sábado, 16 de julho de 2011

O Corsário Apaixonado - Final do Capítulo II


Anunciou aos seus homens que ficariam pelo menos mais um dia em La Rochelle, o que os deixou satisfeitos. Passou o resto da tarde pensando em Marie e sua semelhança com a duquesa de Villardompardo. Durante a noite voltou a frequentar a taverna da noite anterior. Desta vez interesses diferentes o levaram até lá. Talvez alguém soubesse sobre o naufrágio do galeão espanhol e sobre a existência de algum sobrevivente. Como se fosse um mero curioso sondou alguns dos frequentadores, sem conseguir informação alguma. Já tinha desistido quando um sujeito se aproximou de sua mesa e pediu licença para sentar, pois tinha ouvido suas indagações a respeito do galeão naufragado. Vestia roupas surradas e escondia a cabeça em um barrete de cor indefinida. Olhava para os lados a todo instante como se tivesse medo de estar sendo vigiado.
- Isso foi há uns dez anos. Ficamos sabendo desse galeão por um dos pescadores que teria encontrado sobreviventes. – Neste ponto parou de falar e encarou Crow – Interessado em saber mais?
Crow mostrou uma moeda de prata entre os dedos de sua mão.
- Conte tudo que sabe e ganha isto.
- Bem... Esse pescador disse que o navio afundou não muito longe daqui. Se quiser que o leve até o ponto provável para encontrar as riquezas afund...
- Não me interessam as riquezas – interrompeu-o impaciente –, pois sei que nada de valor afundou com aquele barco, além de pobres marujos azarados. A mim interessam os sobreviventes e se algum deles se estabeleceu por aqui.
- Posso me informar, monsieur. – Os olhos do maltrapilho brilhavam enquanto admirava o brilho prateado nas mãos de Crow.
- Faça isso e ganhará uma segunda igual a essa. – provocou enquanto lhe entregava a moeda – Espero você amanhã neste mesmo lugar e hora.

No dia seguinte seguiu para o mercado disfarçado de mendigo, mancando e vestindo uma capa com capuz que encobria suas vestes e seu rosto. Tinha certeza de que ela apareceria por lá e quando isso acontecesse  não lhe escaparia.
Quando menos esperava, ela surgiu ainda vestida como um rapazola, com o gorro escondendo os longos cabelos ruivos. Caminhou em sua direção, o que o surpreendeu. Certamente não o reconhecera.
- Tome, meu velho, coma uma boa refeição hoje – disse colocando uma moeda na mão que Crow estendeu para tornar seu mendigo mais legítimo.
Depois disso, continuou seu caminho, deixando Crow mais curioso a respeito da jovem mulher. Era dotada de bons sentimentos. Dividia com outros miseráveis o produto de seus assaltos... Sem perder tempo passou a segui-la através das ruas de La Rochelle. No caminho a viu surrupiar a carteira de um tipo esnobe da mesma maneira que havia feito com ele. Esbarrando, pedindo desculpas e desaparecendo no meio do povo. Não pode deixar de admirar a sua habilidade e a graciosidade ao realizar tal ato, rindo consigo mesmo. Após uns cinco minutos de caminhada chegou numa ruela estreita com moradias mais antigas, em estado precário, e entrou em uma delas. Crow estreitou a adaga que trazia presa a cintura. Poderia haver mais pessoas no lugar. Talvez um marido ou amante que a extorquisse, um bando de larápios que moravam na mesma casa... Quem sabe? Só poderia saber se entrasse lá. Pensou numa maneira de se aproximar sem alertá-la sobre sua presença. As janelas estavam fechadas. Resolveu verificar a porta e viu que não estava trancada. Mancando e escondido por seu manto, entrou com cuidado. Não viu ninguém na peça. Provavelmente estivesse nos fundos, na cozinha... Tirou o capuz para poder observar melhor o ambiente a sua volta. Não teve tempo de continuar sua incursão. Sentiu uma dor aguda na cabeça, tudo escureceu e acabou por perder a consciência.

