mauro, eu se fosse você ficava de olhos bem abertos. Aposto que ela planejou tudo isto aqui. Não acredito que você fosse capaz de pegar uma arma para ameaçar alguém. Eu cheguei a conhecê-lo antes de tudo isto e você até não parecia ser um cara mau.
Podia-se notar pela cara de Mauro que sua confiança em Ana começava a ficar abalada e as dúvidas começavam a incomodar.
- Mauro! Atire nela! – a voz de Ana eclodiu na sala, provocando um tremor e uma suspensão da respiração nos outros três presentes.
Enquanto Mauro passava como um filme todas as artimanhas de Ana, o modo como o vinha tratando ultimamente... Ele não era um assassino. Aquilo era para ser apenas uma encenação. Lucca deveria assinar os documentos e eles iriam embora... A arma nem estava carregada... Pelo menos foi o que Ana lhe dissera quando entregou o revólver e ele nem se lembrou de conferir. Nunca tinha atirado na vida. E agora...
- Por favor, Lucca, assine e iremos embora das suas vidas, sem deixar ninguém ferido – conseguiu dizer com dificuldade.
Lucca o encarou seriamente e pegou a caneta.
Isadora sentiu que Mauro relaxara o suficiente, deixando escapar um suspiro. Até ali ela se preparara para reagir e libertar-se de seu algoz. Chegara a hora. Sem pensar nem mais um minuto, virou-se repentinamente, saindo da mira do revolver, e empurrou Mauro com todas as suas forças. A arma caiu no chão, deslizando sobre o tabuão liso do chão, indo parar justamente aos pés de Ana. Atônito com a reação de Isadora, não conseguiu reagir e deixou-a livre para correr para os braços de Lucca.
- Mauro, você é mesmo um inútil! – vociferou, já segurando a arma apontada para o casal – Tenho que fazer tudo sozinha! Pegue-a! – gritou apontando para Isadora.
- Ana, chega! Isto não vai dar certo. É uma loucura. Vamos parar enquanto nada de pior aconteceu.
- O quê? – pensou ter ouvido mal. Sua cólera virou-se contra Mauro.
- Esta é a atitude mais acertada, Mauro. Pode acreditar que não darei queixa do que aconteceu esta noite – assegurou Lucca, momentaneamente aliviado pelas palavras de Mauro.
- Lucca, você realmente acredita que vou sair daqui de mãos vazias? – perguntou Ana contraindo os lábios, num arremedo nervoso de um riso. – Está duvidando da minha ameaça?
- Ana, você me disse que a arma não estava carregada... – argumentou Mauro.
- Cale-se, seu imbecil! – berrou e, subitamente apontou a arma contra Mauro e disparou.
Ao ver Mauro cair, de olhos arregalados, ainda sem entender o que acontecera, sobre o tabuão, Isadora soltou um grito e escondeu o rosto no peito de Lucca.
- Agora acreditam que a arma está carregada e que posso fazer um bom uso dela? Que tal se o próximo alvo for a sua namoradinha?
Ela estava louca. Lucca teve certeza disto quando a viu atirar no próprio comparsa. Era realmente capaz de qualquer coisa. Talvez devesse assinar o que ela queria e ver o que podia fazer depois. Não podia mais expor a vida de Isadora. Colocou-a atrás de si, como uma barreira à insanidade de Ana. Pareciam que todas as saídas estavam fechadas para aquela situação.

(continua...)




Sei que parece maldade acabar esta postagem sem completar o capítulo, mas ele ficou maior que os outros e eu ainda não terminei de escrevê-lo. E é claro, que não posso contar como o Lucca e a Isadora vão se sair dessa agora, senão perde a graça. Faz de conta que é novela, em seu penúltimo capítulo...rsrsrs. Assim, prometo que até domingo, dia 07, termino de postar o capítulo completo e provavelmente o final deste romance. Antes da entrega do Oscar...
Beijos para todos!!

5 comentários:

  1. Rosane!!!
    Quanto mistério!!!Não me deixe assim na expectativa,mto bom este cap..Que mercenária esta Ana e que cobra ela é,está fazendo de td para tirar dinheiro de Lucca e de sua familia,gostei da coragem da Isadora tb.
    Posta logo a continuação,viu?
    Bjs.

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  2. Aiii quanta Maldade!!!!!!!

    Muito bom esse cap.
    Ansiosa pelo resto e pelo final.

    Bjos

    Taty

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  3. Poxa!!!
    Ter que esperar até domingo.....é maldade, rsrsrrs. Pra variar esse capítulo está ótimo, não vejo a hora de ler a continuação.
    Beijos!!!

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  4. Nossasinhoradasunhasroidas!
    O que vai acontecer agora!?

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  5. Rô, fiquei lendo esse capítulo atônita, sem conseguir escrever... Essa Ana deve ser a própria esposa do capeta encarnada!
    Sabe, com pessoas tão cruéis como ela, a gente tem mesmo é que ter muito cuidado. Mas nós nunca imaginamos que uma pessoa possa descer assim tão baixo, só que nos dias atuais, isso está se tornando muito comum, infelizmente...
    Repito o que a Ly disse:"Nossasinhoradasunhasroidas!"
    Beijinhos

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