A sensação da água fria em seu rosto o fez resmungar. Será que tinha bebido demais de novo? Onde estava? O que tinha acontecido? Em meio a essas questões, abriu os olhos com dificuldade e viu a aflição adornar o que parecia ser um belo rosto de mulher emoldurado por uma cascata de cabelos avermelhados. Quando a visão ficou mais clara, viu os grandes olhos castanhos, quase dourados, de sua pequena ladra. A cabeça latejava na parte posterior onde uma imensa frigideira de ferro o atingira.
- Ainda bem que não morreu... – disse para si mesma em voz alta, suspirando aliviada. Ao se dar conta que ele poderia tê-la ouvido, arrematou – Pelo menos não vou precisar fazer força para colocá-lo daqui prá fora.
Só então Crow se deu conta que estava sentado em uma cadeira com as mãos amarradas às costas.
- Por que insiste em me perseguir? Você deve ter muito mais moedas além daquelas que eu peguei. Então, por que...?
- Quem disse que tenho mais? – blefou. Notou o olhar desconfiado a sondá-lo.
- Ora... Você veste boas roupas, tem jeito de ser da nobreza... – argumentou passando os olhos sobre ele, que continuava bem vestido sem a capa velha que a enganara.
- E se eu disser que não passo de um ladrão?... Como você.
- Não acredito. Está tentando me enganar para que eu o solte e me leve para a prisão.
- Não... Quero apenas conversar com você... Meu nome é Nigel...
Nesse instante, a casa foi invadida por quatro guardas armados, que deram ordem de prisão a jovem. Logo atrás deles surgiu o homem que ela roubara no caminho para casa.
- Quase me enganou com aquele disfarce de garoto... Além de ladra também mantém reféns em sua casa. – disse apontando para Crow – O senhor está bem?
- Estou ótimo. Contudo está havendo um engano... Estou aqui por vontade própria... – pensou um pouco antes de continuar. – Digamos que estávamos brincando um pouco... Não é, querida?
- Não sou sua querida! Ele estava tentando... me roubar!
Os cinco homens caíram na risada, enquanto Crow ficou surpreso por ela não permitir que evitasse mais uma acusação  e ainda tentasse incriminá-lo.
- Não precisa ter medo, senhor, e tentar defendê-la. Amanhã a esta hora ela já estará sem sua adorável cabeça.
- O quê? – Agora ela demonstrava terror diante da punição desmedida ditada pelo desconhecido.
- Deveria ter cuidado com quem escolhe para afanar os bolsos. – aconselhou tardiamente o esnobe.
- Como?
- O Monsieur Menotté é o novo chefe da milícia local, mademoiselle – observou um dos policiais.
- Soltem o cavalheiro e levem essa delinquente daqui.
Marie estava apavorada, mas mantinha-se sem fazer escândalo. Parecia resignada com a ideia de sua morte no dia seguinte. Cauteloso, Crow manteve-se calado, pois não podia arriscar ser descoberto como pirata que era. Já saqueara vários navios franceses e isso o colocara na lista negra da nobreza local. Agora tinha que descobrir um meio de livrar Marie da guilhotina. Sendo ela descendente de Villardompardo ou não, não merecia morrer daquela maneira. Voltou à praia onde o Highlander estava ancorado, arquitetando um plano para tirar Marie da prisão. Avisou seus homens que sairiam com a maré alta no início da noite. Que terminassem de abastecer o navio e ficassem a postos para zarparem. Retornou ao centro e foi estudar o prédio que guardava os prisioneiros da cidade. Não era uma fortificação tão bem vigiada. A maioria dos soldados ficava percorrendo a cidade para manter a ordem. À noite, provavelmente a vigilância seria menor. Não teria dificuldade em invadir a cadeia, quando escurecesse, resgatar Marie e voltar para seu navio. Pelo menos assim esperava. Talvez precisasse contar com dois de seus homens.
Concretizando o plano em sua mente, decidiu voltar à casa de Marie. Talvez encontrasse alguma prova sobre a sua linhagem. Ao chegar, notou a porta entreaberta. Achou estranho, pois a fechara quando saiu de lá no final da manhã. Entrou sem fazer ruído, mas pouco depois sentiu uma lâmina sobre seu pescoço.
- Onde está ela? – Pode sentir o cheiro forte de tabaco barato e álcool que acompanhava a voz familiar.
- Quem quer saber? – perguntou Crow, ao mesmo tempo em que jogava a cabeça para trás, batendo com força na fronte do outro, pegando a lâmina que o ameaçava e invertendo suas posições.
Ao fazer isso, reconheceu o homem que o procurara na noite anterior e a quem oferecera moedas de prata para ter mais informações sobre os sobreviventes do navio espanhol.
- Ela é minha filha...
- O quê? Sua filha? – Crow agora estava realmente surpreso. Mantendo-o sob a mira da faca, levou o velho até uma cadeira e o obrigou a se sentar. Puxou outra que estava próxima e tomou assento à sua frente. Seria uma longa conversa.
- Agora me conte direitinho que história é essa de filha?
- Primeiro preciso saber qual o seu interesse nela. Porque as perguntas que fazia ontem na taberna? O que está pretendendo?
- Ela está presa e condenada à guilhotina.
- Como? – Os olhos do sujeito se arregalaram – Você a mandou prender e agora veio atrás de mim?
- Não fui eu. – disse admirado com o pouco caso do homem em relação à Marie – E por que eu viria atrás de você? Não está preocupado com sua filha?
- Como aquela idiota se deixou prender? – pensou alto, indignado, deixando Crow enjoado com a falta de afeto presente no modo dele falar.
- Você é realmente pai dela? – voltou a perguntar incrédulo e deixou de apontar a faca para ele.
- Não sou seu pai de verdade. Eu a encontrei quando ela tinha nove anos de idade e a criei desde então. Ela não tinha mais ninguém. A mãe morreu logo depois que eu as encontrei. Ensinei a ela tudo que sabia para me ajudar nas despesas. Agora como vou fazer para sobreviver? Estou velho, doente... O senhor pode me ajudar? – disse subitamente lacrimoso.
Crow teve vontade de socar o desgraçado.
- Diga o que mais sabe sobre ela! Se não me contar tudo, acabo com seu sofrimento agora mesmo. – ameaçou mostrando a faca em sua mão.
- Por que esse interesse? Marie é só uma pobre coitada. Podia ganhar mais se fosse para as ruas como as outras, mas é muito cabeça dura e pudica para isso.
- Se continuar a falar nesse tom sobre ela, lhe arranco a língua. – advertiu raivosamente, levantou da cadeira, pegou o sujeito pelo pescoço e colocou a faca encostada em sua boca.
- Tá bem, tá bem... Não precisa ficar nervoso – disse com a voz trêmula, pois constatou que Crow, por sua atitude e tom de voz, não estava brincando. – Vai, ao menos, me dar aquela moeda de prata que está me devendo?
- Estou ficando impaciente. – alertou e aumentou o aperto em torno de sua garganta. – Quero saber como as encontrou e se a mãe dela disse algo antes de morrer.
- Faz muito tempo... – olhou para cima, mostrando que fazia algum esforço para se lembrar, mas Crow percebeu o que ele queria. Afastou a faca e buscou uma moeda no bolso, exibindo-a diante dos olhos cobiçosos. – Ah! Sim... Acabo de me lembrar... Estava andando pela praia, quando vi um bote encalhado e o choro de uma criança. Fui ver o que estava acontecendo. A mulher estava muito mal, os lábios rachados e uma palidez própria daqueles que se preparam para dar o último suspiro. Parecia que estava seca por dentro. Mal conseguia falar. Quando me aproximei, a menina encolheu-se ao seu lado, ainda chorando. Ela também não estava com melhor aspecto, mas acho que por ser criança resistiu melhor. Pelo jeito o navio onde estavam tinha naufragado e as ondas as jogaram em nossa praia. Apesar das roupas que vestiam estarem amarfanhadas, dava para ver que eram de boa qualidade, mas não encontrei nenhum bem de valor com elas. Logo em seguida a senhora morreu. Eu a enterrei lá mesmo na praia e trouxe a menina comigo. Achei que daria uma boa "ajudante".

Crow sentiu o peito arder pensando no que Drake havia feito e a culpa sobre seus ombros pelo que ele tinha sido incapaz de evitar. Estendeu a peça de prata para o pai adotivo de Marie , que por sua vez a pegou ávido, mordendo-a para comprovar sua autenticidade, um hábito adquirido ao longo dos anos.
- Ela lhe disse seu nome verdadeiro?
- Disse, mas eu não gostei, por isso passei a chamá-la de Marie. Achei Ana um nome espanhol demais para o meu gosto – disse isso e deu uma cusparada no chão. – Sabe que eram elas? – perguntou sopesando sua moeda na mão.
- Não – acabou por dizer, por achar que não valia a pena incrementar a cobiça do homem. Ele seria bem capaz de vender Marie com a informação de que ela era de família rica.
- E o que vai fazer agora?
- Pretendo tirá-la da prisão.
- Se tiver mais prateadinhas de onde veio essa daqui, talvez eu possa ajudá-lo, monsieur.
E, dessa forma, Crow e Didier, como se chamava o "mentor" de Marie, uniram-se para realizar um plano que pretendia salvar a jovem da morte.


(continua...)


Afinal Crow consegue encontrar Ana, agora uma bela jovem, vivendo de maneira pouco lícita. Será que ele vai conseguir libertá-la e diminuir um pouco a culpa que recai sobre os seus ombros há tanto tempo, responsável pelas importantes mudanças no seu modo de vida?
TchanTchantchantchan....Aguardem os próximos capítulos...

Eu estou adorando escrever essa história. Espero que estejam gostando de ler...rsrsrs.
Beijos a todos e até breve!










5 comentários:

  1. Certamente ñ estamos adorando e sim amando essa história...

    Pensei que fosse a mãe dela candidata ao coração do Crow, e vc encaixou muito bem a filha...

    Sem contar a trama super empolgante, cheia de surpresas, adrenalina que vc consegue empenhar, outra coisa que sempre me chama atenção é o lado moça "dura na queda" eu fico em extase imaginando a cena, afinal se deparar com um homenzarão desse faz uma pedra derreter num lançar de olhos... kkk

    * * *Beijiskiss* * *

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  2. Oi Rô!!!
    Você adorando escrever e eu adorando ler, o romance está maravilhoso amiga, bem instigante, mas eu ainda tinha uma tênue esperança que a mãe tivesse sobrevivido, seria querer demais né?
    Fico imaginando todos os sofrimentos pelos quais Ana passou nesses 10 anos, e imagino qual vai ser sua reação ao descobrir que Crow estava naquele navio que modificou todo seu futuro, creio que vai ser bem difícil pra ele convencê-la de que ele tentou evitar o que aconteceu.
    Tua heroína tem um coração lindo, é corajosa e bondosa. Tenho certeza de que esse romance vai ser, em breve, mais um livro publicado.
    Pra variar estou super curiosa pela continução, estou louca pra saber que meio ele vai usar pra conseguir libertá-la.
    Beijosss amiga!!!

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  3. Coitada da Ana, quanto sofrimento!
    Esse Didier é um safado, como tantos que existem por aí e se aproveitam da dor alheia.
    Espero que, ao menos, ele possa ajudar o nosso gostosão a salvar a garota desse triste destino.
    Eu tinha esperanças que a mãe tb tivesse conseguido sobreviver, mas na verdade, já é muita sorte a menina ter conseguido, pois a situação pela qual passaram foi extremamente perigosa.
    E ela teve que emoldurar-se com a nova vida que lhe foi apresentada, da maneira menos ultrajante possível, pois antes dar uma de Hobin Wood e pegar dos abastados – ajudar os menos privilegiados (além do podrão do Didier) do que se aproveitar de seus dotes físicos e perder-se num mundo ainda mais obscuro.
    Eu acho que os sentimentos mais nobres nascem com a gente. Sei que podem ser adquiridos no meio em que nos encontramos, mas acredito que em muitos casos, as pessoas boas já nascem boas. E Ana tem bons sentimentos, boa índole e isso, nem a dureza da vida consegue arrancar.
    Será que aquele olhar do então Nigel tb ficou marcado na mente da Ana com o o olhar dela permaneceu gravado nele?
    Estou empolgadíssima para ver a trama se desenrolar e o romance começar... hehehe...
    Sinto até um friozinho no estômago com a espectativa das faíscas no encontro dos olhares entre os dois... ui!!!
    ♥Beijinhos♥

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  4. Oi Rosane! Estou amando essa aventura!!! Ação, romance... meus ingredientes favoritos! Vc está de parabéns, amiga. A trama tem um ritimo empolgante e o cenário uma riqueza de detalhes imprecionante. Até parece que me vejo naquele meio, assistindo tudo de camarote (com trocadilho, claro! kkk). Um beijão!

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  5. ahhh ta ficando cada vez melhor esta história!!
    indo direto para a continuação!!!
    Você deveria publicar este livro Rose!!é muito bom!
    Beijos
    Brih
    Meu Livro Rosa Pink

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Cantinho do Leitor
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